SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Cerca de 46,5 mil novos casos de HIV foram registrados no Brasil em 2023, segundo dados do Ministério da Saúde. E estimativas apontam que o país pode chegar a 600 mil novos casos da doença nos próximos 10 anos. Além da opção oral, a profilaxia pré-exposição (PrEP) para prevenção do HIV conta agora com o Apretude, o primeiro medicamento injetável de longa ação a ser comercializado Brasil e em toda a América Latina.
Desenvolvido pela GSK/ViiV Healthcare, o medicamento foi aprovado pela Anvisa em 2023 e passou a ser comercializado nesta segunda-feira (25). A injeção é aplicada a cada dois meses, enquanto na prevenção usual os comprimidos devem ser ingeridos diariamente.
O medicamento chega ao Brasil com preço de tabela a R$ 4.000, com distribuição pela Oncoprod.
O Apretude, nome comercial do cabotegravir, é um antirretroviral inibidor da integrase, enzima produzida pelo retrovírus do HIV. O medicamento impede que o vírus se instale nas células do corpo e se multiplique. Por exigir menor disciplina do paciente, o medicamento pode ter eficácia superior à PrEP oral, segundo testes clínicos realizados durante a análise da droga.
“Para mim, esse é um marco gigantesco. Eu trabalho com HIV há décadas e ontem, aqui em São Paulo, foi administrado o primeiro a Apretude no mercado privado. Já temos anos de estudos, muita gente tomando o medicamento no Brasil, mas foi a primeira vez que uma pessoa comprou a medicação”, afirma Roberto Zajdenverg, médico e coordenador de prevenção de HIV na GSK.
A distribuidora é responsável por comercializar o medicamento para farmácias, clínicas e pessoas físicas, permitindo que usuários o recebam em casa. É necessário, no entanto, que o medicamento seja aplicado por outra pessoa, por se tratar de uma injeção intramuscular.
Além da conveniência do ponto de vista posológico, no sentido de reduzir a dosagem para intervalos de dois meses, o medicamento pode contribuir para a privacidade do paciente. “Diminui a exposição ao preconceito, porque a pessoa não precisa ficar levando os comprimidos”, afirma o médico.
Assim como na prEP oral, o cabotegavir pode ser usado por pessoas que se sintam expostas à contaminação pelo vírus. “O protocolo de prevenção do Ministério da Saúde é claro: se alguém se percebe como grupo de risco, o médico tem que acolher. Dificilmente alguém procura um profissional de saúde querendo fazer prevenção do HIV sem motivos”, afirma o especialista.
A aplicação do medicamento só pode ser feita mediante prescrição médica e até sete dias após a realização de um teste de HIV negativo.
De uso estritamente preventivo, o medicamento é contraindicado para pessoas que já tenham o vírus. “É uma ferramenta para prevenção do HIV. Se você vive com vírus, é outra conduta médica”, diz. O médico explica que, enquanto o tratamento para HIV impede o vírus de se multiplicar e agredir o organismo, esta medicação impede que o vírus se instale nas células do corpo.
MEDICAMENTO AINDA NÃO ESTÁ DISPONÍVEL NO SUS
O remédio está disponível para venda em farmácias e aplicação em clínicas médicas. A fabricante está em negociação para uso pelo SUS. “Já avançamos nas conversas com o departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde e temos a concordância deles para seguirmos com a submissão para a Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias)”, afirma Roberta Correa, diretora da unidade de negócios de HIV da GSK Brasil.
O órgão é responsável por analisar o potencial de incorporação de tratamentos no SUS. De acordo com Correa, a submissão será feita ainda neste mês.
A partir daí, o medicamento passará por uma avaliação técnica e uma defesa pública, em que representantes da indústria, membros do governo e membros de sociedade médica avaliam o valor do medicamento para a saúde pública. Uma consulta pública também é realizada, até que se decida pela incorporação ou não do medicamento no SUS.
Foram realizados estudos pivotais, sobre segurança e eficácia do medicamento, em diversos países. No continente africano, os testes foram realizados em mulheres cisgênero, grupo com maior incidência de contaminação pelo vírus do HIV na região.
Já em países como Brasil, Estados Unidos, França e Inglaterra, os testes foram realizados em homens cis e mulheres transexuais, grupos com maior prevalência da doença nessas regiões.
“O Brasil foi o país que mais incluiu pessoas no estudo. Isso garante que desde a largada tenhamos profissionais com anos de experiência com o cabotegravir, não só médicos, mas enfermeiros e farmacêuticos também”, afirma Zajdenverg.
De acordo com ele, o principal efeito colateral do medicamento relatado em estudos foi a dor muscular em decorrência da injeção. “Uma ou outra pessoa pode ter um pouco de enjoo, às vezes diarreia, nenhuma medicação é 100% inócua. Mas essa medicação se mostrou com um padrão de segurança muito alto, com um número pequeno de efeitos colaterais ao redor do mundo”, afirma o médico.
Outro medicamento de prevenção ao vírus do HIV injetável é o lenacapavir. Um estudo da farmacêutica Gilead Sciences, publicado em maio avaliou a segurança e duração do medicamento de ação prolongada. Com um princípio ativo diferente do cabotegravir, o medicamento tem um custo mais elevado, com duas doses podendo chegar US$ 44 mil, e ainda não foi registrado pela Anvisa.