SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O dólar abriu próximo da estabilidade nesta quinta-feira (14), com os investidores atentos às negociações entre Brasil e EUA sobre a tarifa de 50% sobre produtos brasileiros aplicada pelo presidente norte-americano, Donald Trump.
Às 9h05, a moeda norte-americana caía 0,08%, cotada a R$ 5,3968. Na quarta-feira (13), o dólar fechou em alta de 0,25%, cotado a R$ 5,400, e a Bolsa caiu 0,88%, a 136.687 pontos.
O movimento teve como pano de fundo a apresentação do plano de contingência do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para assistir empresas afetadas pela tarifa de 50% dos Estados Unidos.
A MP (Medida Provisória) apresentada cria uma linha de crédito de R$ 30 bilhões para amparar empresas afetadas pelo tarifaço do presidente norte-americano Donald Trump.
Além de um recorte setorial, o governo fez uma avaliação individual para mapear aquelas mais impactadas, pois, dentro de uma mesma atividade, há companhias mais ou menos dependentes das exportações aos EUA. O pacote, batizado de “Brasil Soberano”, inclui também adiamento de impostos federais, maior ressarcimento de créditos tributários e uma reformulação nas garantias à exportação para facilitar a busca de novos mercados.
Na véspera do anúncio, Lula já havia antecipado que a medida priorizaria pequenas empresas, além de exportadores de produtos como tilápia e mel. A MP terá vigência imediata e precisará ser apreciada pelo Congresso em até 120 dias.
Segundo o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, o governo vai pedir ao Congresso Nacional uma autorização para excluir o pacote da meta fiscal de 2025. O montante deve alcançar até R$ 9,5 bilhões em medidas e será alvo de um projeto de lei complementar, afirmou.
A decisão vai na direção contrária do que havia sinalizado o ministro Fernando Haddad (Fazenda) um dia antes.
Na terça, após participar de audiência pública no Senado Federal, Haddad disse que os valores do crédito extraordinário ficariam fora do limite de despesas do arcabouço fiscal, como ocorre habitualmente com esse tipo de crédito, mas não da meta de resultado primário.
Após a apresentação do pacote, Haddad disse que essa é uma “primeira medida, pode não ser a única”. O objetivo do governo é atender aos mais atingidos nesse primeiro momento, mas o Executivo já monitora possíveis efeitos em outras atividades. Segundo o ministro, os EUA têm adotado uma postura agressiva nas exportações de soja e algodão, o que pode gerar problemas internos no Brasil.
“É uma leva de proposições que vão atenuar esse impacto inicial. Vamos ficar monitorando nossas exportações e o comportamento do mercado”, disse.
A expectativa pelo plano do Executivo tem rondado as mesas de operações desde que Trump primeiro ameaçou a imposição de sobretaxas de 50% a produtos brasileiros, no último mês de julho.
Ainda que julguem que o pacote é necessário para proteger o setor produtivo, agentes financeiros demonstram receios de que as medidas possam ter um impacto fiscal relevante ou servir como justificativa para que o governo abandone o compromisso com as metas para as contas públicas.
“O mercado está olhando isso como um ponto adicional de gasto do governo que, apesar de estar fora do limite do arcabouço, vai continuar sendo contabilizado para a meta fiscal. A preocupação é se isso vai gerar um desafio adicional para o cumprimento das metas e como o governo vai equalizar esse volume adicional de gasto, já que os R$ 30 bilhões são só o começo, segundo o Executivo, da ajuda fornecida”, diz João Ferreira, sócio da One Investimentos.
Victor Borges, especialista em investimentos da Manchester, comenta que o país já está com um nível de endividamento elevado, com a dívida pública nominal rondando a casa de 77% do PIB. “Nossa dívida vai se tornar insustentável a partir de 2027, ou seja, o juro vai ficar muito mais caro para o governo manter. E, enquanto passa por um problema fiscal grave, o governo quer gastar mais”, afirma.
O tarifaço se confirmou mesmo após os esforços de negociação do governo Lula, que tem tido dificuldade em abrir canais de diálogo com os Estados Unidos. Haddad teria uma reunião nesta quarta com o secretário do Tesouro norte-americano, Scott Bessent, mas o encontro foi desmarcado por parte de Washington e não há nova data.
Haddad atribuiu o cancelamento à atuação de forças de extrema-direita que mantêm interlocução com a Casa Branca e citou o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que está nos EUA.
Filho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), Eduardo tem liderado uma campanha de lobby em Washington por mais medidas contra o STF (Supremo Tribunal Federal), que tem julgado seu pai no âmbito da trama golpista de 2022. Em nota conjunta com o ex-comentarista da Jovem Pan Paulo Figueiredo, Eduardo negou ser responsável pelo cancelamento da reunião.
Enquanto as tratativas entre Brasil e EUA não avançam, o governo Lula busca estabelecer outras pontes na frente comercial.
Na segunda, Lula conversou por cerca de uma hora com o líder da China, Xi Jinping. A “China está pronta para trabalhar com o Brasil para estabelecer um exemplo de unidade e autossuficiência entre os principais países do Sul Global”, disse Xi, de acordo com relatos chineses da conversa.
Já no mercado externo, a pauta principal é a possibilidade de afrouxamento monetário por parte do Fed.
Dados de emprego no início do mês e a leitura de inflação da véspera estão fomentando apostas de que a autoridade norte-americana irá cortar os juros em 0,25 ponto percentual em setembro. A probabilidade é de 99,9%, segundo a ferramenta CME Fed Watch.
Segundo Leonel Mattos, analista de Inteligência de Mercado da StoneX, a aposta de corte de juros pelo Fed enfraquece o dólar globalmente. “A perspectiva de taxas mais altas aqui e as apostas de cortes nos Estados Unidos reforçam o diferencial de juros brasileiros”, diz.
Com isso, o dólar perdeu força ante as principais moedas globais. No índice DXY, que o compara a uma cesta de outras seis divisas fortes, a queda foi de 0,25%, a 97,84 pontos.