WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) – A CNI (Confederação Nacional da Indústria) contratou o escritório de um lobista ligado ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, às vésperas de uma viagem ao país para tentar reverter as tarifas impostas pelo republicano a produtos brasileiros.
O presidente da entidade, Ricardo Alban, vai a Washington para uma missão entre os dias 3 e 4 de setembro, acompanhado por representantes de uma série de setores.
A agenda incluirá conversas com empresários americanos, reunião na embaixada do Brasil nos EUA e uma audiência pública no USTR, o órgão americano que trata de comércio internacional, a respeito da investigação tarifária aberta contra o Brasil.
A reunião no USTR estava marcada previamente para ouvir as entidades que formalizaram apontamentos a respeito da investigação comercial aberta contra o Brasil, como fez a confederação. Caberá ao embaixador Roberto Azevêdo, ex-diretor da OMC (Organização Mundial do Comércio), representar o setor industrial na ocasião.
Como reforço à missão, a CNI contratou Brian Ballard, que tem uma das maiores firmas de lobby (profissão regulamentada nos EUA) em Washington, além de um escritório de advocacia.
Segundo o contrato, cuidarão da conta o próprio Ballard e Hunter Morgen, que atuou com comércio externo e imigração durante o primeiro mandato de Trump. Morgen foi também adjunto de Peter Navarro, que na primeira passagem do republicano pela Casa Branca, tinha o cargo de diretor do Conselho Nacional de Comércio.
Navarro atua hoje na Casa Branca como um dos principais conselheiros do presidente dos EUA para tarifas.
As negociações entre Estados Unidos e Brasil estão travadas desde que Trump anunciou que taxaria os produtos brasileiros em 50%, em 9 de julho.
As sobretaxas entraram em vigor em 6 de agosto e atingem 36% dos produtos exportados pelo Brasil aos EUA, segundo o governo brasileiro. Foram afetados itens importantes na relação comercial entre os dois países, como máquinas agrícolas, carnes e café.
Trump criou 700 exceções no decreto (leia a íntegra) que oficializou a medida, livrando 43% do valor de itens brasileiros exportados para o país das novas alíquotas, como mostrou levantamento feito pela Folha. Estão isentos do tarifaço, por exemplo, derivados de petróleo, ferro-gusa, produtos de aviação civil o que livra a Embraer e suco de laranja.
A CNI diz que um dos objetivos é conseguir ampliar o número de exceções. O governo americano tem resistido a negociar com o Brasil. Trump atrelou as tarifas, em parte, ao que vê como uma “caça às bruxas” contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O governo brasileiro e o STF (Supremo Tribunal Federal) têm sido firmes ao afirmar que não cederão na parte política e que apenas topam negociar a questão comercial. Enquanto isso, o diálogo está travado.
Apesar da dificuldade, Ballard disse à Folha ver espaço para conversar.
“Vamos focar nas exclusões, no que podemos fazer. Eu realmente acho que há espaço para mais. Estamos tendo conversas agora, não quero entrar nos detalhes disso, mas acho que há uma disposição para não prejudicar aquelas empresas e indústrias brasileiras que têm um papel importante na economia dos Estados Unidos”, avalia.
“Acho que precisamos encontrar uma maneira de fazer isso sem minar o principal objetivo do presidente [Trump], que é tentar fazer com que o governo brasileiro entenda a importância do que está acontecendo quanto à questão do ex-presidente [Bolsonaro]”, diz.
Integrantes da CNI dizem que o objetivo é fazer uma missão independente, sem ligação com o governo e com o foco empresarial para tentar ampliar as chances de negociação. A contratação de um lobista próximo à Casa Branca entra nesse contexto. A confederação não quis comentar a escolha de Ballard.
O lobista foi um dos grandes arrecadadores de fundos para as campanhas de Trump. Também já trabalhou para as Organizações Trump no passado.
A chefe de gabinete do republicano, Susie Wiles, e a secretária do Departamento de Justiça, Pam Bondi, trabalharam em sua empresa, fundada na Flórida.
O site Politico reportou em maio que o presidente americano havia rompido com Ballard em razão de um desentendimento ligado a um dos seus clientes. No mesmo mês, porém, o site Axios escreveu que o lobista havia se encontrado com Trump e Willes e resgatado os laços na Casa Branca.
O escritório de Ballard atua para gigantes americanas, como a Chevron, Bayer, JP Morgan, entre outras. Além da CNI, ele tem contrato com pelo menos outras cinco empresas brasileiras.
Dirigentes de diversas associações vão acompanhar a CNI na missão da semana que vem. Segundo a confederação, confirmaram presença até agora os representantes de associações de brinquedos, máquinas e equipamentos, têxtil, alumínio, carnes, madeira, café, ferramentas, cerâmica, entre outros.
A Embraer também é uma das empresas confirmadas na missão.