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LUCAS LACERDA

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A discussão em torno da exploração de petróleo na bacia da Foz do Amazonas e o anúncio de subsídios para carros populares têm gerado dúvidas entre pesquisadores e ativistas quanto à marca ambiental que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) procura imprimir dentro e fora do Brasil.

Esses projetos, em evidência nos últimos dias, se somam a outros empreendimentos polêmicos, como o da Ferrogrão, ferrovia que ligaria Mato Grosso ao Pará, e o da pavimentação da BR-319 de Manaus a Porto Velho. Ambos são criticados pelos riscos de danos a povos indígenas e à conservação da Amazônia.

Especialistas afirmam que o governo petista precisa lidar tanto com o legado da gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), marcado por uma política antiambiental, quanto com a herança própria de mandatos anteriores.

“A questão é se vai optar por fazer a mesma coisa de 20 anos atrás, como um grande PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), ou algo com modelagem de baixas emissões que se conecte com o resto do mundo”, diz Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa.

Entenda abaixo o estágio de projetos que devem ser discutidos pelo governo Lula e seus impactos.

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PETRÓLEO NA FOZ DO AMAZONAS

**O que é:** exploração de petróleo na bacia da Foz do Amazonas, na região da margem equatorial brasileira, entre o Rio Grande do Norte e o Amapá.

**Por que é polêmico?** O Ibama negou a licença para perfuração de um bloco pela falta de estudos que comprovem a segurança da atividade na região, o que fez aumentar a pressão da Petrobras, do Ministério de Minas e Energia, de parlamentares e até do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) sobre a ala ambiental da gestão Lula.

As críticas, além das questões de segurança, se concentram em como o projeto é oposto aos discursos de descarbonização, transição energética e redução de emissões. Também há uma crítica sobre a pressão de exigir estudos como a AAAS (avaliação Ambiental de Área Sedimentar) recair apenas sobre o Ibama.

“Isso está sendo debatido e atacado não só no Brasil, mas no mundo. É claro que essa questão está no caso da foz do Amazonas, mas vai além, porque alguém precisa responder sobre qual o orçamento de carbono da Petrobras. E não é o Ibama, mas o Ministério de Minas e Energia”, opina Natalie Unterstell.

**Em que estágio está?** O governo exige uma ampla avaliação ambiental estratégica do empreendimento, e deve manter a regra para outros com impacto potencial parecido. A análise, no entanto, pode demorar anos, o que deve manter o impasse.

MINERAÇÃO DE POTÁSSIO NA AMAZÔNIA

**O que é:** a exploração da reserva de potássio em território indígena não demarcado em Autazes, no Amazonas, para a indústria de fertilizantes.

**Por que é polêmico?** “Tenho a impressão de que só se procura potássio perto ou dentro de terras indígenas”, afirma Suely Araújo, especialista-sênior em políticas públicas do Observatório do Clima. “Certamente tem outros locais de exploração de potássio no país.”

Além da proximidade com o território do povo mura, que vive em tensão enquanto não acontece a demarcação, a demora na Justiça para o estabelecimento da competência de licenciamento -se federal ou estadual- gerou críticas inclusive de Alckmin, cujo ministério defende uma solução para o impasse.

**Em que estágio está?** Ipaam, órgão ambiental do governo do Amazonas, afirma que não identificou sobreposição com terras indígenas no licenciamento prévio do empreendimento da Potássio do Brasil, e que o licenciamento ambiental do pedido para a licença de instalação está em análise. A Funai disse, em abril, que havia equipes no território mura para estudos ligados à demarcação.

CARRO POPULAR

**O que é:** o governo anunciou a intenção de dar incentivos econômicos para reduzir o preço e ampliar o acesso a carros populares no Brasil.

**Por que é polêmico?** A proposta vai na contramão da redução de emissões e de transição energética, além de ser considerada ineficiente para a demanda por transporte. “Enquanto o mundo caminha para a eletrificação de frotas, ou pelo menos hibridização, o que provavelmente seria nosso caso, não se ouve falar a respeito [no Brasil]”, diz Unterstell.

