COCHABAMBA, BOLÍVIA (FOLHAPRESS) – Locais próximos do reduto do ex-presidente Evo Morales, o Trópico de Cochabamba, parecem dar uma nova camada às eleições marcadas para o próximo domingo (17) na Bolívia. Cartazes de políticos de direita, que lideram as pesquisas, aparecem vandalizados ou cobertos por pedidos pelo voto nulo; é também onde o favorito da esquerda, Andrónico Rodríguez, aparece em mais conversas e propagandas.

Após vencer eleições nos últimos 20 anos, a esquerda chega a 2025 abalada pelo rompimento entre Evo e o atual presidente, Luis Arce. O líder cocaleiro, que já governou a Bolívia por três mandatos, foi impedido de concorrer novamente à Presidência neste ano, e Arce desistiu de tentar a reeleição, sufocado por uma crise econômica.

Favorito pela esquerda, Andrónico Rodríguez, 36, é presidente do Senado e era visto como o sucessor natural de Evo, mas os dois se distanciaram nos últimos meses, e o evismo agora o trata como um traidor. Fora das urnas, o ex-presidente passou a promover uma campanha pelo voto nulo como forma de protesto e um resultado que poderia servir para deslegitimar o futuro governo.

Os votos em regiões amazônicas e andinas são os mais difíceis de captar pelas pesquisas na Bolívia, mas as publicadas às vésperas do pleito mostram a direita em vantagem: em primeiro lugar aparece o empresário Samuel Doria Medina, seguido pelo ex-presidente Jorge “Tuto” Quiroga, enquanto Rodríguez compete pela terceira posição.

Ao longo das últimas semanas, Rodríguez disse que há um voto oculto, sobretudo nas regiões cocaleiras. Seus apoiadores argumentam que as pesquisas falharam em 2020, quando apontaram que haveria segundo turno —a eleição terminou no primeiro turno, com vitória de Arce.

As candidaturas de esquerda, como a dele e a do ex-ministro Eduardo del Castillo (pelo MAS, Movimento ao Socialismo), tentam se descolar da imagem negativa do governo de Luis Arce, marcado pela escassez de combustíveis e a alta da inflação, que afeta os preços dos alimentos. No debate do qual eles dois participaram, há duas semanas, foram alvos de críticas tanto ligando ambos à atual gestão quanto a Evo.

Ao encerrar a campanha na quarta-feira (13), Rodríguez apresentou propostas como a revisão de regulamentos do Estado, uma nova política de mineração, uma nova lei bancária e o avanço para produção de veículos elétricos.

O esquerdista também tem o desafio de evitar o voto nulo, defendido por Evo. Em um vídeo recente, ele afirmou que a postura defendida por Evo é um “retrocesso” para os movimentos populares. “Exigir voto nulo é um retrocesso imperdoável. Com ele, defendemos os recursos naturais, a Constituição e o Estado Plurinacional”, afirmou o candidato.

Rodríguez mencionou que os povos indígenas foram historicamente excluídos da política boliviana, mas que, graças à sua luta e ao seu voto, chegaram à Assembleia, aos ministérios e à Presidência, com o próprio Evo. “Não pode ser que neste processo eleitoral, por simples capricho, orgulho e alguns desentendimentos entre irmãos, se possa promover o voto nulo ou em branco”, disse o candidato, em um ato de campanha perto de La Paz há duas semanas. “Votar nulo ou em branco é votar na direita.”

A vice de Rodríguez, Mariana Prado, reforçou o discurso contra o voto nulo, afirmando que ele silencia os eleitores e impede a representação da esquerda, o que considera perigoso e benéfico para os conservadores. Ela destacou que, conforme a regra eleitoral, anular o voto não levará à convocação de novas eleições.

Enquanto isso, o líder dos cocaleiros rebateu acusando o grupo político de Rodríguez de estar envolvido em seu pedido de prisão, por supostamente ter abusado sexualmente de uma adolescente. Ele também afirma que Rodríguez tinha oferecido a ele a vaga de vice na chapa de 2025, o que o presidente do Senado nega.

Em julho, ao ser questionado sobre o rompimento com o antigo padrinho, o candidato da Aliança Popular respondeu que “na política, é melhor ser difamado e atacado do que ignorado. Há uma razão pela qual eles falam de mim todos os dias”.