SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Observatório do Clima, rede com mais de uma centena de ONGs ambientalistas, divulgou nesta quarta-feira (13) uma nota técnica em que elenca os trechos considerados preocupantes da nova lei do licenciamento ambiental.
A organização diz que os vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) evitaram os maiores retrocessos do texto aprovado pelo Congresso. Apesar disso, o texto segue com pontos que ferem a Constituição, sendo o principal delas a LAE (Licença Ambiental Especial), na avaliação da entidade.
O modelo de licenciamento já está em vigor por meio de medida provisória e prevê uma tramitação acelerada para projetos considerados estratégicos por um conselho do governo. A lei determina o prazo de 12 meses para concluir a licença de obras sob essa modalidade.
Na visão do Observatório do Clima, apesar de o governo ter derrubado o artigo que previa o licenciamento em apenas uma fase com a LAE, na prática, ela continua sendo uma licença única.
“A redação da LAE na medida provisória não é nada clara. Pelo que está escrito, é um processo monofásico com previsão de etapas”, diz Suely Araújo, coordenadora de políticas públicas da organização.
“Não tem LAE 1, LAE 2 ou LAE 3. Houve uma simplificação para casos de significativo impacto, o que eu considero inconstitucional”, afirma.
Araújo avalia que o prazo máximo para completar as análises é inviável: “Em um ano, não dá para fazer as três fases de uma hidrelétrica, de uma grande estrada, de um empreendimento minerário”. A autorização para obras de grande porte costuma envolver as licenças prévia, de instalação e de operação.
O Observatório do Clima defende a alteração ou rejeição da medida provisória apresentada pelo governo para esclarecer a exigência das três fases e o tempo para cada uma delas.
Segundo Araújo, o governo inverteu as prioridades: em vez de facilitar as licenças para obras de baixa complexidade, está havendo uma simplificação nos casos de maior impacto ambiental.
“Se a priorização de um empreendimento tiver coerência com o planejamento governamental, eu não vejo problema. Agora, se for feita para atender a interesses políticos e regionais de determinadas autoridades, aí tem problema”, diz.
O avanço do novo modelo de licença é uma vitória para o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) , e pode facilitar a exploração de petróleo. Araújo analisa que a perfuração na Foz do Amazonas deve ser aprovada mesmo sem o dispositivo.
“Para o bloco 59 [da bacia Foz do Amazonas], nem precisa da LAE. Todas as evidências indicam que a licença sairá logo, infelizmente. Não vai dar tempo de reunir o conselho de governo, mas a LAE vai servir para apressar os outros blocos”, diz.
O Observatório do Clima avalia como positivo o veto presidencial à LAC (Licença por Adesão e Compromisso), emitida pelo próprio empresário, para restringi-la a casos de baixo potencial poluidor.
Porém, a lei segue prevendo que a vistoria anual e a análise do relatório de caracterização da obra serão feitas por amostragem. Ou seja, somente alguns projetos serão analisados a fundo.
“Isso nos incomoda bastante, porque é possível que empreendimentos não tenham controle ambiental em fase nenhuma da sua vida útil”, diz Araújo.
Segundo a nota técnica, a análise por amostragem também pode facilitar casos de corrupção. “A questão é como será feita essa amostragem. Haverá uma pressão enorme para que o projeto não passe por uma análise ou vistoria mais detalhada”, afirma a coordenadora de políticas públicas.
A FecomercioSP (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo), que representa 1,8 milhão de empresários paulistas, avalia que as mudanças na lei tendem a impactar negativamente as relações comerciais do Brasil no exterior e cita preocupação com o acordo entre o Mercosul e a União Europeia.
“Temos receio com a reputação que fica para o Brasil, de toda a preocupação que os outros países já têm com os nossos produtos serem fruto de desmatamento ilegal. Será que isso não vai dar mais margem para essas falas, que ocorrem muitas vezes sem fundamento?”, diz Cristiane Cortez, assessora técnica do conselho de sustentabilidade da entidade.
A federação também critica a dispensa de licenciamento para atividades do agronegócio prevista na nova lei. O governo derrubou apenas dois dispositivos: a isenção aos produtores que ainda têm o CAR (Cadastro Ambiental Rural) com análise pendente e às atividades intensivas e de confinamento.
A visão do governo é que o setor segue regras específicas e outras isenções não comprometem a segurança dos empreendimentos.
“Trata-se de uma manutenção extremamente preocupante, na medida em que permite que esse setor, de grande risco de impacto ambiental, continue atuando nos mesmos parâmetros atuais”, diz a federação paulista.
Cortez opina que a Licença Ambiental Especial carece de esclarecimentos. “A LAE é uma caixa preta. Não sabemos direito o que vai ser colocado dentro dessa caixa-preta e não está claro como aquilo vai ser analisado, porque acabou entrando um viés político”, afirma.