BRASÍLIA, DF E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A Justiça determinou o afastamento, pelo período de um ano, do prefeito de São Bernardo do Campo, Marcelo Lima (Podemos). Ele é um dos alvos de uma operação da Polícia Federal deflagrada na manhã desta quinta-feira (14) para apurar a suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro na prefeitura da cidade na Grande São Paulo.

A 4ª Câmara de Direito Criminal do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) autorizou a ação e determinou, além do afastamento dos cargos, a quebra de sigilo bancário e fiscal dos alvos, que incluíram dois vereadores, um secretário municipal e um servidor público.

A PF atuou em São Paulo, São Bernardo do Campo, Santo André, Mauá e Diadema, na ação denominada Operação Estafeta. O tribunal negou a prisão de Lima, mas determinou o uso de tornozeleira eletrônica, como medida cautelar. O afastamento do prefeito foi divulgado pela TV Globo e confirmado pela reportagem.

Em nota, a Prefeitura de São Bernardo do Campo disse que vai colaborar com as investigações. “A gestão municipal é a principal interessada para que tudo seja devidamente apurado. Reforçamos que o episódio não afeta os serviços na cidade.”

Um dos vereadores afastados é Danilo Lima (Podemos), primo do prefeito e presidente da Câmara Municipal. A reportagem procurou o órgão, que disse ainda não ter um posicionamento sobre o caso.

Em nota, o Podemos, partido dos dois políticos, diz que em oito meses de mandato Marcelo Lima fez um grande trabalho e que confia na sua lisura. “Acreditamos também ser necessária prudência em relação todo tipo de manifestação leviana, sem as devidas informações acerca das recentes investigações”, afirma.

“Reafirmamos nossa crença na importância de que as apurações devam ocorrer com responsabilidade e respeito às garantias legais, inclusive com o necessário direito de defesa.” O mesmo se aplica, diz a sigla, ao vereador Danilo Lima.

Já o servidor público afastado é da Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo). Paulo Iran Paulino da Costa, segundo o site do Legislativo, atuava como assessor legislativo no gabinete do deputado estadual Rodrigo Moraes (PL) desde 2 de setembro de 2022, com salário bruto mensal, em junho, de R$ 8.419,42. Procurado, o deputado respondeu, por meio de assessoria, que exonerou o servidor quando soube da investigação.

“Já tomei as devidas providências de exoneração para manter transparência, ética e moral para as devidas investigações. No meu mandato, não aceito qualquer suspeita de corrupção ou conduta indevida.” A reportagem não localizou a defesa de Paulo Iran.

Ao todo, 70 policiais federais cumpriram as medidas que incluíram duas prisões temporárias, 20 mandados de busca e apreensão, além de afastamento de sigilos bancário e fiscal. Uma pessoa seguia foragida até às 17h desta quinta-feira (14).

Segundo o Ministério Público, a investigação apontou para “uma complexa rede criminosa, com uma estrutura definida e um ‘modus operandi’ peculiar, voltada para a captação e movimentação de valores ilícitos no âmbito da Prefeitura de São Bernardo do Campo.” Ao todo, 34 pessoas tiveram a suspensão de sigilo bancário e fiscal.

Também de acordo com a Promotoria, a organização atua por meio do recebimento ilícito de recursos a partir de empresas com contratos com a prefeitura ou com a Fundação ABC em serviços de coleta de resíduos, engenharia, informática e saúde.

Em nota, a fundação diz ter tomado conhecimento da ação da PF com perplexidade e que não havia sido procurada por autoridades policiais ou judiciais para prestar esclarecimentos ou informações e que está à disposição. Também afirma que não compactua com práticas que contrariem o interesse público.

Entre os alvos de prisão estão o dono de uma construtora que tem contrato com a prefeitura, identificado como Edmilson Carvalho, sócio da Terraplanagem Alzira Franco. Os agentes localizaram R$ 400 mil na casa dele.

Segundo a defesa, o dinheiro “é fruto de seu trabalho e não de nenhum esquema de corrupção”. O empresário passou a manhã na sede da PF na Lapa, na zona oeste de São Paulo, onde prestaria depoimento.

Também foi preso o servidor municipal Antonio Rene da Silva, diretor Secretaria de Coordenação Governamental de São Bernardo. A reportagem não localizou a defesa dele.

A deputada estadual Carla Morando (PSDB) também anunciou a exoneração de um servidor de seu gabinete, Roque Araújo Neto, que na passagem atual estava desde novembro de 2021 no cargo de assistente parlamentar, com remuneração mensal de R$ 8.292,95.

Além dos valores encontrados na casa do sócio da construtora, outros R$ 948,5 mil foram apreendidos em uma empresa de comércio e distribuição de medicamentos.

Ao todo, considerando também uma empresa de exportação e importação, a apreensão chegou a R$ 3,2 milhões, mais US$ 3,4 mil (cerca de R$ 19 mil) e 10,7 mil euros (cerca de R$ 67,7 mil).

A investigação iniciou-se em julho de 2025, a partir da apreensão de R$ 14 milhões em espécie (entre reais e dólares), encontrados na casa de Paulo Iran. Com a análise de materiais apreendidos, foi desvendado um esquema estruturado entre a alta administração municipal, segundo a investigação.

Servidores públicos realizariam o papel de operadores financeiros responsáveis pelo recebimento, circulação e destinação de dinheiro em espécie, com empresas contratadas pelo próprio município.

O esquema também envolveria o pagamento de diversas despesas pessoais do prefeito e de seus familiares, com indícios de depósitos fracionados para burlar os sistemas de controle financeiro, como o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).

O Paço Municipal da Prefeitura de São Bernardo do Campo seria um dos locais de gerenciamento dessas transações, de acordo com as apurações da polícia.

Os investigados responderão pelos crimes de organização criminosa, lavagem de dinheiro, corrupção passiva e corrupção ativa, cuja penas somadas podem chegar a 39 anos de prisão.

A notícia da operação na manhã desta quinta-feira, apurou a reportagem, deixou servidores da prefeitura surpresos. Já uma reunião do Consórcio Intermunicipal Grande ABC prevista para esta manhã, foi cancelada. O evento contaria com as presenças do ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, e do prefeito da capital paulista, Ricardo Nunes (MDB).

QUEM É MARCELO LIMA

Marcelo Lima foi eleito prefeito de São Bernardo do Campo derrotando no segundo turno Alex Manente (Cidadania), que contava com apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos).

Na cidade, que é berço político do PT e de Lula, Lima conseguiu a vitória ao posicionar-se ao centro na reta final de campanha. O candidato do PT, deputado estadual Luiz Fernando, ficou em terceiro lugar no primeiro turno.

Lima já foi eleito vereador em São Bernardo em 2008 e 2012. Ele se elegeu vice na chapa de Orlando Morando (PSDB), ex-prefeito da cidade e atual secretário da Segurança Urbana de São Paulo, nas eleições de 2016 e 2020.

Em 2022, foi eleito deputado federal, mas teve o mandato cassado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) por infidelidade partidária ao trocar o Solidariedade pelo PSB.

Ao se eleger, Lima já enfrentava medidas cautelares relacionadas a uma denúncia de 2021 do Ministério Público envolvendo irregularidades em licitações de quando era, além de vice-prefeito, secretário de Serviços Urbanos em São Bernardo.

O tema foi explorado na reta final de campanha. Segundo Lima, o assunto foi deturpado para alimentar fake news.