BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) – O escândalo de vazamento de áudios apontando uma suposta cobrança de propinas na distribuição de medicamentos para pessoas com deficiência na Argentina pega a economia do país em um momento delicado.
O caso paralisou o governo de Javier Milei nos últimos dias, já que a voz atribuída ao ex-diretor da Andis (Agência Nacional de Pessoas com Deficiência), Diego Spagnuolo, mencionou a irmã de Milei, Karina, como beneficiária das propinas.
Spagnuolo foi destituído do cargo. Dias depois, uma operação policial apreendeu o seu celular, bem como documentos e telefones de sócios da Drogaria Suizo Argentina empresa de distribuição de medicamentos mencionada nos áudios como parte do esquema.
Na quarta-feira (27), o risco medido pelo Embi (elaborado pelo JP Morgan) era de 850 pontos-base, o pior patamar em mais de quatro meses, desde a saída do chamado “cepo” cambial, em 14 de abril. Desde o início do ano, a alta é de 34%.
O Embi (Emerging Markets Bond Index) reflete o risco de investimentos quanto mais alto, maior a probabilidade de calote.
Às vésperas do fim das restrições para a compra de dólares por pessoas físicas e do mais recente acordo do país com o FMI (Fundo Monetário Internacional), o indicador era de 896 pontos e baixou para a casa dos 720 pontos com a liberação para a compra de moeda americana.
A incerteza política está relacionada ao escândalo dos áudios, que vieram à tona pouco mais de uma semana antes das eleições legislativas da Província de Buenos Aires e dois meses antes do pleito que irá renovar parte do Congresso Nacional.
Desde abril também foi adotado um sistema de flutuação para o dólar entre bandas que têm limites com correção mensal o teto, atualmente, é de 1.447 pesos.
Nesse cenário, o Banco Central da Argentina fez ajustes na taxa de câmbio para aliviar as pressões no mercado. O dólar oficial vendido pelo Banco Nación era de 1.360 pesos argentinos nesta quarta-feira (alta de 3,5% em uma semana).
Antes que estourasse o escândalo dos áudios, o governo já vinha de uma sequência de derrotas no Congresso, com a derrubada de vetos de Milei a reajustes para universidades e benefícios para pessoas com deficiência, algo que Milei disse que poderia colocar em risco o plano de corte de gastos do governo.
A confiança do consumidor, segundo a Universidade Torcuato Di Tella, caiu 13,9% em agosto na Argentina e atingiu piso mais baixo em um ano.
Também houve queda do Índice de Confiança no Governo, de 13,6% em agosto em relação a julho, segundo a mesma universidade. Os maiores declínios de confiança foram observados nos municípios da Grande Buenos Aires e na capital.
Nesta quarta-feira (27), após quase uma semana de silêncio, Milei falou diretamente sobre o escândalo dos áudios, ao ser interpelado por um jornalista em um evento de campanha na Grande Buenos Aires. Ele classificou as afirmações como mentirosas e disse que seu ex-funcionário, que também era seu advogado pessoal, responderia na Justiça.
No início da semana, antes que Milei se manifestasse sobre o tema, as ações e títulos da Argentina tiveram quedas de até 10%. O S&P Merval teve sua pior queda do ano, com uma perda de 4% em pesos e 6% em dólares. No pregão desta quarta-feira (27), a queda do Merval foi de quase 3%.
A economia argentina iniciou uma fase de recuperação no terceiro trimestre de 2024, e cresceu quase de forma constante até fevereiro de 2025, quando atingiu um “teto”, conforme análise da consultoria Invecq. Desde então, a atividade permaneceu estagnada e ainda não conseguiu superar esses níveis, em junho estava 1,3% abaixo desse pico.
O aumento da taxa de juros em termos reais, foram para dois dígitos e novos requisitos para operação dos bancos, que aumentaram os depósitos mínimos diários, também colocaram o governo em rota de colisão com um setor antes considerado aliado.
“O segundo semestre aparece condicionado por níveis de taxas de juro historicamente elevados que não são compatíveis com uma recuperação da atividade devido ao aumento do custo do crédito. Nesse contexto, é improvável que os dados de atividade mostrem melhorias no período que antecede as eleições, uma vez que as taxas permaneceriam altas até aquele momento para conter o dólar”, diz a Invecq.