SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Após gastar R$ 121,4 bilhões no ano passado, o maior orçamento já registrado na cidade de São Paulo, a gestão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) cortou custos e congelou pagamentos nos primeiros seis meses de seu segundo mandato. O valor foi atualizado pela inflação do período.
No primeiro semestre deste ano, a gestão municipal reduziu em 21,7% as despesas em comparação ao mesmo período do ano passado foram R$ 14,2 bilhões a menos em valores corrigidos. A área mais afetada foi a assistência social, e as secretarias de Saúde, Transporte, Habitação e Educação, que tiveram reduções de cerca de 16% cada.
O corte representou uma inversão no padrão de gastos da atual gestão, que manteve aumentos anuais de despesas de maneira recorrente desde 2021, quando Nunes assumiu a prefeitura após a morte de Bruno Covas (1980-2021).
As despesas acompanharam recordes de acumulação no caixa nos últimos quatro anos, com aumento da arrecadação de ISS (Imposto sobre Serviços) e o acordo que concedeu à União a área do aeroporto Campo de Marte em troca de abatimento de R$ 23,9 bilhões em dívidas da prefeitura com o governo federal.
Com a negociação, a gestão municipal deixou de desembolsar cerca de R$ 3 bilhões anuais para quitar os débitos, e o valor foi repassado a investimentos a partir de 2022.
Naquele ano, a prefeitura fechou o primeiro semestre com R$ 42,2 bilhões em despesas. Em 2023, no mesmo período, foram R$ 56,2 bilhões, em valores atualizados, uma alta de 33,1%. Neste ano, as despesas até fim de junho caíram para R$ 35,8 bilhões.
Em 2024, ano da campanha eleitoral que culminou na reeleição de Nunes, foram entregues 44 equipamentos de saúde, novos ou reformados, sendo 22 UBS (Unidades Básicas de Saúde) e oito UPAs (Unidades de Pronto Atendimento).
Na direção oposta aos cortes, a receita do município aumentou nos primeiros seis meses deste ano, quando foram acumulados 53,8 bilhões, acima dos R$ 51,7 bilhões registrados em caixa nos seis primeiros meses de 2024. Atualmente, as despesas representam 95,3% das receitas.
Para Marco Antonio Carvalho Teixeira, pesquisador do Centro de Estudos de Administração Pública e Governo da Fundação Getulio Vargas (FGVceapg), o corte nos gastos é explicado pela necessidade de ajustar as contas que aumentaram naturalmente com os investimentos feitos com o recurso adicional. “É uma fonte que se esgota e não entra no custeio, diferente da receita orçamentária, que é prevista todos os anos com base na tributação”, explica.
“Existe uma previsão de gastos e investimentos e, se a receita não entra como imaginado, tem que cortar custos. O problema é sempre a maneira como essas escolhas são feitas”, continua.
Questionada, a gestão Nunes não comentou os cortes e afirmou que o orçamento deste ano é 12,5% maior do que no ano anterior e que prevê a ampliação dos investimentos e o equilíbrio das despesas.
Com redução de 26,8%, a assistência social está entre as áreas que mais sofreram cortes neste primeiro semestre após reeleição de Nunes. Até junho deste ano, a secretaria despendeu R$ 1,4 bilhão, menos do que os R$ 2 bilhões gastos no mesmo período em 2024.
Diante disso, organizações sociais contratadas pela prefeitura para gerir os serviços têm reclamado de congelamento nos pagamentos e pedidos da secretaria para alterar contratos e reduzir a quantidade de vagas disponíveis.
Desde o início do ano, as notas de empenho que deveriam garantir os pagamentos ao longo dos contratos estão sendo liberadas a conta-gotas, com previsão de faturamento para poucos meses e até semanas, o que dificulta a execução dos serviços, segundo gestores.
Foi elaborado um manifesto público contra o congelamento dos repasses, e funcionários de entidades sociais organizaram uma manifestação no último dia 7.
Em documento encaminhado à Secretaria de Governo Municipal, no início de agosto, a secretária de Assistência e Desenvolvimento Social, Eliana Gomes, alerta para a necessidade de suplementação orçamentária de R$ 56,5 milhões para manter o funcionamento de 514 serviços que atendem 75 mil vagas, entre moradores de rua e crianças e adolescentes vulneráveis.
“Já não dispomos de recurso financeiro suficiente para o custeio integral destes serviços”, diz documento assinado pela secretária ao qual a Folha de S.Paulo teve acesso.
Em outro trecho, ela relata um cenário de instabilidade na rede socioassistencial diante das reclamações reiteradas de gestores sobre atrasos nos repasses, “o que já resultou em diversas solicitações de rescisão de termos de convênio”.
Na mesma semana, a secretária enviou email com orientação a integrantes da pasta para reduzir de 800 para 500 vagas o atendimento a pessoas em situação de rua por um instituto que atua na região central da cidade. Ela também comunicou que autorizou reserva de recursos para apenas dois meses do referido contrato.
Em nota, a gestão Nunes não comentou a posição da secretária e afirmou que o orçamento da pasta previsto para este ano é maior do que o praticado em 2024. “Portanto, não há qualquer desassistência na área social; os serviços seguem funcionando normalmente.”
Sobre a redução de vagas em serviço para atender moradores de rua, a prefeitura afirmou que se trata de adequação para realocar “recursos e esforços para atender outras áreas”.