SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O auditor fiscal Artur Gomes da Silva Neto, apontado pelo MP-SP (Ministério Público de São Paulo) como o principal articulador de um esquema bilionário de manipulação de créditos de ICMS, teve sua prisão temporária convertida em preventiva, que não tem prazo definido, nesta quarta-feira (20).

O pedido foi formalizado pela promotoria, após o fim da prorrogação da prisão temporária e citava a carta apreendida na residência do auditor entre as provas para justificar a medida mais rigorosa.

Silva Neto está preso desde o dia 12 de agosto, quando foi deflagrada a Operação Ícaro. O MP-SP afirma que ele atuava como um coringa, pois, segundo a promotoria, fazia orientação de executivos de grandes varejistas, a preparação de documentos, acelerava análises internas e autorizava a transferência de créditos para outras empresas, tudo mediante o suposto recebimento de propinas.

Procurada, a defesa de Artur Gomes da Silva Neto não se manifestou até a publicação.

Uma carta encontrada na casa de Silva Neto dirigida a um interlocutor ainda não identificado menciona a proposta de “novas liberações de imposto” e o temor de ser descoberto, segundo o MP-SP. Trechos da carta como “Preciso ter certeza de que NADA vai acontecer” e “Preciso ter certeza que NINGUÉM vai ver esses papéis que vou assinar”, são citados pelo Ministério Público como provas das práticas delitivas e da participação do auditor.

Na decisão do TJ-SP (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo), o juiz Paulo Fernando Deroma de Mello, da 1ª Vara de Crimes Tributários, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores da Capital, escreveu que alguns documentos apreendidos demonstram, de forma inequívoca, a participação de Silva Neto nos delitos sob apuração da promotoria.

“A referida carta demonstra confirma [sic] o esquema criminoso operado por Artur, além da intenção do fiscal em manter o sigilo para viabilizar a continuidade do esquema criminoso”, escreveu o juiz.

O magistrado também considerou que a cautelar é viável pois o suposto crime tem pena superior a quatro anos, existem provas materiais contra o auditor e indícios de autoria do crime.

“Ressalto que os fatos tratados nos autos são de enorme gravidade, considerando a magnitude do dano aos cofres públicos até então apurada. Conforme constatado, o investigado Artur ocuparia papel central no esquema criminoso sob apuração, praticando, em tese, os crimes de corrupção ativa e lavagem de dinheiro”, afirmou o juiz.

Na decisão, o magistrado diz que “o acusado agiu no contexto de um grupo criminoso destinado a prática de crimes envolvendo a movimentação de expressiva quantia de dinheiro, tratando-se de grupo complexo e com facilidade na reinserção de membros nas atividades ilícitas”.

Por isso, com as particularidades e complexidade do crime, a Justiça entendeu que existe o risco concreto de destruição de provas, além da comunicação entre os investigados.

“Também não se pode ignorar que grande parte dos valores ilícitos ainda se encontra em poder do grupo criminoso, resultando na possibilidade de evasão” diz, em outro trecho.

Para a promotoria, o documento demonstra a intenção do fiscal em manter o sigilo para a continuidade do esquema criminoso. A conversão da prisão temporária para preventiva, segundo o MP, é crucial para garantir a ordem pública e evitar que Artur pratique outros delitos ou interfira nas investigações em andamento, dada sua posição e influência na Sefaz-SP (Secretaria da Fazenda de São Paulo).

Antes da decisão do TJ-SP, a defesa de Silva Neto, representada pelos advogados Paulo Amador da Cunha Bueno e Fernando Capez, pediu a revogação da prisão preventiva alegando não haver justificativa para sua manutenção. A defesa argumentava que Artur solicitou sua exoneração do cargo de auditor fiscal, o que demonstraria a ausência de risco à ordem pública.

Sugeriram, como alternativas, a prisão domiciliar e o uso de tornozeleira eletrônica. Além disso, a defesa apresentou um parecer médico indicando que Silva Neto sofre de quadro depressivo grave, com “ideação suicida persistente, insônia contínua, inapetência e desidratação”, fazendo uso de altas doses de psicotrópicos.

Paralelamente, o Ministério Público está investigando a criação de um falso banco, denominado Dac Bank, supostamente estruturado por ele para movimentar recursos suspeitos e dar uma aparência de legalidade às operações financeiras ilícitas.

A mãe de Silva Neto, a professora aposentada Kimio Mizukami da Silva, figura como uma das sócias do Dac Bank, que foi registrado em 2023 com um capital social declarado de R$ 3,5 bilhões, mas não possui registro no Banco Central, segundo as investigações.

A Operação Ícaro investiga um suposto ressarcimento ilegal de ICMS retido por substituição tributária e já levou à prisão temporária de Silva Neto, Sidney Oliveira (dono da Ultrafarma), e Mário Otávio Gomes (diretor da Fast Shop).

Enquanto Oliveira e Gomes foram soltos sob a condição de pagamento de fiança de R$ 25 milhões e uso de tornozeleira eletrônica, Silva Neto permanece preso.

Os depoimentos do auditor fiscal e sua mãe, que seriam colhidos nesta quarta-feira (20), foram adiados a pedido da defesa.

As investigações do MP-SP continuam, e não são descartadas novas prisões, incluindo a de outros envolvidos na Sefaz-SP.