BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Eleito presidente da CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) do INSS em uma derrota importante para o governo após reviravolta da oposição, o senador Carlos Viana (Podemos-MG) afirma que o objetivo principal será impedir um novo escândalo de descontos irregulares em aposentadorias e pensões.
A busca de culpados, de acordo com o presidente, é importante, mas não a maior prioridade. Ele diz que agirá de maneira equilibrada no comando da comissão de inquérito, e que não permitirá que o colegiado se torne um palanque eleitoral.
“Quando se investiga uma tragédia, não se busca no primeiro momento os culpados. Busca-se entender quais os motivos da tragédia. Posteriormente se definem culpas. Se nós apenas buscarmos culpados, podemos cair na questão política”, afirma Viana em entrevista à Folha de S.Paulo.
“Vamos dar voz a todos os participantes, aos representantes do governo, à oposição. O embate político é natural. Não vou permitir que a CPMI se transforme em palco eleitoral. A principal missão da CPI é gerar um relatório que mude a legislação e impeça novos assaltos”, diz.
As investigações de órgãos como a Polícia Federal e a CGU (Controladoria-Geral da União) apontam que sindicatos e associações cadastravam indevidamente aposentados e pensionistas e passavam a aplicar descontos em seus benefícios diretamente na folha de pagamentos, sem autorização.
Até 22 de agosto, o INSS já ressarciu 1.895.856 aposentados e pensionistas vítimas dos descontos indevidos. Pelo acordo, o beneficiário deve desistir de eventuais ações judiciais contra o INSS por danos morais ou devolução em dobro, mas ainda pode processar a entidade que realizou o desconto indevido.
Viana foi eleito presidente da CPMI depois que uma articulação feita sob sigilo entre o PL e a federação PP-União Brasil derrotou por 17 votos a 14 o senador Omar Aziz (PSD-AM) que havia sido escolhido pelos presidentes do Senado, da Câmara e pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Viana conta que foi procurado na véspera pelo líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (RJ). Respondeu que aceitaria disputar a presidência contra Aziz, manteve as tratativas em segredo e ajudou a contar votos.
“Três integrantes da CPI nós sabíamos que não estariam na votação, e três suplentes acreditávamos que votariam conosco. Acertamos exatamente os 17 votos. Os votos da Câmara garantiram o resultado”, diz o senador.
O governo Lula reconheceu que houve falha na articulação política e apontou que a ausência de três deputados federais Mário Heringer (PDT-MG), Romero Rodrigues (Podemos-PB) e Rafael Brito (MDB-AL) permitiu que a oposição virasse o jogo.
Apesar da explicação numérica, congressistas que esperavam a eleição de Aziz também se disseram surpresos com a movimentação feita à revelia dos presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP).
Motta havia escolhido o deputado federal Ricardo Ayres (Republicanos-TO) como relator da CPMI e chegou a anunciar a decisão pelas redes sociais, desejando boa sorte a ele e a Aziz.
Viana diz que não se constrangeu em disputar a presidência rompendo a liturgia de CPIs e CPMIs, em que os dois cargos principais costumam ser acordados previamente e que conversou duas vezes com Alcolumbre após ter sido eleito.
“Coloquei para ele que meu posicionamento será técnico. Não vou permitir palanque eleitoral na CPI. Se existia esse acordo [para Aziz ser presidente da CPI], nunca fui consultado. Então, me senti livre para voltar com a candidatura”, diz.
Viana afirma que o nome do relator, o deputado federal bolsonarista Alfredo Gaspar (União Brasil-AL), foi apresentado a ele na véspera da votação durante a negociação com os partidos. O senador diz que gostou da sugestão porque Gaspar foi membro do Ministério Público de Alagoas.
De acordo com Viana, o PL queria emplacar um dos deputados do partido como relator, mas foi dissuadido por ele porque “não ajudaria a CPI a ter equilíbrio e fugir da disputa partidária”.
O presidente do colegiado minimiza a oposição feita pelo relator ao governo Lula. Gaspar já requereu a convocação de José Ferreira da Silva, conhecido como Frei Chico, irmão de Lula e vice-presidente do Sindnapi (Sindicato Nacional dos Aposentados Pensionistas e Idosos), uma das entidades citadas no escândalo.
Viana diz, porém, que os depoentes vão ser convidados em um primeiro momento. Convocações, ato político mais forte, só deverão acontecer quando convites forem ignorados, segundo ele.
“Nenhum requerimento de convocação será pautado até que a gente tenha informações claras sobre a participação de cada pessoa. Já passei essa posição ao relator, que concordou comigo. Não podemos fazer convocações apenas com base em questões políticas”, declara.
“Não quero expor ninguém que não tenha ligação com a investigação. À medida que formos quebrando sigilos bancários e telefônicos de todas as associações e sindicatos envolvidos e ouvindo os representantes oficiais, teremos uma ideia de quem participou ou não”, completa.
Viana afirma que a comissão de inquérito precisa “dar mais transparência aos aposentados e à sociedade”, mas que não poderá expor todos os nomes até apurar a responsabilidade de cada um.
O escândalo do INSS foi um dos maiores baques sofridos pelo governo Lula no atual mandato. O caso derrubou o agora ex-ministro da Previdência, Carlos Lupi, além do antigo presidente do INSS, Alessandro Stefanutto.
Apesar de o assunto ter perdido força, integrantes do governo Lula avaliam que a CPMI pode ser usada pela oposição para recuperar espaço nas redes sociais e tirar o foco do tarifaço imposto ao Brasil pelos Estados Unidos, que desgastou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e os filhos.