SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A OMC (Organização Mundial do Comércio) vive um estado de paralisia, que demandará a refundação da entidade, e essa recriação deverá ser liderada pelo Brasil, disse nesta terça (26) o ministro Mauro Vieira, durante conferência que discutia as relações bilaterais entre Estados Unidos e Brasil.
Na avaliação do chanceler, a OMC “encontra-se em crise total, incapaz de mover-se, seja no pilar da solução de controvérsias, seja em sua vertente de produção de novos acordos.” A guerra tarifária, disse Vieira, levou as regras de comércio interacional para o período anterior ao Gatt, o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio, de 1947, texto que deu a base para criação da OMC.
“Podemos dizer que a Ordem Mundial, como a conhecemos, ou melhor, como a conhecíamos, está sendo desmontada, e justamente por aqueles que mais diretamente contribuíram para sua formação”. Mauro Vieira afirmou que os Estados Unidos parecem buscar “meios de atuação que passam ao largo dos organismos internacionais”.
Mauro Vieira esteve na Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), onde participou de uma conferência organizada pela entidade da indústria com o Americas Society/Council of the Americas.
Há alguns dias, o governo Lula acionou os Estados Unidos na OMC em reação às tarifas de 50% estabelecidas por Donald Trump os produtos brasileiros.
A consulta precisa ser aceita pelos americanos e a última instância da OMC está paralisada, o que deve reduzir as chances de qualquer efeito prático da ação. Entretanto, o movimento é visto no Palácio do Planalto como um gesto simbólico importante para marcar posição do Brasil em defesa do sistema multilateral de solução de disputas comerciais.
A OMC vive uma situação de impasse institucional e esvaziamento, principalmente por conta do bloqueio prolongado ao seu sistema de solução de controvérsias. Desde 2019, o órgão de apelação da OMC, que julga disputas comerciais entre países, está inoperante, porque os Estados Unidos seguem bloqueando a nomeação de novos juízes desse órgão. Isso criou um vácuo no sistema de resolução de disputas, travando o processo.
Neste ano, ao intensificar medidas unilaterais e protecionistas, Trump alegou que a OMC “prejudica os interesses dos EUA”. O governo americano questiona a legitimidade e funcionamento do órgão de apelação e ainda critica o tratamento dado à China.
Mauro Vieira disse nesta terça que qualquer negociação entre o Brasil e os Estados Unidos para debater a sobretaxa de 50% só ocorrerá sem a tentativa de interferência no sistema judicial brasileiro. Trump citou o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) em suas decisões de sobretaxar as exportações brasileiras.
“Seguiremos resistindo a essas pressões ao mesmo tempo que insistiremos no respeito às nossas instituições e à nossa soberania. Sem jamais abrir mão da disposição para o diálogo”.
Segundo o chanceler brasileiro, o único caminho possível para uma solução satisfatória será a total separação de questões comerciais e temas políticos.
Em sua apresentação no evento na Fiesp, Vieira disse que o governo brasileiro vem, desde o início do ano, mantendo conversas com autoridades norte-americanas ” sempre buscando demonstrar a realidade dos fatos e disposição para negociar”.