SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Galinhas vivas, milho, feijão, abóbora, acerola, doce de leite e ovos são alguns dos presentes que o médico Douglas Ciríaco recebe de seus pacientes em Ouro Branco, no sertão de Alagoas. Foi compartilhando essas cenas do seu dia a dia atendendo no SUS que ele viralizou nas redes sociais. Hoje ele já soma 140 mil seguidores.
Douglas conta que os agrados costumam acompanhar o ritmo das colheitas de frutas e vegetais, mas as galinhas são constantes. “Ontem foram duas”, lembra. Muitas vezes, os presentes chegam acompanhados de recomendações. Há pacientes que entregam a galinha já sugerindo que vire pirão, ou levam espigas de milho indicando que são para canjica.
Douglas mora com a avó, que já morava na cidade antes mesmo de ele se mudar para lá por meio do programa Mais Médicos. A avó participa ativamente dessa rotina: é a primeira a provar os doces e frutas que chegam de surpresa e cuida das galinhas que põem ovos em um galinheiro. Às vezes elas acabam na panela, como sugerem os pacientes agradecidos.
Hoje, atende em uma das quatro Unidades Básicas de Saúde (UBS) da cidade e, uma vez por semana, percorre a zona rural em visitas domiciliares a moradores que não conseguem chegar ao posto seja por falta de transporte, dificuldades de saúde ou resistência em procurar atendimento.
O médico diz que a maior dificuldade continua sendo a falta de medicamentos, problema comum em unidades básicas de todo o país. Brinca que faz “medicina de guerra”, porque precisa lidar com os recursos que tem à disposição no momento para garantir o mínimo de tratamento.
Mas a escolha pela medicina não foi apenas pela vocação. Quando decidiu pelo curso, aos 18 anos, pensava principalmente na estabilidade financeira que a profissão poderia garantir. Estudou na Bolívia, em Santa Cruz de La Sierra, onde passou seis anos longe de casa. A morte do pai, no meio da graduação, transformou essa visão. “Eu percebi que dinheiro é bom só para não passar necessidade, mas quando se trata de saúde, ele não faz milagre”, diz.
Essa percepção foi reforçada com o trabalho no interior e no sistema público, algo que ele conta nunca ter imaginado quando mais novo. Entre consultas e visitas, Douglas afirma que aprendeu muito mais do que ensinou. “Aprendi a não reclamar da vida, a ter muito mais fé, a ser mais gentil, a dividir mais as coisas”, resume. Essa relação de troca, marcada por gratidão e simplicidade, também foi o que conquistou o público nas redes.
A viralização veio como consequência de um hábito antigo. Desde jovem, Douglas gostava de registrar momentos do dia a dia em redes sociais como Orkut e Facebook. Quando começou a postar sobre o trabalho no SUS, não imaginava o alcance que teria.
Um vídeo recebendo um presente chegou a milhões de visualizações, e dali em diante as postagens passaram a viralizar com frequência. Apesar disso, garante que não se deslumbra. Já viveu outras experiências com internet e sabe que a popularidade pode virar crítica da noite para o dia. Por isso, mantém o foco no trabalho e não nas métricas.
Hoje, Douglas fala da profissão como vocação. “Minha missão aqui na Terra é ser médico. Não estou dizendo que vou ser o melhor, o mais rico ou o mais inteligente, mas eu nasci para ajudar as pessoas da melhor maneira. Posso ficar milionário, que vou querer continuar trabalhando como médico.”