BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O presidente Lula (PT) assinou a recondução de Paulo Gonet para o cargo de procurador-geral da República, por mais dois anos, às vésperas do julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
O mandato de Gonet terminaria em dezembro, e o julgamento da semana que vem pode condenar Bolsonaro pelas suspeitas de tramar um golpe de Estado após a derrota para Lula nas eleições de 2022.
A nova nomeação terá de passar pelo aval do Senado, com sabatina na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e depois votação no plenário, tendo pelo menos 41 votos.
Em nota, Gonet afirmou que agradece ao presidente pela indicação. “Animado e confortado por essa demonstração de renovada confiança, renovo também eu o meu propósito de empenho e dedicação à causa da Justiça, ao Ministério Público e ao país”, disse.
Auxiliares de Lula apontam que a antecipação dá mais força e legitimidade ao PGR em um momento de elevada pressão político-institucional, e ajuda a evitar a interpretação de que o presidente aguarda a atuação no julgamento para decidir pela recondução.
Além disso, segundo um auxiliar de Lula, a decisão de antecipar a recondução se deu para evitar as disputas que normalmente ocorrem dentro do Ministério Público Federal para a formação de uma lista tríplice da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), com nomes escolhidos internamente.
Embora seja uma praxe da categoria, não há previsão na lei de que o presidente da República deva seguir essa lista. Em 2023, Lula já tinha ignorado a tradição quando indicou Gonet pela primeira vez. Antes, Jair Bolsonaro fez o mesmo ao escolher Augusto Aras e, por isso, virou alvo de ataques de petistas.
A decisão antecipada do presidente deve fazer com que não haja lista tríplice este ano. Na associação de procuradores, a avaliação interna é que a ideia da lista é dar três nomes ao mandatário, e que não faz sentido enviar uma relação após a escolha, já que a intenção não é causar constrangimento.
A ideia é que a decisão de Lula dê continuidade e tranquilidade, sem sobressaltos, à atuação de Gonet como PGR.
Aras ficou conhecido por ter uma relação de atrito com uma parcela significativa dos integrantes do Ministério Público, além de uma proximidade com aliados de Bolsonaro que o fez ser considerado omisso em relação aos ataques que o então presidente fazia às instituições.
Gonet chegou a fazer parte da cúpula da gestão de Aras entre 2021 e 2023, como vice-procurador-geral eleitoral, atuando no TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Mas, à frente da PGR, Gonet mudou os rumos do seu antecessor. Ele reorganizou forças internas e se alinhou ao ministro Alexandre de Moraes e também à Polícia Federal.
O procurador foi responsável, entre outras coisas, por apresentar a denúncia contra Bolsonaro, apontando-o como líder da tentativa de golpe. As acusações incluem crimes cujas penas máximas, somadas, podem chegar a 43 anos de prisão sem contar os agravantes.
Gonet, 64, tem um de boas relações com o mundo político, mas teve uma atuação forte em seus primeiros anos à frente da procuradoria-geral da República contra suspeitas de irregularidades no uso de emendas parlamentares.
Ele denunciou, em abril deste ano, o então ministro das Comunicações Juscelino Filho (União Brasil-MA) no inquérito em que havia sido indiciado pela Polícia Federal sob suspeita de corrupção passiva e de outros crimes relacionados ao desvio de emendas. Ele deixou o ministério após a denúncia.
Nascido no Rio de Janeiro, ele é integrante da Procuradoria desde 1987, Gonet tem doutorado pela UnB (Universidade de Brasília).
Nos bastidores do mundo jurídico, é visto como alguém aberto ao diálogo e com uma relação próxima com o ministro Gilmar Mendes, do Supremo, de quem já foi sócio em uma instituição de ensino superior.
O magistrado, ao lado do ministro Alexandre de Moraes, foi o principal fiador de sua escolha para a chefia do Ministério Público Federal no seu primeiro mandato.
Católico praticante, Gonet teve suas posições mais conservadoras expostas de modo mais claro a partir de 2009, quando escreveu um artigo com críticas ao direito ao aborto. O texto foi publicado quando estava em discussão a possibilidade do uso de embriões para pesquisas científicas, decidida pelo STF no ano anterior.
Ele defende a tese de que a vida humana existe desde sua concepção e diz que o Estado deve agir de maneira “firme e eficaz” contra a interrupção da gravidez. Além disso, faz menções a pessoas como Ives Gandra Filho, que é um dos juristas conservadores mais conhecidos do país.
Em 2019, o atual procurador-geral recebeu elogios da deputada Bia Kicis (PL-DF), aliada de Bolsonaro. “Paulo Gonet é conservador raiz, cristão, sua atuação no STF nos processos da Lava Jato foi impecável”, afirmou a parlamentar.
Na denúncia contra Bolsonaro, em fevereiro deste ano, Gonet acusou o ex-presidente de praticar os crimes de tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito e de golpe de Estado, de dano qualificado pela violência e grave ameaça contra patrimônio da União, deterioração de patrimônio tombado e participação em uma organização criminosa.
A acusação apontou a existência de uma organização criminosa que “tinha por líderes o próprio presidente da República e o seu candidato a vice-presidente, o General Braga Neto”.
“Ambos aceitaram, estimularam, e realizaram atos tipificados na legislação penal de atentado contra o bem jurídico da existência e independência dos Poderes e do Estado de Direito democrático.”