RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Conhecido por transformar vivências da periferia em música, L7nnon, 31, decidiu ampliar a forma de contar histórias. Hoje, além dos palcos, o rapper também brilha na televisão, interpretando Ryan em “Dona de Mim”. O personagem, um ex-detento que tenta reconstruir a vida em meio ao preconceito e à desconfiança, tornou-se um espelho de trajetórias que o artista já conheceu.
“Eu tento, através do Ryan, representar a dor das pessoas que buscam recomeçar. A dor de perceber que o mundo já não vai te enxergar da mesma forma”, diz. “E, muitas vezes, quem mais te julga é justamente quem menos sabe da sua história.”
Baseado em suas vivências, o rapper afirma que, na periferia, muitos acabam mesmo entrando para o crime por falta de oportunidades. “Obviamente, tem quem se envolva pela emoção, dinheiro rápido, ostentação, mas tem muita gente que simplesmente não teve opção. Isso é a realidade da nossa maioria menos privilegiada”, afirma.
A atuação, embora seja uma atividade nova, não foi um salto no escuro. Lennon dos Santos Barbosa Frassetti já havia experimentado a interpretação em clipes, filmes independentes e participações especiais. O convite para o teste em “Dona de Mim” veio como surpresa. “Quando fiz o teste, pensei: ‘Será?’. Depois, o pessoal falou que tinha gostado muito, mas eu nem criei expectativa. Até que me ligaram confirmando”, relembra.
Ciente da cobrança, ele se preparou para lidar com críticas. “Tem sempre quem diga que estou ‘roubando o lugar’ de um ator formado, um ator com DRT. Mas ninguém me deu o L7nnon de presente. Eu construí isso. Não tiro o mérito de quem estudou a vida inteira teatro, mas acredito que há espaço para todos”, defende.
Ainda assim, o rapper admite que a autocrítica pesou no início. “Na minha primeira aparição, reuni amigos para assistir. Todo mundo vibrou, mas eu pensei: ‘Não gostei’. Tive medo de mandar mal e transformar o que poderia ser uma bênção em maldição. Só relaxei quando vi umas cenas e recebi elogios.”
A resposta do público não demorou. “Hoje, quase ninguém pergunta de música. É sempre: ‘E aí, vai sair da cadeia quando?’. Outro dia, uma senhora de uns 80 anos me pegou pela mão e disse que estava feliz porque eu tinha sido solto. Ela acreditava mesmo na história do Ryan”, conta, rindo.
Para L7nnon, a força do personagem na novela de Rosane Svartman está na identificação com um Brasil invisibilizado. “Menos de 5% dos moradores de favela estão no tráfico. A maioria é feita de pessoas sonhadoras, trabalhadores que carregam histórias parecidas. A favela me colocou onde estou, e minha arte é para ela”, diz.
Questionado sobre o preconceito com rappers e funkeiros, ele é direto: “Quando você começa a ter mais do que esperavam de você, isso incomoda. Você nasceu na favela, tem que se contentar com o que te deram. Mas, quando sai da caixa e vira algo que eles não imaginavam, você vira alvo.”
Ele enxerga na própria trajetória (e na de seu personagem) uma prova de que é possível superar essas barreiras. “A coisa mais injusta seria eu não acreditar na mudança de alguém. Se uma pessoa errou e me pediu perdão, eu acredito até que ela me prove o contrário. Eu sou prova de que transformação existe.”
Conciliar música e atuação tem exigido energia. “Esta semana gravei de segunda a sexta e, no sábado, tenho dois shows. É um cansaço físico e mental tremendo, mas está valendo a pena”, afirma. A experiência já o faz considerar novos passos na dramaturgia: “Talvez não seja só uma fase. O que eu quero é seguir aprendendo e arriscando.”