SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em Balneário Camboriú, não é incomum o corretor de imóveis chegar de Porsche, servir café na prensa francesa e exibir vídeo em 4K da cobertura com vista para o mar. O cliente assiste, agradece e vai embora. No dia seguinte, pousa de helicóptero para ver o imóvel e fecha a compra.

A cidade catarinense, com pouco mais de 150 mil habitantes, venceu bairros como Jardins, em São Paulo, e Leblon, no Rio de Janeiro, e hoje tem o metro quadrado mais caro do Brasil. Um fenômeno imobiliário, econômico e de marketing.

No endereço mais vertical do Brasil, o corretor não é apenas vendedor, mas centro desse mercado bilionário. Isso envolve inclusive fazer parte do estilo de vida de quem compra um imóvel de R$ 10 milhões sem precisar de financiamento.

“Não dá para vender algo que você não conhece ou não vive. O cliente percebe quando não há conexão”, diz Bryann Germano, sócio e gestor da Felicità Imóveis, que projeta movimentar R$ 1 bilhão em valor geral de vendas (VGV) neste ano.

Na estratégia da empresa, o comprador em potencial vive como morador por até três dias -com direito a lancha, jantares e carro de luxo à disposição. Segundo Germano, às vezes, nem pergunta o preço, só quer saber se ainda está disponível.

A venda começa antes do cliente chegar à cidade, afirma Alex Brito, diretor da FG Empreendimentos -incorporadora responsável pelo Senna Tower, prédio que promete ser o residencial mais alto do mundo. A empresa oferece aos clientes traslado de jatinho, passeio de helicóptero, hospedagem em apartamento decorado e almoço gourmet.

“Não é sobre preço. É sobre fazer o cliente sentir que já pertence àquele lugar”, afirma Brito.

É nesse clima de pertencimento que a cidade também trabalha para continuar atraente a compradores. O boom imobiliário de Balneário Camboriú se apoia em uma combinação de investimento privado com parceria pública, com obras e projetos de infraestrutura ambiciosos.

Entre os que estão em andamento estão o parque linear de 7 km na orla central, a revitalização da Avenida Brasil com fiação subterrânea, novos acessos à BR-101 e obras de drenagem.

No radar do setor também estão novos polos de turismo de luxo, como um shopping voltado ao público de alta renda, restaurantes com estrela Michelin, o museu Ayrton Senna no edifício Senna Tower e a chegada de redes hoteleiras de alto padrão como o Emiliano e o Colíneo de France.

“Hoje, o cliente não está em Balneário. Ele está em São Paulo, no Mato Grosso, nos Estados Unidos”, diz Germano. “Por isso, nosso maior investimento é em digital. Instagram, Facebook, Google.”

Diogo Martins, CEO do Instituto Brasileiro de Educação Profissional (IBREP), que forma corretores, diz que vender em Balneário Camboriú exige um preparo acima da média. Para ele, conhecimento é tão importante quanto conexão: estudar arquitetura, arte e tendências, manter rede ativa com construtoras e parceiros estratégicos.

“Um corretor que tem uma conversa inteligente conquista clientes que ficam ao lado dele uma vida inteira”, diz Martins.

A imagem conta. Bruno Cassola, na corretagem desde 2007, virou influenciador. Ele tem vídeos com milhões de visualizações no TikTok mostrando bastidores das obras, visitas a imóveis e sua rotina de luxo.

“As pessoas compram de quem confiam. Mostrar quem você é cria conexão”, diz.

“Nós somos consultores, estudamos o mercado diariamente. Qualquer corretor do Brasil pode atuar aqui, se tiver a autorização do Creci de Santa Catarina ou fizer parceria com imobiliária daqui, mas talvez ele não tenha tanta informação mercadológica que é crucial para o cliente”, afirma Cassola.

Seu Instagram virou cartão de visita. Clientes já chegam sabendo onde ele mora e quanto ele já vendeu. O esforço rende. Comissões passam de seis dígitos.

“Essa profissão mudou minha vida. Não tenho faculdade, mas trabalho com imóveis de R$ 20 milhões”, diz ele. Ele gosta de lembrar que três dessas unidades estão no Senna Tower, “o residencial mais alto do planeta”.

Germano também não esconde o orgulho de ter sua equipe à frente de algumas das vendas dos principais imóveis da cidade, em especial o da primeira unidade comercializada no prédio de altíssimo padrão da construtora FG inspirado no piloto Ayrton Senna.

“Foi muito especial. Um empreendimento histórico, e o comprador adquiriu para presentear a esposa, que tem memórias de assistir as corridas do Senna com o pai e se emocionou com o projeto”, afirma o corretor.

De presente, comprador do apartamento de cerca de R$ 30 milhões recebeu uma sapatilha esculpida em madeira de reflorestamento e decorada com detalhes folheados a ouro 23 quilates. A obra se chama “Punta Taco”, em referência à técnica de pilotagem que o ídolo dominava nas curvas. A escultura feita manualmente pelo artista Cainã Gartner é do tamanho exato ao do sapato usado pelo piloto e tem apenas 15 exemplares disponíveis.

VENDER PARA QUEM JÁ TEM TUDO

Segundo os experientes profissionais, o corretor de Balneário precisa falar a língua do cliente –seja ele um investidor de São Paulo, um produtor rural de Goiás ou um estrangeiro buscando custo-benefício com padrão internacional.

“O comprador típico hoje é um empresário de alta renda, ligado ao agro ou à indústria, com olhar cada vez mais criterioso”, diz Thiago Cabral, CEO da ABC & Embralot, que atua em Balneário e região.

Ele afirma que esse cliente não busca só um imóvel: quer design autoral, sustentabilidade de verdade e exclusividade. “Quem entender que o mercado de alto padrão não é apenas sobre metros quadrados, mas sobre significado, vai liderar essa nova fase do setor. E é nisso que estamos focados”, afirma Cabral.

Para conquistar esse público, o corretor precisa sair do estande de vendas e ir aonde o cliente está –eventos de automobilismo, leilões de gado, feiras do agro.

Em 2024, o grupo ABC & Embralot superou R$ 600 milhões em faturamento e cresceu 150%. “As comissões contam, claro, mas o que sustenta uma operação de sucesso é visão de longo prazo”, diz Cabral.

Mas a vida do corretor de imóveis não é só de carros importados, viagens, férias fora de época. Além da leitura do cliente, vender exige paciência e timing. E os juros altos estão alongando o processo.

“Tem investidor que prefere esperar. A Selic está alta. Quer surfar a renda fixa”, diz Cassola. Outros, ele diz, têm medo da instabilidade política. “O tempo entre mostrar e fechar aumentou”, afirma.

A saída tem sido oferecer parcelamentos diretos, entrada reduzida e crédito facilitado. E discurso dos corretores segue alinhado: “Quem compra terra não erra. A escritura na tua gaveta ninguém consegue roubar”.