“Pacote com incentivos para movimentação da indústria automotiva como se estivéssemos no ano 2000 é um descompasso grande entre o governo de 2023 e o que ele tem de legados a lidar do seu passado e do governo mais recente”, critica.

**Em que estágio está?** Na quinta-feira (25), o governo anunciou uma redução do IPI e do PIS/Cofins para diminuir em até 10,96% o preço final dos veículos de até R$ 120 mil. Ainda haverá um detalhamento do plano nos próximos 15 dias.

FERROGRÃO

**O que é:** uma ferrovia com 933 km de extensão e investimentos estimados em R$ 21,5 bilhões cortando a Amazônia. O projeto conectaria Sinop (MT) ao porto paraense de Mirituba, para escoar a produção de grãos.

**Por que é polêmico?** A Ferrogrão é apontada como um grande vetor de desmatamento “de saída”, ou seja, para a instalação do trajeto.

“Talvez fosse ok construir há 20 ou 30 anos, mas agora precisamos mudar de perspectiva”, diz Unterstell.

Ela afirma que região que será atravessada pelo trajeto já é uma das mais sensíveis às mudanças climáticas. “O Centro-Oeste é onde vemos as projeções mais altas do aumento de temperatura no país.”

Ainda, o Ministério dos Povos Indígenas, liderado por Sônia Guajajara (PSOL), se opõe à redução da área do Parque Nacional Jamanxim para a passagem da ferrovia.

A reportagem procurou o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima para saber a opinião da atual gestão, mas não houve resposta. No governo Bolsonaro, em manifestação no processo, a pasta considerou positiva a redução do fluxo de cargas na BR-163 que ocorreria com a ferrovia.

**Em que estágio está?** O projeto aguarda julgamento no Supremo Tribunal Federal sobre a suspensão liminar da concessão da obra, em 2021, dada pelo ministro Alexandre de Moraes.

PAVIMENTAÇÃO DA BR-319

**O que é:** pavimentação do chamado trecho do meio da BR-319, de 400 km, estrada construída na ditadura militar para ligar Porto Velho a Manaus. Hoje esse trecho, sem asfalto, fica intransitável em períodos de chuva.

**Por que é polêmico?** Apenas com a expectativa pela obra, o desmatamento no entorno da estrada cresceu 122% de 2020 a 2022, segundo dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) reunidos pelo Observatório do Clima.

“Não é um simples asfaltamento, é uma reconstrução da estrada. O principal impacto sempre foi o desmatamento. Até porque as melhores condições de trafegabilidade facilitam a criação do efeito espinha de peixe”, diz Araújo sobre áreas desmatadas a partir da via.

A obra é uma demanda antiga de políticos locais para escoar a produção e está na lista de prioridades de Lula, mas é um desafio para o objetivo de desmatamento zero até 2030.

**Em que estágio está?** O Dnit (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) afirma que, após a licença prévia emitida pelo Ibama em julho de 2022, desenvolve o plano básico ambiental, necessário para o pedido de licença de instalação ao Ibama. Além disso, diz que contratou projetos para recuperação de áreas degradadas e mitigação dos impactos na fauna.

LINHÃO DE TUCURUÍ

**O que é:** linha de transmissão de energia elétrica que vai ligar Boa Vista ao Sistema Interligado Nacional, formado por 250 torres de alta tensão. Hoje Roraima não tem ligação com esse sistema, sendo o único estado nessa situação.

**Por que é polêmico?** Um dos pontos de maior crítica ao projeto, licitado em 2011, foi o traçado da linha no território Waimiri Atroari, além da falta de consulta aos indígenas. Em 2021, lideranças disseram que a Funai havia dado aval à obra sem consultá-los.

A fundação nega e diz que houve divergências com a Transnorte Energia S.A. sobre o plano básico ambiental, que define as compensações.

“Houve demora para o empreendedor pedir a licença de instalação, por causa de uma negociação sobre o valor da concessão e da consulta aos indígenas”, lembra Araújo.

**Em que estágio está?** Segundo o Ministério de Minas e Energia, o traçado segue paralelo à BR-174, passando na região de aldeias. O processo foi parar na Justiça e, segundo o Ibama, o acordo, homologado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, foi firmado em setembro de 2022. As obras devem começar em julho deste ano.