BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Ministério Público junto ao TCU (Tribunal de Contas da União) fez um pediu à corte a suspensão das tratativas relacionadas às 116 áreas de minerais críticos que o escritório 3D Minerals, de Belo Horizonte (MG), venceu no leilão conduzido pela ANM (Agência Nacional de Mineração).
Em sua representação, o subprocurador-geral do MP-TCU, Lucas Rocha Furtado, solicita que a decisão seja tomada o quanto antes pela corte, até que sejam comprovadas a capacidade técnica e financeira da 3D Mineral para conduzir as atividades de pesquisa e exploração mineral “ante o risco de prejuízo irreparável e a alta relevância estratégica e econômica para o país”.
À reportagem, o presidente do TCU, ministro Vital do Rêgo, afirmou que o caso é preocupante, dada a importância estratégica dos minerais críticos para o país.
O ministro informou que a escolha do relator será feita por meio de sorteio, entre esta segunda (18) e terça-feira (19). “Espero que o relator se debruce logo sobre o tema”, disse.
Para Vital do Rêgo, a política nacional que trata dos minerais críticos está atrasada. “É preciso ser mais efetiva do que é hoje”, comentou.
O caso da 3D Minerals foi revelado pela Folha de S.Paulo. Como mostrou a reportagem, a empresa, sediada em um pequeno escritório em Belo Horizonte e criada 46 dias antes do leilão anual da ANM, arrematou sozinha 116 áreas de minerais críticos em diversas regiões do país, somando 6.462 km² sob seu controle.
A área total conquistada pela empresa equivale a um território 12% maior que o Distrito Federal -ou mais de quatro vezes o tamanho da cidade de São Paulo. A empresa fez lances que somaram R$ 54,824 milhões, e Mato Grosso foi o alvo principal, com 61 áreas.
Em seguida, aparecem Bahia (22), Pará (18), Goiás (9), Paraíba (2), Roraima (3) e Rondônia (1). De acordo com os registros, a 3D Minerals deu os lances mais altos e ganhou o direito de comandar a pesquisa de 101 áreas de cobre, 13 de níquel e duas de tântalo.
Esses são alguns dos principais minerais críticos, alvos de disputas internacionais que mobilizam Estados Unidos e China, pelo fato de serem essenciais em indústrias de computação, defesa, carros elétricos, celulares e tudo o que demande ligas metálicas e baterias.
“A ausência de experiência da empresa no setor mineral, aliada ao fato de ter sido criada pouco antes do leilão, levanta sérias dúvidas sobre sua capacidade técnica e financeira para conduzir as atividades de pesquisa e exploração mineral”, afirma Lucas Furtado, em sua representação.
Além disso, fiz Furtado, a possibilidade de venda dos direitos de pesquisa a terceiros pode abrir margem para especulação e desvio de finalidade, comprometendo o interesse público e a soberania nacional sobre recursos estratégicos.
“É imperativo que o TCU atue preventivamente para evitar danos ao erário e à soberania nacional. A exploração de minerais críticos é um tema de alta relevância estratégica e econômica, com implicações internacionais. A atuação do TCU nesse caso pode contribuir para garantir a transparência, a legalidade e a eficiência do processo, além de proteger os interesses nacionais”, declarou.
A reportagem tentou ouvir a 3D Minerals sobre o assunto, por telefone, email e pessoalmente, ao visitar seu escritório em Belo Horizonte. Não houve nenhum retorno.
Além de pedir comprovação técnica e financeira da empresa, o MP-TCU pede à corte que dê ordem para que a ANM apresente, no prazo a ser estipulado tribunal, informações detalhadas sobre o processo de leilão, incluindo os critérios de habilitação e as justificativas para a autorização de alteração de lances após a abertura dos envelopes.
A solicitação trata ainda de apuração sobre a idoneidade das empresas participantes, além de cobrar “medidas corretivas para aprimorar eventuais irregularidades no processo garantindo maior transparência, segurança e proteção ao interesse público”.
A 3D Minerals está em nome dos sócios Eduardo Wanderley e Daniel Wanderley, além de uma pessoa jurídica (Way Minerals Ltda) que pertence ao próprio Daniel e que também foi aberta em junho de 2024.
A família Wanderley é conhecida em Belo Horizonte pela atuação na área de construção civil, à frente de empresas como a Wanmix e a Conserva de Estradas, sem relação com setor mineral.
Em 2018, ambas empresas foram citadas em inquéritos da Polícia Federal que investigavam o então senador Aécio Neves (PSDB), por suspeitas de irregularidades na arrecadação para a campanha eleitoral de 2014.
As acusações envolviam apurações sobre repasses financeiros e suspeitas de doações dissimuladas a campanhas políticas. Conforme apontou a Procuradoria-Geral da República em 2018, a partir de extratos apreendidos na Wanmix, um consórcio formado pela construtora Cowan, também da família Wanderley, transferiu R$ 1,5 milhão à Conserva de Estradas, que no mesmo dia repassou exatamente o mesmo valor ao diretório nacional do PSDB.
Apesar do desgaste para Aécio Neves, a operação perdeu força ao longo dos anos no campo judicial. A Câmara barrou denúncias feitas em delação pela JBS e o TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região) acabou absolvendo Aécio das acusações, decisão que foi confirmada em instâncias superiores.
A 3D Minerals também está à frente de uma operação polêmica ligada ao mesmo leilão de 2024 da ANM, caso que foi revelado pela Folha.de S.Paulo
A empresa recebeu autorização da ANM para alterar um dos seus lances após a abertura dos envelopes. No caso específico, a empresa fez uma oferta de R$ 37.576.100 por uma área de cobre no Pará. Depois, alegou que tinha errado o valor, colocado um zero a mais na proposta e que, na verdade, seu lance seria de R$ 3.756.100,00. Tratava-se de um dos maiores negócios da empresa fechados no leilão.
Após a publicação da reportagem, o Ministério Público junto ao TCU pediu à corte que suspendesse o resultado do leilão. O TCU ouviu os argumentos da empresa e decidiu que seus sócios não conseguiram apresentar justificativas plausíveis. O leilão da área acabou suspenso.