SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em mais um episódio de tensão diplomática entre Israel e o governo brasileiro, o ministro da Defesa israelense, Israel Katz, publicou nesta terça-feira (26) uma mensagem em português em suas redes sociais na qual chamou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de “antissemita declarado”. No post, acompanhado de uma montagem feita com inteligência artificial, Lula aparece retratado como uma marionete do líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei.
O ministro israelense disse que declarou Lula persona non grata porque o brasileiro teria desrespeitado a memória do Holocausto ao comparar a ofensiva militar em Gaza à perseguição de judeus na Segunda Guerra Mundial.
“Agora ele revelou sua verdadeira face como antissemita declarado e apoiador do Hamas ao retirar o Brasil da IHRA -o organismo internacional criado para combater o antissemitismo e o ódio contra Israel- colocando o país ao lado de regimes como o Irã, que nega abertamente o Holocausto e ameaça destruir o Estado de Israel”, escreveu Katz.
Em julho, o governo Lula deixou a Aliança Internacional para a Memória do Holocausto, a IHRA, organização internacional criada para combate ao antissemitismo e memória do massacre dos judeus. Segundo diplomatas, a decisão de retirar o Brasil da aliança foi tomada porque a adesão foi feita de maneira inadequada durante o governo de Jair Bolsonaro (PL).
O ministro também afirmou que Israel é capaz de se defender “contra o eixo do mal do islamismo radical, mesmo sem a ajuda de Lula e seus aliados”, e classificou a decisão como uma “vergonha para o povo brasileiro e para os muitos amigos de Israel no Brasil”.
Em resposta, o Itamaraty publicou no X que “O Ministro da Defesa e ex-chanceler israelense, Israel Katz, voltou a proferir ofensas, inverdades e grosserias inaceitáveis contra o Brasil e o Presidente Lula”.
“Espera-se do sr. Katz, em vez de habituais mentiras e agressões, que assuma responsabilidade e apure a verdade sobre o ataque de ontem contra o hospital Nasser, em Gaza, que provocou a morte de ao menos 20 palestinos, incluindo pacientes, jornalistas e trabalhadores humanitários”.
O ataque ao hospital Nasser, no sul da Faixa de Gaza, matou pelo menos 20 pessoas na segunda (25), incluindo cinco jornalistas. O premiê de Israel, Binyamin Netanyahu, falou em “acidente trágico”. “Nossa guerra é com os terroristas do Hamas. Nossos únicos objetivos são derrotar o Hamas e trazer de volta os reféns [em poder da facção palestina]”, declarou. Logo após a repercussão do bombardeio, Tel Aviv disse ter ordenado a abertura de uma investigação. Nesta terça-feira (26), o Exército admitiu que nenhum dos jornalistas eram membros do Hamas, que seriam os reais alvos da ação.
O hospital em Khan Yunis é um dos últimos centros de saúde que continuam parcialmente operacionais na Faixa de Gaza. As instalações já foram alvo de Israel em várias ocasiões desde o início da guerra no território, devastado pelos bombardeios.
O porta-voz da Defesa Civil do território palestino, Mahmud Bassal, mencionou ainda a morte de um trabalhador sanitário e de um membro da Defesa Civil.
Entre as vítimas de segunda (25) estão Hussam al-Masri, Mariam Abu Dagga e Mohammed Salama, que colaboravam para Reuters, Associated Press e Al Jazeera, respectivamente. Os jornalistas Moaz Abu Taha e Ahmad Abu Aziz também estão entre os mortos, e o fotógrafo Hatem Khaled, outro contratado da Reuters, ficou ferido.
Na publicação no X, o ministério brasileiro disse ainda que Israel está sob investigação na Corte Internacional de Justiça sob acusação de prática de genocídio –o governo Lula deve ingressar oficialmente na corte para endossar a ação, movida pela África do Sul.
“Como Ministro da Defesa, o senhor Katz não pode se eximir de sua responsabilidade, cabendo-lhe assegurar que seu país não apenas previna, mas também impeça a prática de genocídio contra os palestinos”, declarou o Itamaraty.
Antes da sequência de mensagens rebatendo Katz, a chancelaria brasileira já havia publicado uma nota condenando o bombardeio israelense ao hospital Nasser.
“Hospitais e unidades médicas gozam de proteção especial pelo Direito Internacional Humanitário, e ataques a tais instalações podem configurar crimes de guerra, conforme as Convenções de Genebra de 1949 e seus Protocolos Adicionais”, disse o ministério das Relações Exteriores, em nota.
“O bombardeio contra o hospital Nasser soma-se a um padrão reiterado de violações perpetradas pelo governo de Israel contra a população palestina. A responsabilização por tais atos é condição essencial para evitar sua repetição e assegurar justiça às vítimas”.
Na nota, o governo brasileiro defendeu ainda que ocorra uma investigação independente e imparcial do ocorrido. “Ao reiterar apelo por cessar-fogo imediato, o Brasil insta o governo de Israel a interromper os ataques contra a população civil de Gaza, a assegurar aos jornalistas o direito de desempenhar livremente e em segurança seu trabalho e a levantar restrições vigentes à entrada de profissionais da imprensa internacional e de ajuda humanitária naquele território”, disse o Itamaraty.