SANTOS, SP (FOLHAPRESS) – O ex-atacante brasileiro Sérgio Clérice conduzia em 1997 a equipe sub-18 do Comercial, de Ribeirão Preto, para a disputa do Torneio de Viareggio, na Itália, quando notou um tumulto incomum logo na chegada ao aeroporto de Milão-Malpensa.

A balbúrdia tinha um motivo: o craque argentino Diego Armando Maradona, ídolo do Napoli e recém-aposentado do futebol, tentava desembarcar.

Ao cruzar olhares com o antigo camisa 10, Clérice lhe perguntou: “Você sabe quem eu sou?”. Maradona sorriu e respondeu: “Como poderia não conhecer? Em Nápoles, eu sou o número 1, e você, El Gringo, o número 2. Gostaria que tivesse jogado ao meu lado”.

Os dois se despediram com um beijo e um abraço, momento testemunhado pelo filho mais novo de Clérice, Marco, um dos jogadores daquele time.

Autor de 187 gols no futebol italiano ao longo de 18 anos atuando por sete clubes diferentes –Lecco, Bologna, em duas passagens, Atalanta, Hellas Verona, Fiorentina, Napoli e Lazio– e tratado por torcedores napolitanos como um ídolo, Sérgio Clérice, 84, tem essa e muitas outras histórias contadas em biografia lançada neste mês pelo jornalista e escritor Rodrigo Viana.

Na obra de 296 páginas publicada pela editora A Bola e o Verbo, Viana narra a saga pouco conhecida de “El Gringo, o Vilão Elegante”, que conta com apresentação do cineasta José Roberto Torero, orelha escrita por Zico e prefácio do jornalista Mauro Beting.

“Muitos jovens talvez não o conheçam, mas não há outro jogador brasileiro que chegue perto dos números dele na Itália”, disse o autor à reportagem.

“É surpreendente como ele teve momentos marcantes em todos os times em que jogou na Itália e ainda se constituiu num treinador de ponta no Brasil, sempre estando à frente de gigantes. Sem contar as transações como empresário”, acrescentou.

O apelido El Gringo é ligado ao fato de Clérice ter o queixo quadrado, semelhante ao de Tex Willer, personagem de histórias em quadrinhos criada em 1948 e publicada na Itália. Como outras figuras no universo do Velho Oeste, Tex era referido como El Gringo, que se tornou um apelido comum para os estrangeiros em território italiano.

“Uma das coisas que mais me impressionaram na história dele como jogador é que passou ao lado, a todo momento, da do Pelé, que é só seis meses mais velho que o Clérice. Ele saiu do Brasil depois de um jogo pelo Campeonato Paulista, um clássico das praias entre Santos e Portuguesa Santista em 1960. O Clérice estava emprestado pelo Palmeiras e foi o melhor em campo. Um emissário italiano o viu e o levou para fora”, contou Viana.

Segundo o autor, o treinador de Clérice na Portuguesa Santista era o major Maurício Cardoso, ex-comandante de Pelé no exército. Outra curiosidade ligada ao Rei do Futebol é que o principal técnico de Clérice na Itália, o sueco Nils Liedholm, fez um dos gols na final vencida pelo Brasil em 1958; Pelé fez dois.

O livro divide a trajetória de Clérice em três fases: como jogador, treinador e agente. Na última delas, a obra descreve como o paulista foi o responsável por transações importantes, como a dos atacantes Evair (do Guarani para a Atalanta), Sonny Anderson (do Guarani para o Servette) e Élber, do Londrina para o Milan.

“Há outro livro que conta a história do Napoli, escrito por Davide Morguera, e um dos trechos diz: ‘Volevo essere Sérgio Clérice’, que traduzido é: ‘Eu queria ser Sérgio Clérice’. Isso dá dimensão do seu tamanho”, disse Viana.

Sucesso no futebol italiano, Clérice se arrependeu por não ter aceitado renunciar sua cidadania brasileira para jogar pela Azzurra. “Poderia ter ficado na Itália, um país onde a vida é ótima e onde tenho todos os meus verdadeiros amigos”, cita, em um trecho da obra recém-lançada.

Outra passagem curiosa da fase como empresário é a indicação do jovem Ronaldo Nazário, então promessa do Cruzeiro, para o Milan, feita diretamente a Silvio Berlusconi, dono do clube. Ele conta ter ligado para amigos no clube anos depois, quando o Milan contratou o brasileiro já no fim da carreira por 7,5 milhões de euros (pouco mais de R$ 20 milhões, na cotação da época), em 2007: “Se tivessem me ouvido…”.

Como treinador, Clérice foi o responsável por lançar na Ferroviária o jovem Júnior, hoje Dorival Júnior, que construiu carreira de jogador em diversos clubes antes de se tornar treinador –chegou à seleção brasileira e atualmente dirige o Corinthians. Clérice ambém foi apontado como referência por Luciano Spaletti, que deixou recentemente o comando da seleção italiana.

SÉRGIO CLÉRICE — EL GRINGO, O VILÃO ELEGANTE

– Preço R$ 130

– Autoria Rodrigo Viana

– Editora A Bola e o Verbo

– Link: https://abolaeoverbo.com/elgringo-prevenda/

– Páginas 296