GRAMADO, RS (FOLHAPRESS) – “Alguém tem um papel, por favor?”, perguntou Bella Campos, na entrevista coletiva do filme “Cinco Tipos de Medo”, de Bruno Bini, o sexto e último dos longas de ficção concorrentes à premiação no 53º Festival de Cinema de Gramado, na manhã desta sexta (22).

O papel a que a atriz se refere não é um papel na televisão —como o de Maria de Fátima, que ela interpreta na novela das nove, “Vale Tudo”— ou em sua estreia no cinema, caso da enfermeira Marlene, em “Cinco Tipos de Medo”.

O que Bella Campos quer é um lenço de papel, algo que ela logo recebe da organização, e com o qual passa a secar seu queixo pontiagudo, para onde diversas lágrimas haviam escorrido nos últimos minutos.

“Quando eu saí de Cuiabá, eu achava que essa profissão nem era possível para mim e, de repente, eu volto fazendo filme. Fico muito feliz por saber que as meninas de Cuiabá podem me ver e entender que esse lugar é possível para elas. Porque eu não sabia que era possível até chegar aqui. Isso é o que mais me fortalece no dia de hoje”, afirmou a atriz.

Na noite anterior, quando o filme de Bruno Bini fez sua estreia, no Palácio dos Festivais, Campos já havia falado do orgulho e da emoção de estar representando o primeiro longa do Mato Grasso a concorrer em mais de meio século do festival de Gramado.

“Eu vou falar um milhão de vezes que, para mim, é muito especial estar estreando em uma longa produzido em Cuiabá, dirigido e roteirizado por um cuiabano. É muito, muito especial”, disse a atriz, nascida na capital mato-grossense em 1998 e que teve que sair de lá para entrar no mercado do audiovisual.

“Cinco Tipos de Medo” é um filme de ação com um engenhoso roteiro que segue alternadamente a história entrelaçada de cinco personagens. Há o músico —João Vitor Silva—, a enfermeira —Bella Campos—, o advogado —Rui Ricardo Diaz—, a policial —Bárbara Colen— e o traficante —Xamã.

O filme teve produção complexa, exibindo tiroteios nas ruas de Cuiabá, marginais que aterrorizam comunidades, emergências em hospitais e até uma rebelião em presídio. “Foi tudo real, tudo gravado em presídio, gravado no hospital. Não teve inteligência artificial. O bebê não é reborn, não. É real”, brincou a produtora Luciana Druzina.

Uma das caraterísticas mais marcantes de “Cinco Tipos de Medo” é sua montagem caleidoscópica, com constantes idas e vindas no tempo. “Gosto dessas histórias e personagens que vão acabar se encontrando em algum momento, com uma arquitetura interessante de construção”, afirmou o diretor Bruno Bini, que também assina o roteiro e a montagem.

“Optei por essa narrativa não linear por entender que poderia ser interessante e mais envolvente para o espectador. Acho que é um exercício divertido, para quem está assistindo, montar esse quebra-cabeça junto com a gente. Deu um trabalho, mas eu acho que valeu a pena”, disse ele.

“Em certo momento eu tive cinco ‘timelines’ [linhas do tempo], uma em cima da outra, uma para cada personagem. A conclusão de uma sequência geralmente conversa com a introdução da próxima, que é uma coisa que eu gosto de fazer.”

“Eu ainda não tinha visto [montado]”, disse Campos. “Vi tudo pela primeira vez com essa montagem, e adorei montar esse quebra-cabeça ali no momento. Por mais que eu tenha lido o roteiro, tem coisas que a gente não sabe, e o filme foi me surpreendendo.”

O rapper Xamã, que dá conta do papel de traficante muito bem, apesar de também estreante, é o personagem cuja violência acaba ligando todas as outras histórias. “O cinema sempre foi uma coisa muito distante para mim. E essa primeira oportunidade, já aqui em Gramado. Quando eu vi na tela, fiquei até um pouco fora de mim, assim, sabe?”

“É um filme de ação que não coloca homem só na ação, né?”, comentou a atriz Bárbara Colen, que faz a policial. “Quando eu comecei, eu não via meninas pretas e com as minhas características fazendo papéis não estereotipados. Hoje, personagens femininas pegam a ação para si. Isso é muito revolucionário. Muito dessa alegria vem da constatação de que mudança está acontecendo.”

A premiação do festival de Gramado, com a entrega dos kikitos para os longas de ficção e documentários, vai acontecer neste sábado (23), às 20h, com transmissão ao vivo pela página do Facebook do festival. O Canal Brasil passa a transmitir a partir das 20h45, com apresentação de Simone Zuccolotto.