SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O dólar abriu em leve alta nesta quinta-feira (21) mostrando a volatilidade do mercado nesta semana. Os investidores voltam suas atenções para o início do simpósio econômico de Jackson Hole, promovido pelo Fed (Federal Reserve, o BC dos EUA), que começa nesta sexta-feira (22) e pode sinalizar os próximos passos da política monetária do país.
Ao mesmo tempo, os analistas aguardam novas informações sobre as negociações comerciais entre Brasil e Estados Unidos.
Às 9h05, a moeda norte-americana subia 0,26%, cotada a R$ 5,4872. Na quarta-feira (20), o dólar fechou em queda de 0,51%, a R$ 5,471, e a Bolsa subiu 0,17%, a 134.666 pontos.
O foco do mercado doméstico seguiu voltado à decisão do ministro Flávio Dino, do STF (Supremo Tribunal Federal), que considerou que ordens judiciais e executivas de governos estrangeiros só têm validade no país se confirmadas pelo Supremo.
A decisão foi dada em ação sobre o rompimento da barragem de Mariana (MG) e não diz respeito diretamente à disputa entre Brasil e Estados Unidos. Na prática, porém, indica que o ministro Alexandre de Moraes, colega de corte de Dino, não pode sofrer as consequências da imposição da Lei Magnitsky, da qual foi alvo em julho pelo governo Donald Trump.
O dispositivo da legislação norte-americana é usado para impor sanções econômicas contra indivíduos envolvidos em corrupção ou violações de direitos humanos. A pessoa sancionada tem bens e ativos nos Estados Unidos congelados, e entidades financeiras de lá podem ser proibidas de fazer operações em dólares com ela.
A medida incluiria o uso das bandeiras de cartões de crédito Mastercard e Visa, por exemplo. Os efeitos para as transações de Moraes em reais no Brasil ainda estão sob análise dos bancos, e o setor bancário teme os efeitos da decisão de Dino.
Como sinalizou o magistrado, instituições financeiras do país podem ser penalizadas se aplicarem sanções contra Alexandre de Moraes. Essa percepção fez o setor derreter na Bolsa na véspera, tendo perdido mais de R$ 41,3 bilhões em valor de mercado.
Pedro Moreira, sócio da One Investimentos, diz que os bancos brasileiros se encontram em dúvida sobre seguir a Magnitsky ou a decisão de Dino por temer sanções dos americanos. “O mercado começa a projetar cenários. Uma escalada na tensão poderia representar a perda de participação de bancos brasileiros no mercado internacional”.
Após o derretimento na terça, a sessão desta quarta foi de recuperação. Santander liderou as altas do setor, em disparada de 2%, seguido por Banco do Brasil (0,5%), Bradesco (0,36%) e Itaú (0,16%),
Relator do julgamento em que o ex-presidente Jair Bolsonaro é réu por tentativa de golpe de Estado, Moraes está na mira do governo Trump desde o mês passado. O magistrado é acusado de determinar prisões de forma arbitrária e suprimir a liberdade de expressão.
Quando anunciou a tarifa de 50% sobre produtos brasileiros, Trump vinculou a ameaça, entre outros pontos, justamente à suposta “caça às bruxas” de que Bolsonaro seria vítima.
Enquanto o governo brasileiro tenta negociar com os EUA, o mercado viu a decisão de Dino como um novo entrave às conversas, assim como uma possível razão para uma resposta mais dura do lado norte-americano. Investidores temem que a reação possa impactar bancos que não cumprirem as determinações das sanções.
“O dia vai ser pautado novamente pela decisão do ministro Flávio Dino, que repercutiu negativamente. Já havia incerteza fiscal e monetária no país, agora há uma incerteza jurídica, o que é muito negativo”, diz Lucélia Freitas, especialista em câmbio da Manchester Investimentos.
“O investidor acaba redobrando a cautela com essas incertezas e a situação acaba escalando a tensão entre o Brasil e o governo Trump.”
Na cena internacional, as atenções estiveram voltadas para o simpósio de Jackson Hole, cuja principal atração para o mercado é o discurso de Jerome Powell na sexta-feira.
O encontro terá início na quinta, em meio a crescentes expectativas de que o Fed corte os juros no próximo encontro de política monetária, em setembro. Na ferramenta FedWatch, operadores precificam 83% de chance de uma redução de 0,25 ponto percentual na taxa, e os 17% restantes apostam na manutenção da atual banda de 4,25% e 4,5%.
As apostas no afrouxamento sucedem uma série de dados que indicaram que as tarifas comerciais de Trump podem estar começando a impactar a economia dos EUA, podendo provocar tanto preços mais altos como uma desaceleração econômica.
A perspectiva de cortes de juros pelo Fed pode favorecer o real devido à percepção de que, com a taxa Selic em patamar alto por tempo prolongado, o diferencial de juros entre Brasil e EUA permanecerá favorável para o lado brasileiro.
Ainda, a ata da última reunião do Fed, em julho, mostrou que os dois diretores que discordaram da manutenção de juros da decisão passada pareceram isolados em seu apoio ao corte já naquele encontro.
“Quase todos os participantes consideraram apropriado manter a faixa da taxa de juros entre 4,25% e 4,50% nesta reunião”, diz a ata.
Os diretores Michelle Bowman e Christopher Waller votaram pela redução de 0,25 ponto percentual para proteger a economia de um enfraquecimento ainda maior do mercado de trabalho. Os outros dirigentes, porém, se mostraram mais preocupados com um possível repique inflacionário por causa das tarifas de Trump.
O discurso de Powell na sexta-feira possivelmente o último discurso dele como chefe do banco central, considerando o fim do mandato em maio poderá mostrar se ele se uniu àqueles que acham que chegou a hora de tomar medidas para proteger o mercado de trabalho de um enfraquecimento maior ou se ele continua alinhado com aqueles que são mais cautelosos com a inflação.