SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A última rodada de negociações de um tratado global de combate à poluição plástica, que reúne mais de 170 países em Genebra, na Suíça, nesta semana, em busca de acordos, chega a sua reta final em ritmo de impasse.

As negociações terminam nesta quinta (14) e estão travadas por um cabo de guerra. De um lado estão os países produtores de petróleo, do qual deriva o plástico, reunidos no chamado “like-minded group” (grupo de ideias semelhantes na tradução livre do inglês). São eles Rússia, Índia, China, Irã e Arábia Saudita, que concentram as discussões em torno da gestão de resíduos plásticos e travam o debate sobre mudanças na produção do plástico.

Do outro lado estão os 66 países que compõem a chamada High Ambition Coalition (coalizão de alta ambição), liderada pela União Europeia e composto também por países da África e Oceania bastante afetados pela poluição plástica. Eles querem discutir o chamado ciclo de vida do plástico, o que inclui sua produção global e o desenho de produtos para sua reutilização e reciclagem.

O enrosco levou o presidente do INC (Painel Intergovernamental de Negociações, na sigla em inglês), Luis Vayas Valdivieso, a propor um novo texto para o tratado, mais enxuto, na véspera do final das negociações, como último recurso para que algum tipo de acordo seja fechado.

“O presidente do INC fez uma fala bastante positiva e confiante de que ainda é possível chegar a um acordo, mas o sentimento nos corredores é de que a cada hora que passa esse acordo fica mais distante. Há um clima de esgotamento nas delegações”, avalia Carlos Silva Filho, conselheiro da ONU para gestão de resíduos.

“O que nos preocupa [no INC 5.2] é a resistência dos polos extremos da negociação”, afirma a ministra Maria Angélica Ikeda, diretora do departamento de Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores e chefe da delegação brasileira nas negociações.

“Países desenvolvidos têm demonstrado muito pouca flexibilidade nos debates sobre financiamento. Países do like-minded group, pouca flexibilidade nos artigos sobre produção. Países da coalizão de alta ambição, pouca flexibilidade em ceder na sua ambição. O Brasil veio para negociar e facilitar negociações.”

Negociado há dois anos no âmbito da ONU pelo INC, o tratado foi apelidado de “Acordo de Paris do plástico” pela promessa de ser o maior pacto ambiental do planeta desde o acordo climático de 2015. Mas, diante da complexidade das negociações e da dificuldade de adiar sua conclusão para uma nova rodada, há quem considere que o tratado pode simplesmente não sair.

Vale lembrar que a resolução da Assembleia da ONU para o Meio Ambiente de 2022 que deu início ao processo de criação de um instrumento internacional juridicamente vinculante sobre poluição plástica, incluindo o ambiente marinho, um dos mais afetados, previa cinco rodadas de negociação.

O fracasso da quinta delas (INC 5), no final de 2024, em Busan, na Coreia do Sul, fez o presidente do INC, Luis Vayas Valdivieso, criar um puxadinho, o INC 5.2. As chances de isso ocorrer novamente são baixas, mas existem.

“O clima agora é ou fechamos o acordo ou perdemos essa oportunidade e chega-se à conclusão de que o mundo não está preparado ainda para um acordo sobre plástico”, avalia Pedro Prata, oficial de políticas públicas para a América Latina da Fundação Ellen MacArthur, que participa com observador.

Na mesa de negociações há propostas de eliminação gradual de certas substâncias tóxicas e produtos considerados problemáticos, como canudos plásticos descartáveis, e também há propostas de modificação do design dos produtos de modo que sejam reutilizáveis ou recicláveis, além dos debates sobre o modelo de financiamento do acordo, tema sempre sensível.

Organizações da sociedade civil que formam a chamada Coalizão Vida Sem Plástico, emitiram nesta terça-feira (12) uma nota crítica ao Brasil em que afirmam que o país é “o oitavo maior poluidor plástico do mundo e não se compromete com soluções para essa crise mundial”.

Para Lara Iwanicki, diretora de advocacy e estratégia da ONG Oceana, “o tratado global pode impulsionar novos negócios de reuso e refil, criar empregos e tornar o Brasil competitivo em um cenário global que já exige soluções sustentáveis”.

Procurada, a delegação brasileira no INC 5.2 disse não concordar com a afirmação de que o país não tem propostas ambiciosas.

“Lideramos negociações sobre saúde, cooperação, financiamento, transição justa, e estamos copresidindo ou cofacilitando reuniões em diversos níveis em todos os grupos de contato. Como toda negociação, esse processo exige um equilíbrio entre posições públicas fortes e trabalho de bastidor, orientado para o convencimento e a construção de consensos. Indo muito além dos discursos, o governo tem concentrado todas as suas forças para garantir que cheguemos a um acordo.”

“Queríamos que o Brasil fosse mais ambiciono”, confirma Prata. “Mas precisamos reconhecer que o papel de facilitar um evento tão imenso é extremamente importante. Se der certo, o Brasil sairá como um grande player.”

A poluição plástica se converteu num dos principais desafios ambientais e climáticos de hoje. A produção de plásticos dobrou nos últimos 20 anos no mundo, assim como a produção de lixo plástico. Apenas 9% do plástico é reciclado globalmente. Parte maior vaza para o meio ambiente e faz do plástico um resíduo onipresente, com consequências para a saúde humana e do planeta.

“Chegar a um acordo sobre o texto do tratado é o primeiro passo para combater a poluição plástica para todos, em todos os lugares “, afirmou Inger Andersen, diretora executiva do Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente).