SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) desapropriou terreno de uma favela na Vila Leopoldina, zona oeste de São Paulo, após empresa desistir de projeto urbanístico no entorno. O local briga cerca de 400 famílias e tem decisão de usucapião transitada em julgado desde 2017.
O entrave jurídico em relação à área de 6.400 metros quadrados da favela da Linha foi citado pela empresa Altre Empreendimentos e Investimentos Imobiliários S.A., integrante do grupo Votorantim, como uma das causas de ter desistido de participar do PIU (Plano de Intervenção Urbana) no bairro, aprovado em junho de 2023.
A desistência foi anunciada por advogados da empresa durante reunião com a Promotoria de Habitação e Urbanismo e representantes da Smul (Secretaria Municipal de Urbanismo de Licenciamento) em 12 de maio.
Segundo registro da reunião que a Folha de S.Paulo teve acesso, a empresa afirmou que, uma vez mantidas as condições atuais, havia grande risco de o leilão do PIU Vila Leopoldina “tornar a licitação deserta por desinteresse de outras empresas”.
O entrave, no caso, se deu pela indefinição em relação às áreas públicas ocupadas por favelas onde antes havia ruas, como a favela da Linha, formada no terreno originalmente usado como ramal de linha de trem desativada no início dos anos 1970.
Há previsão também de que a área onde hoje está a favela do Nove seja usada para reconfigurar a rua Japiaçu.
Uma vez detentora de ação definitiva de usucapião, movida por uma entidade social em nome dos moradores, a favela da Linha não poderia ser transformada em rua, o que inviabilizaria o PIU.
Na época da elaboração do plano, o terreno foi incluído como área pública, situação que mudou com o trânsito em julgado da decisão judicial.
Apesar de áreas públicas não estarem sujeitas a ação de usucapião, nesse caso, a Justiça acolheu o pedido já que a administração municipal nunca implantou de fato a rua no terreno.
De acordo com a gestão, a desapropriação da favela da Linha atendeu “a necessidade legal de viabilizar as intervenções previstas pela Área de Intervenção Urbana (AIU) Leopoldina, considerando o trânsito em julgado da usucapião coletiva sobre o trecho”.
Procurada, a Altre não comentou a desistência do projeto e, afirmou em nota, que “a potencial participação no certame está sujeita à análise de cenário e termos do edital, ainda pendente de publicação”.
Além da questão jurídica da favela da Linha, a Altre já manifestou preocupação em relação a outros entraves para a execução do PIU, como a falta do projeto referencial para a construção das unidades habitacionais de interesse social e o potencial adensamento excessivo desse empreendimento.
Está prevista a construção de 853 unidades habitacionais em um terreno de 6.500 metros quadrados; cada unidade para abrigar uma família teria, em média, de 25 a 30 m².
O lançamento do edital estava previsto para janeiro deste ano, mas não ocorreu. Em nota, a gestão afirmou que “trabalha para a realização ainda no segundo semestre de 2025”. “O edital do leilão de Potencial Construtivo Adicional definirá prazos e condições para a execução das intervenções pelo parceiro privado vencedor”, informou em nota.
O PIU é previsto pelo Plano Diretor Estratégico como uma forma de ultrapassar o limite construtivo estabelecido pela lei de zoneamento em determinada área da cidade. Para construir a mais, as empresas interessadas devem pagar uma taxa, a outorga onerosa.
Mas, em vez de pagar a outorga, a Votorantim propôs a construção de conjuntos habitacionais voltados para a população das favelas que existem na região em troca de habilitação para criar um polo corporativo na região junto com outras empresas.
A sede da Altre, por exemplo, fica em um prédio em frente ao terreno desapropriado pela prefeitura.
O projeto prevê a construção de moradias para cerca de 1.400 famílias das comunidades do Nove, da Linha e Madeirite.
Moradores de imóveis de alto padrão nas proximidades fizeram ao longo dos anos oposição ruidosa à construção de um conjunto habitacional em terrenos mais próximos às suas residências.