SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O jogo de pressão de Donald Trump com a Venezuela vai ganhar novas peças na semana que vem, quando mais um navio de guerra e um submarino de propulsão nuclear chegarão às águas caribenhas em torno do país governador pelo ditador Nicolás Maduro.

Na semana passada, três destróieres lançadores de mísseis guiados da classe Arleigh Burke haviam sido enviados para a região, mas deram meia volta devido à força do furacão Erin. Nesta segunda (25), eles retomaram o deslocamento.

Os Estados Unidos também enviarão um cruzador, navio ainda mais poderoso que os destróieres, o USS Lake Erie. Barco da classe Ticonderoga, ele pode disparar 122 mísseis, ante 96 dos Arleigh Burke da geração mobilizada nessa operação.

Além disso, a operação será apoiada também pelo USS Newport News, um submarino de ataque com propulsão nuclear da segunda geração da classe Los Angeles, que adicionou aos 24 mísseis e torpedos que podem ser lançados horizontalmente 12 tubos de disparo vertical, que permite salvas simultâneas de até 12 mísseis de cruzeiro Tomahawk.

Com isso, o poder de fogo projetado na região cresce mais de 50%, superando na prática toda a força de Maduro. Isso não significa, na improvável hipótese de um conflito, que os navios não estejam vulneráveis: Caracas tem à sua disposição uma quantidade incerta de mísseis antinavio de desenho chinês, russo e iraniano.

Há relatos, esses não confirmados, de que três navios de desembarque anfíbio associados à Quarta Frota americana também podem ir à região, mas por ora isso é rumor de rede social. Já o patrulhamento aéreo do Caribe por aviões-espiões P-8 Poseidon é uma constante e irá continuar.

Isso tudo se refere, claro, a combate naval numa crise que vem crescendo nas últimas semanas. A Venezuela está no alvo de Trump desde seu primeiro mandato, mas agora a associação direta que seu governo faz é com o narcotráfico.

Maduro foi indiciado em 2020 por narcoterrorismo numa corte em Nova York, acusação que nega como propaganda. O crescimento dos cartéis mexicanos levou o de Sinaloa a ser designado organização terrorista por Trump neste ano, assim como a gangue venezuelana Tren de Aragua.

No começo do mês, os EUA anunciaram que começariam uma operação militar permanente contra o tráfico no Caribe, empregando suas vastas forças navais. Na semana passada, contudo, o foco foi direcionado para Maduro, cuja cabeça está a prêmio —Trump aumentou para US$ 50 milhões a recompensa a quem der dicas de como prender o ditador.

Com isso, a Casa Branca afirmou que usaria “toda a força” contra Caracas, ao mesmo tempo que enviou os três navios. A mobilização do submarino e do cruzador já vinha sendo especulada desde o início da operação, mas foi revelada na noite de segunda pela agência Reuters.

A informação foi confirmada à Folha de S.Paulo por um integrante da diplomacia nos EUA, que afirmou ter a impressão de que a pressão exercida na região será permanente devido à importância que o presidente dá à questão do tráfico.

O governo brasileiro, de forma anônima, já disse que vê na mobilização uma forma de coação política. Há exagero aparente, como diz o especialista na direita americana David Graham, na ideia de uma ação coordenada contra a América Latina.

“Todas essas coisas são improvisadas. Trump simplesmente fica chateado com drogas e decide que vai enviar destróieres sem pensar em como isso se desenrolará”, disse na semana passada à reportagem. Isso não significa, claro, que não possa haver algum entrechoque.

Separadamente, há a tensão com a Venezuela, a guerra comercial e política com o Brasil, a degradação abrupta da relação com a Colômbia e questões tarifárias com o México. Em comum, são países governados por governos à esquerda, mas o grau de relação deles com os EUA é bastante díspar.

Maduro é o único rival declarado, e não é de hoje. Para sua ditadura, a ideia de uma ameaça externa como a atual é música, ajudando a galvanizar apoio. Com efeito, tem trabalhado para gerar um clima de risco de invasão iminente.

Primeiro, anunciou que iria mobilizar 4,5 milhões de integrantes da Milícia Nacional Bolivariana, uma unidade paramilitar que na verdade só tem 220 mil membros treinados. Depois, falou mais genericamente numa convocação para chegar a esse número por meio de voluntários.

O efeito militar é simbólico, até porque a milícia opera só armas leves. Na segunda, contudo, Maduro disse que enviará à fronteira com a Colômbia 15 mil soldados de sua força de reação rápida, uma força de elite do Exército.

Novamente, é mais para marcar posição, até porque o governo de esquerda da Colômbia está em crise com Trump e não ofereceria risco efetivo para Caracas.

Em seu primeiro mandato, o republicano chegou a aventar a hipótese de intervenção militar contra Maduro usando os então aliados em Bogotá e em Brasília —no caso, o governo de Jair Bolsonaro (PL), hoje no centro do ataque institucional da Casa Branca ao Brasil.