SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O dólar está em forte queda nesta sexta-feira (22), após o presidente do Fed (Federal Reserve, banco central dos Estados Unidos), Jerome Powell, abrir a porta para um corte de juros na próxima reunião, em setembro.

Embora não tenha se comprometido com a redução, a possibilidade injetou otimismo nos mercados de renda variável e de câmbio globalmente.

Por aqui, o dólar caía 1,51% às 12h12, cotado a R$ 5,414, aprofundando as perdas em relação a mais cedo. Já a Bolsa estava em disparada de 2,15%, a 137.405 pontos.

Fed trabalha com um mandato duplo, isto é, observa de perto os dados de emprego e de inflação para decidir sobre a política monetária. O objetivo é levar a inflação à meta de 2% sem grandes danos ao mercado de trabalho.

No discurso, Powell fez um balanço dos riscos para cada ponta desse mandato duplo. Por um lado, o mercado de trabalho parece estar em um “equilíbrio curioso”, onde a taxa de desemprego está em relativa estabilidade por causa de uma desaceleração “acentuada” tanto na oferta e quanto na demanda por trabalhadores.

“Essa situação incomum sugere que os riscos de queda no emprego estão aumentando. E, se esses riscos se materializarem, poderão aparecer rapidamente”, disse ele.

Por outro lado, as tarifas do presidente Donald Trump, que tendem a pressionar os preços ao consumidor, “podem estimular uma dinâmica inflacionária mais duradoura”.

Esses riscos estão em equilíbrio, segundo ele, e os juros estão em um território restritivo. “Isso pode justificar o ajuste de nossa postura na política monetária”, afirmou.

Para André Diniz, economista chefe da Kinea Investimentos, a sinalização “foi o mais perto possível de dizer que vai ter um primeiro corte em setembro”.

“Seria muito improvável que ele dissesse isso com todas as letras, mas foi claramente uma mudança na leitura de riscos entre a última entrevista coletiva do Fed, em julho, e esse discurso de Jackson Hole.”

O Fed está em uma sinuca de bico por causa do tarifaço de Trump. Como as tarifas tendem a aumentar os preços ao consumidor e a desacelerar as contratações, qualquer ajuste na taxa de juros terá um ônus para alguma das pontas.

Juros altos contêm a disparada inflacionária por desestimularem a tomada de empréstimos e o consumo, mas afetam as empresas, que podem reduzir o número de funcionários ou parar as contratações, resfriando o mercado de trabalho. Já um corte nos juros traria o cenário oposto: aqueceria o mercado de trabalho, mas também estimularia a inflação.

O Fed vem mantendo a taxa de juros entre 4,25% e 4,5% desde dezembro do ano passado, antes de Donald Trump ser empossado. Foram cinco reuniões neste ano que os diretores optaram pela manutenção da taxa, apesar da pressão de Trump que defende uma redução de três pontos percentuais.

Antes do discurso, operadores precificavam pouco menos de 70% de chance de um corte de 0,25 ponto percentual nos juros durante a próxima reunião, entre 16 e 17 de setembro, com os 30% apostando em mais uma manutenção. Agora, a probabilidade está em mais de 90%.

Para os mercados emergentes de renda variável e de câmbio, cortes nos juros do Fed são uma boa notícia, já que normalmente vêm acompanhados de uma injeção de recursos de investidores egressos da renda fixa norte-americana. Quando os juros por lá caem, os rendimentos dos títulos ligados ao Tesouro dos Estados Unidos também caem, levando os operadores à diversificação de investimentos.

Segundo Paula Zogbi, estrategista-chefe da Nomad, o discurso trouxe um novo grau de otimismo para esses mercados.

“Apesar de reconhecer que o ambiente macro continua desafiador, especialmente com as mudanças em imigração e políticas comerciais afetando oferta e demanda com efeitos difíceis de antecipar, o presidente do Fed afirmou que a política monetária está restritiva e sinalizou a proximidade de ajustes, o que resultou em uma resposta imediata dos ativos”, afirma.

“Os índices de ações passaram a apresentar alta firme ao considerar o discurso ‘dovish’, ou seja, indicativo de uma política monetária mais estimulativa, que melhora as perspectivas para ações e outros ativos de risco.”

O otimismo também estimula Wall Street, onde os principais índices estão em alta de mais de 1%. O Dow Jones subia 1,90%, enquanto S&P 500 avançava 1,56% e o Nasdaq Composite, 1,88%.

Para o Brasil, a perspectiva de cortes de juros pelo Fed ainda tende a favorecer o real devido à percepção de que, com a taxa Selic em patamar alto por tempo prolongado, o diferencial de juros entre Brasil e EUA permanecerá favorável para o lado brasileiro.

Por outro lado, a cena doméstica tem exercido pressão sobre o câmbio. Na segunda-feira, o ministro Flávio Dino, do STF (Supremo Tribunal Federal), decidiu que ordens judiciais e executivas de governos estrangeiros só têm validade no país se confirmadas pelo Supremo.

A decisão foi dada em ação sobre o rompimento da barragem de Mariana (MG) e não diz respeito diretamente à disputa entre Brasil e Estados Unidos. Na prática, porém, indica que o ministro Alexandre de Moraes, colega de corte de Dino, não pode sofrer as consequências da imposição da Lei Magnitsky, da qual foi alvo em julho pelo governo Donald Trump.

Como sinalizou o magistrado, instituições financeiras do país podem ser penalizadas se aplicarem sanções contra Alexandre de Moraes. Essa percepção fez o setor bancário derreter na Bolsa na terça, tendo perdido mais de R$ 41,3 bilhões em valor de mercado.

Relator do julgamento em que o ex-presidente Jair Bolsonaro é réu por tentativa de golpe de Estado, Moraes está na mira do governo Trump desde o mês passado. O magistrado é acusado de determinar prisões de forma arbitrária e suprimir a liberdade de expressão.