SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A avenida General Olímpio da Silveira, entre a rua Conselheiro Brotero e a avenida Pacaembu, e a entrada da favela do Moinho, em Campos Elíseos, se tornaram os novos pontos de venda e consumo de crack na região central de São Paulo. A cena acontece quatro meses depois da dispersão dos sem-teto da rua dos Protestantes.

Nas concentrações é possível encontrar a venda de cachaça, cachimbos, roupas e outros utensílios expostos sob caixotes de madeira ou estendidos pelo chão, situação chamada de shopping cracolândia pelos dependentes químicos.

No primeiro ponto o crack é comercializado na escadaria que liga as avenidas General Olímpio da Silveira e Pacaembu. Sem pudor, a droga é vendida a usuários ou para quem passa por ali, numa espécie de drive-thru.

A reportagem acompanhou o comércio por mais de uma hora, das 13h às 14h de quinta-feira (21). Naquele horário, pedestres passavam em meio aos pequenos traficantes, ao lado de um supermercado. Na segunda-feira (25), a escada estava limpa e molhada, sem traficantes ou dependentes químicos.

A presença de 50 usuários entre as ruas Conselheiro Brotero e Tupi já arranca queixas de comerciantes e moradores. Eles relatam barulho, sujeira, brigas e fumaça que emana do fogo aceso para derreter fios que envolvem cobre. A situação faz parte da dinâmica por onde a cracolândia passa.

Em nota, a gestão Ricardo Nunes (MDB) confirma a existência das duas aglomerações. A prefeitura declara ter intensificado a oferta de tratamento e acolhimento pelas equipes de saúde e assistência social nas regiões citadas, além das ações de zeladoria e segurança, combatendo o tráfico de drogas e outros crimes.

A Folha de S.Paulo, no entanto, não encontrou assistentes sociais ou agentes de saúde durante a apuração.

“Equipes de assistência social percorrem diariamente pontos de ocupação momentânea em toda a cidade para busca ativa de pessoas em situação de rua e vulnerabilidade”, acrescentou a nota.

De acordo com a prefeitura, entre junho e agosto deste ano, profissionais do Serviço Especializado de Abordagem Social Bom Retiro, Santa Cecília e Sé realizaram mais de 15 mil abordagens nesses territórios, que resultaram em mais de 11 mil encaminhamentos para acolhimento na rede socioassistencial e de saúde.

Segundo os moradores, o grupo chegou ali há cerca de duas semanas. Onde antes havia um ou outro dependente já abriga um acampamento, no canteiro central junto a ciclovia que liga o centro à zona oeste.

A manicure Maria Silvana, 58, disse que esta é a pior situação dos 20 anos em que mora entre a Conselheiro Brotero e a Tupi. “Barulho a noite toda. Caixa de som. Sujeira.” Para ela, a limpeza feita pela prefeitura para remoção de detritos acumulados pelos moradores de rua e o jato de água lançado por um caminhão-pipa é enxugar gelo. Minutos depois de as equipes virarem as costas, tudo volta como antes, como a reportagem também presenciou.

“Não acho justo. Não conhecia o crack. Conheci agora”, acrescentou. Para ele é necessário manter uma base policial 24 horas ali.

Funcionárias de um restaurante afirmaram que o jantar minguou nos últimos dias com a redução da clientela que, segundo elas, estaria com medo de agressões e roubos. Casos de furtos de mercadorias em comércios locais passaram a ser relatados na região, de acordo com quem vive ali.

A reportagem passou a tarde de segunda no endereço para conhecer a movimentação da cracolândia em formação. Por volta das 14h30, aproximadamente 20 homens e mulheres estavam ali. De repente um exército de agentes com coletes laranja a bordo de vans chegou. Caminhões, viaturas da GCM (Guarda Civil Metropolitana) e um carro-pipa também faziam parte da tropa. O chamado “rapa” removeu alguns bagulhos e se retirou.

O trajeto seguiu até o limite da Subprefeitura Sé, nas imediações da rua das Perdizes. Alheio à limpeza, um outro grupo com dez pessoas fumava crack na ligação da avenida Pacaembu em frente ao prédio da Receita Federal.

Por volta das 16h, a concentração na altura da Conselheiro Brotero já tinha 50 pessoas. Além do barulho dos ônibus e carros, a aglomeração tem voz própria. A chegada da droga é feita aos gritos, embalados por um caixa de som portátil presa ao pescoço de um usuário.

Uma das concentrações de dependentes químicos está na avenida Rio Branco, na lateral da favela do Moinho, em Campos Elíseos, no centro de São Paulo Rafaela Araújo Folhapress A imagem mostra um grupo de pessoas sentadas e deitadas em uma calçada, com algumas roupas espalhadas ao redor. Ao fundo, há uma parede com um mural colorido e árvores. A luz do sol ilumina a cena, criando sombras. Algumas pessoas estão usando chapéus ou bonés, e há um guarda-chuva preto em uma das áreas. **** Diferentemente de outros locais que já abrigaram a cracolândia, não havia a presença de agentes de saúde, assistentes sociais nem da GCM de forma permanente ou rotativa. O uso de crack pode ser acompanhado por quem passa a pé ou através das janelas de carros e ônibus.

Nesta terça-feira (26) a Prefeitura de São Paulo encaminhou fotos de assistentes sociais em atendimento no local. Outra imagem registrava uma viatura da Polícia Militar estacionada.

A pouco mais de um quilômetro dali uma nova concentração de dependentes químicos se forma na lateral da entrada da favela do Moinho. Mais discreta, cerca de 20 pessoas estavam presentes na tarde de segunda.

Em barraquinhas era possível encontrar a venda de pinga e de cachimbos. Os usuários de drogas consumiam crack na esquina da alameda Eduardo Prado e da avenida Rio Branco. Outro grupo também fumava a droga nos dois lados da passagem de pedestres do viaduto Engenheiro Orlando Murgel, que passa sobre a favela.

A chegada dos usuários no entorno do Moinho coincide com a tentativa de remoção da favela pela gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos). Governo federal e estadual buscam soluções de habitação para que os moradores deixem o local, que já foi motivo de embate entre os governos após ações policiais no espaço.

Além dos dois pontos em destaque, outros endereços mais antigos seguem com o consumo de droga: nos baixos da praça Roosevelt, em meio ao trânsito de veículos, com maior presença à noite, quando o elevado Presidente João Goulart é fechado para automóveis, e aos finais de semana. E no cruzamento da rua Helvétia com a alameda Barão de Piracicaba, ponto em que policiais militares têm ordem para dispersar as aglomerações assim que notadas, num trabalho de vai e volta.

Em nota, a gestão Tarcísio afirma que atua em parceria com a prefeitura para combater o tráfico de drogas e oferecer assistência aos dependentes químicos.

“Forças de segurança estaduais e municipais atuam de forma conjunta na vigilância do território no combate ao tráfico de drogas, bem como de atividades ilícitas, monitorando possíveis pontos de aglomeração e tentativas do crime organizado se fixar em vias públicas para comércio ilegal de drogas na capital”.