BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Ao receber no Palácio do Planalto o seu homólogo do Equador, Daniel Noboa, de centro-direita, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou nesta segunda-feira (18) que as diferenças políticas não devem se sobrepor ao objetivo de construir uma América Latina forte.

Em suas declarações, Lula também voltou a criticar as big techs e a defender a autonomia das instituições.

Noboa, por sua vez, reforçou o posicionamento do brasileiro de alinhamento entre os dois países latinos. Ele afirmou que a discussão ideológica é uma página virada.

“Expus ao presidente Noboa a urgência com que o governo e a sociedade brasileira vêm procurando enfrentar a criminalidade na esfera digital. Nossas sociedades estarão sob constante ameaça sem a regulação das big techs. Esse é o grande desafio contemporâneo de todos os Estados. As redes digitais não devem ser terra sem lei, em que é possível atentar impune contra a democracia, incitar o ódio e a violência”, afirmou Lula.

Noboa, 37, assumiu a Presidência do Equador em novembro de 2023 com um mandato-tampão. Neste ano, ele foi reeleito no segundo turno após uma jornada acirrada, com 55,83% dos votos, ante 44,17% da oposição.

“Em um cenário global desafiador, em que a rivalidade se agrava e instituições multilaterais são ameaçadas, é preciso firmeza na defesa da nossa independência. Para o Brasil, autonomia é sinônimo de diversificação de parcerias”, disse Lula. “Essa visita do presidente simboliza o relançamento da nossa relação bilateral.”

Desde que chegou ao poder, Noboa coleciona críticas de especialistas e representantes da sociedade civil, que o acusam de solapar as regras da democracia.

Noboa se recusou a se licenciar da Presidência durante sua campanha vitoriosa à reeleição, no começo do ano, como dita a lei. Ele também é acusado de violações de direitos humanos com sua estratégia de militarizar a segurança pública.

No início do mês, o presidente equatoriano divulgou perguntas que pretende fazer em uma consulta popular sobre instalar bases militares no Equador e promover impeachment de juízes da corte equivalente ao STF (Supremo Tribunal Federal), com quem Noboa trava embates.

Lula reforçou a colaboração entre os dois países na área da segurança pública e anunciou a reabertura de uma sede da Polícia Federal em Quito. “Podemos fazer muito mais, desde ações para coibir atividades criminosas dentro de prisões até operações para reprimir o contrabando de armas”, disse o brasileiro.

“Não é preciso classificar organizações criminosas de terroristas, nem violar a soberania para combater o crime organizado. Só conseguiremos deter organizações criminosas que se espalharam pela América do Sul agindo juntos. Reforcei ao presidente Noboa a oferta brasileira de cooperação”, acrescentou o brasileiro. O diretor-geral da PF brasileira, Andrei Rodrigues, também esteve presente no evento.

A fala foi uma aparente referência ao plano dos Estados Unidos para empregar militares em ações contra determinados cartéis de drogas da América Latina classificados pelo governo de Donald Trump de organizações terroristas.

Segundo a imprensa americana, Washington vai deslocar mais de 4.000 fuzileiros navais e marinheiros para águas próximas à América Latina e ao Caribe, como parte da operação.

Como é costume nas recepções dos chefes de Estado, Lula fez uma reunião a portas fechadas com o presidente do país vizinho, seguido de assinatura de atos e almoço no Palácio do Itamaraty.

Entre os temas a serem tratados pelos dois líderes estão comércio e investimentos, num momento em que o Brasil busca ampliar seu mercado internacional após o tarifaço anunciado por Trump.

Os dois também deveriam tratar de desenvolvimento social, ciência e tecnologia, integração sul-americana e cooperação amazônica, além de ambiente e mudança do clima, com a aproximação da COP30 (conferência climática da ONU a ser realizada em novembro, no Brasil).

Em 2024, a corrente de comércio entre os dois países somou US$ 1,1 bilhão, com exportações brasileiras da ordem de US$ 970 milhões. Os principais itens exportados do Brasil para o Equador são veículos, máquinas, medicamentos e produtos das indústrias de papel e celulose.

Após a vitória de Noboa em 2023, Lula parabenizou o líder do país vizinho e reforçou que pretendia manter a boa relação entre as duas nações. “Expresso minha disposição de seguir trabalhando pelo bem-estar dos nossos povos, tradicionalmente amigos, de aprofundar as relações bilaterais e de atuar pelo desenvolvimento da América do Sul”, dizia a nota do governo brasileiro.

O encontro entre os dois ocorreu um dia após a esquerda ser derrotada na Bolívia, ao ficar de fora do segundo turno da disputa presidencial.

Foi a primeira vez em 20 anos que o MAS (Movimento ao Socialismo), partido que teve no ex-presidente Evo Morales sua figura mais emblemática, ficou de fora da disputa na Bolívia.