BELÉM, PA (FOLHAPRESS) – Após a polêmica da exclusão de símbolos da culinária regional de Belém, como açaí, tucupi e maniçoba, no edital que seleciona restaurantes e quiosques para fornecer alimentação na COP30, os povos tradicionais reivindicam igualdade de condições na concorrência da cúpula climática.
Movimentos da sociedade civil pedem a isenção da taxa de montagem dos quiosques de alimentação no Parque da Cidade, local que vai sediar a conferência da ONU (Organização das Nações Unidas) na capital paraense.
As reclamações foram feitas em uma audiência pública promovida em Belém, nesta terça (19), pela OEI (Organização dos Estados Ibero-americanos), entidade que gere a montagem do evento, e Secretaria Especial da COP30.
O encontro foi agendado para tirar dúvidas de produtores e empreendedores e acalmar os ânimos, mesmo após a publicação de uma errata, no final de semana, liberando a venda dos produtos regionais nos restaurantes oficiais na COP30.
Empreendedores tradicionais queixam-se que há um alto custo da padronização dos espaços, por meio de pagamento de uma taxa de montagem de US$ 250 (cerca de R$ 1.370) a US$ 280 (R$ 1.540) por metro quadrado, além de outras exigências do edital que desfavorecem os pequenos empresários.
“Um restaurante pode concorrer com cinco, dez equipamentos. Estamos concorrendo com restaurantes grandes e não temos como pagar nem por um. O valor que estão cobrando é impossível para nós”, reclamou a chef Juci D’Oyá, da Associação Nacional das Baianas de Acarajé.
Ela atua há oito anos na ilha de Cotijuba, região metropolitana de Belém, oferecendo, além de acarajé, receitas com ingredientes regionais e que valorizam a cultura ancestral. Ela reclama da forma como foi feito o processo e diz que a os povos tradicionais nem deveriam participar da licitação.
“Não queremos participar de um edital. Nós precisamos e temos que ser convidados por reparação, por justiça. Queremos que a ONU e todos que estão envolvidos na COP30 possam nos olhar como os guardiões da floresta amazônica, porque nós que somos os guardiões dos saberes ancestrais, da gastronomia e de tudo que permeia a amazônia”, diz.
O edital da OEI prevê 33 lotes, sendo 17 na chamada zona azul (espaço usado para as negociações entre países) e 16 na verde (onde ocorrem eventos da sociedade civil). Ao todo serão 6 restaurantes, sendo 5 na zona azul e 1, na verde, além de 78 quiosques.
Tainá Marajoara, representante do ponto de cultura alimentar Iacitatá, iniciativa de base comunitária que trabalha com agricultura familiar e conhecimento tradicional no Pará, classificou o edital como excludente para os povos tradicionais.
“Tudo aquilo que é colocado como meta, como sistemas de baixo carbono, combate à fome, mitigação e adaptação climática, nós somos as pessoas que realizam isso de forma milenar. E não sermos reconhecidos pelas nossas competências para também integrar esses espaços de alimentação na COP, isso também é racismo.”
O diretor de planejamento e gestão da COP30, Thiago Aguiar, afirmou à Folha de S.Paulo que todas as reivindicações serão avaliadas pela organização e, semelhante ao que houve com o caso da exclusão de açaí e outros produtos, elas também podem gerar uma errata no edital e até a prorrogação do prazo de envio de propostas.
“Depois desta audiência, com muito mais participação, temos muito mais elementos para fazer uma revisão final no edital”, disse. A ideia, ele defendeu, é que haja “a maior participação possível de todos os fornecedores do Pará e da região”.
Ainda segundo Aguiar, será avaliada a viabilidade da isenção da taxa de montagem dos quiosques, assim como a criação de espaços específicos para esses empreendedores, “sem concorrer com outros restaurantes que já estão estabelecidos no mercado e têm muito mais estrutura”.
Após audiência pública, a organização diz também ter percebido a necessidade de oferecer um atendimento presencial em Belém para dar maior suporte aos negócios que queiram participar da concorrência.
Até o final da semana, um plantão de atendimento estará montado na sede do Banco Central em Belém, para tirar dúvidas sobre a inscrição no edital.