FOLHAPRESS – Quem quer que já tenha posto os olhos num filme de terror sabe que uma das piores coisas é ir para um idílico cenário interiorano, em busca de paz de tranquilidade.

Millie (Alison Brie) e Tim (Dave Franco), inocentes, caíram nessa. Eles formam um casal estranho. Tim diz que adora Millie, com quem não mantém atividade sexual há séculos. Millie acha que a vida no interior, onde arrumou emprego como professora, pode resolver não só esse problema, como dar um jeito na estagnada carreira de músico do namorado.

Entre parênteses: não é de estranhar que Tim tenha pesadelos quase toda noite e nele estejam os melhores efeitos propostos pelo filme e mesmo os momentos em que o espectador é mais convocado a entrar numa outra esfera que não a da realidade cotidiana.

Dito isso, é mais ou menos óbvio que Millie está enganada. O interior estará longe de ser uma experiência paradisíaca para eles. Como sempre acontece nessas ocasiões, eles logo encontram um vizinho simpático e oportuno, que lhes informa sobre as atrações do local —as trilhas, especialmente.

Bem, desta vez, ao contrário do que se possa imaginar, o perigo não está na casa. A primeira trilha que tomam os leva a cair num buraco enorme. Passarão lá dentro mais de uma noite, mas no fim conseguirão sobreviver. Ali, no buraco, começam a compreender que muitos mistérios cercam aquele aprazível lugar. Não o bastante para mudarem de cidade, porém.

Tim continua a sofrer com seus pesadelos. Eles envolvem o pai e a mãe, cujas figuras aparecem de um modo ou de outro terrivelmente deformadas.

A sequência mais decisiva do filme, no entanto, é a do acidente que leva o casal àquele buraco onde termina a trilha. Não é tanto de terror que se trata, mas da angústia de estar num poço, sem ter a quem apelar. Nada. Pior: ali se encontram as ruínas de uma igreja e, como é de lei, um cemitério.

Passado esse incidente, voltamos aos problemas do casal. Tim tem um ensaio com seu grupo musical na cidade. Precisa tomar o trem. Millie está quase aliviada por se ver livre do companheiro. Na última hora, porém, Tim faz meia volta. Sente que precisa encontrar a amada. Vai até a escola onde ela dá aulas e, pimba! Enfim, têm uma relação sexual, em pleno banheiro dos alunos.

Como certamente já deu para notar, “Juntos” trata de uma crise conjugal. Um casal jura que se ama profundamente. Não vemos sinal dessa profundidade amorosa em nenhum deles, mas, tudo bem, não é esse o ponto. A questão é: o que fazer? A separação é uma hipótese plausível, mas dolorosa. Ir para um lugar idílico, longe dos problemas, estamos vendo que não vai resolver nada.

Mas, quando transam no banheiro, algo parece se transformar: ao final, eles quase não conseguem se separar. Algo assim já havia ocorrido quando caíram no grande buraco.

Daqui por diante não se pode falar muito do que virá para não estragar o duvidoso prazer que o filme reserva aos seus espectadores. Grosso modo, estaremos diante de uma espécie de sub-Cronenberg, com transformações que atingem o corpo de maneira acentuada —com menos imaginação do que o recente “A Substância”.

É possível mencionar o pensamento central do filme: o amor não se define pela atração sexual, como queria Freud, mas pela fusão integral de duas almas que se procuram. É uma premissa, no fim das contas, bem puritana.

Nada espantoso: o terror, que já foi um gênero de liberação (do inconsciente, sobretudo), agora vai na direção contrária: propõe a sublimação não como uma renúncia em favor da vida da sociedade, mas como renúncia ao desejo.

Em poucas palavras, este é um filme que vai na direção do vento. E os ventos que sopram hoje em dia são doentiamente regressivos.

JUNTOS

– Avaliação Regular

– Elenco Alison Brie, Dave Franco, Damon Herriman

– Produção Austrália, Estados Unidos, 2025

– Direção Michael Shanks