SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Representantes de setores industriais sinalizaram nesta quarta-feira (26) que poderão articular uma ofensiva conjunta para enfrentar o que chamaram de uma invasão de produtos chineses.

A Coalizão Indústria, que reúne representantes de 14 setores industriais e foi muito ativa durante o governo Jair Bolsonaro (PL), deve voltar a se movimentar em torno de uma pauta comum, que é o consideram a urgência: conter o aumento nas importações chinesas em segmentos como aço, calçados, produtos têxteis, plásticos, máquinas e equipamentos.

“Está mais claro o entendimento de que precisamos de uma união de esforços”, disse Gustavo Werneck, CEO da Gerdau, no encerramento do congresso Aço Brasil. “Trabalhando em conjunto, a gente pode chegar a uma solução.”

A ofensiva mira o governo federal e a percepção de que hoje os pleitos dos setores frequentemente se chocam ou se sobrepõem. “Não adianta ir no Mdic em um dia e no dia seguinte vai o setor agrícola com outro pedido. Os técnicos do Mdic não são árbitros”, afirmou Werneck sobre o Mdic (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços).

José Velloso, presidente da Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos), entidade que costuma ser crítica aos pleitos protecionistas das siderúrgicas, disse durante o evento que toda a cadeia industrial está sob pressão dos importados. “O chinês usa práticas desleais de mercado e o Brasil teria que cuidar dessas práticas desleais”, disse.

As empresas sob o guarda-chuva da Abimaq são, em sua maioria, pequenas e médias, o que, segundo Velloso, as tornam compradoras de aço das distribuidoras. Elas não têm capacidade de importar aço nem de comprar diretamente nas usinas.

O problema, diz, não é a importação, mas as condições do que entra no Brasil. “A gente importa muita máquina dos Estados Unidos, a gente importa muita máquina da Alemanha. Não estou aqui reclamando da Alemanha, porque a Alemanha utiliza formas leais de comércio”, afirma. “O problema é o comportamento da China, que dá subsídio e ajuda extra para empresas e coloca os excedentes para fora.”

Marco Polo de Mello Lopes, presidente-executivo da Aço Brasil e coordenador da Coalizão Indústria, disse acreditar que hoje há uma conversa mais convergente entre os setores. “Todos têm um único pesadelo, que é a China, mas não há uma solução pronta para atender a todos.”

Alguns setores têm defendido que medidas antidumping e ou de salvaguardas envolvem processos longos e demorados, em um momento em que as indústrias demandam decisões mais urgentes. Discussões em torno do Repetro (regime aduaneiro especial para setor de óleo e gás), Finame (linha do BNDES) e conteúdo local também estariam, segundo Marco Polo, entre os temas de interesse da cadeia.

Na avaliação de Haroldo Ferreira, da Abicalçados (Associação Brasileira da Indústria de Calçados), usar a estrutura da coalizão é um dos caminhos para tratar do tema junto ao governo. “A gente já trabalha assim [com alinhamento de pautas], mas tem que fortalecer e trabalhar mais nesses pontos”, diz.

No setor calçadista, o nível de importação de pares já está 10 milhões superior ao que foi registrado no ano passado. “O governo tem instrumentos para definir uma cota, pega a média dos anos anteriores e coloca uma cota para o próximo ano, dois anos, para se manter no mesmo volume”.

No setor siderúrgico, as queixas em relação ao volume de importação de produtos chineses não são novas. Neste ano, porém, o setor diz que a participação do aço chinês já chega a 30% do mercado neste ano.

André Johannpeter, presidente do conselho de administração da Gerdau e do conselho diretor da Aço Brasil, disse considerar que existe um surto de importação chinesa. “É uma competição desleal. Não são as mesmas regras e a China não é uma economia de mercado”, afirmou.

As siderúrgicas têm dito que precisarão revisar seus ciclos de investimentos. Com a entrada de produto chinês, o uso da capacidade instalada das usinas está em queda.

A média anual de importação de aço ficou na faixa de 2,2 milhões de toneladas entre os anos 2000 e 2019. Para 2025, a Aço Brasil calcula que será de 6,3 milhões de toneladas. A estimativa do setor é a de que o país também esteja importando volume similar indiretamente, em produtos feitos com aço.

Silvia Nascimento, presidente da Aço Verde do Brasil, disse que atualmente as decisões para investimento estão inviáveis. “O que a gente tem de medidas do governo para conter essa enxurrada de aço importado não está surtindo efeito.”