Da redação

O governo dos Estados Unidos, sob a presidência de Donald Trump, publicou nesta terça-feira (12) o relatório anual do Departamento de Estado sobre a situação dos direitos humanos e das liberdades políticas no Brasil. O documento afirma que o cenário se deteriorou ao longo do último ano, com críticas diretas ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), acusado de censurar apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Segundo o relatório, o país registrou medidas “amplas e desproporcionais” por parte do Judiciário, incluindo o bloqueio de milhões de usuários de uma rede social devido a um caso de assédio. O texto também denuncia restrições ao acesso a conteúdos considerados “antidemocráticos”, atingindo jornalistas, políticos e apoiadores de Bolsonaro, muitas vezes em processos sigilosos e sem garantias de devido processo legal. O termo “discurso de ódio” foi classificado como vago e desalinhado com padrões internacionais.

Além das questões ligadas à liberdade de expressão e imprensa, o documento lista problemas graves: assassinatos arbitrários, tortura, prisões arbitrárias e falhas na responsabilização de autoridades envolvidas em abusos.

Violações ao direito à vida

O relatório relata casos de execuções extrajudiciais atribuídas a operações policiais. Em São Paulo, ações contra o crime organizado no primeiro semestre e na Baixada Santista (de julho de 2023 a abril) resultaram em mortes, incluindo a de Fábio Oliveira Ferreira. Dois policiais da Rota foram acusados de homicídio qualificado e obstrução de provas, mas absolvidos em dezembro; o Ministério Público recorreu.

Em Roraima, mais de 100 policiais militares foram investigados por integrar milícia e grupo de extermínio, com denúncias de tortura e roubo. No Rio de Janeiro, houve avanços na apuração do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, ocorrido em 2018. Foram presos Chiquinho e Domingos Brazão, acusados de mandar matar a parlamentar, e Rivaldo Barbosa, ex-chefe da Polícia Civil, por suposto envolvimento no crime. Ex-policiais também foram condenados: Ronnie Lessa (78 anos e 9 meses) e Élcio de Queiroz (59 anos e 8 meses).

Liberdade de imprensa e censura

Embora a Constituição assegure liberdade de expressão, decisões do STF restringiram manifestações consideradas antidemocráticas. O ministro Alexandre de Moraes ordenou a suspensão de mais de 100 perfis na rede social X (antigo Twitter), afetando sobretudo bolsonaristas. Em agosto, a Anatel bloqueou a plataforma por descumprimento de ordens judiciais, aplicação de multas e ausência de representante legal.

O bloqueio também incluiu proibição temporária do uso de VPN, com multa diária de R$ 50 mil para quem burlasse a restrição, embora nenhuma penalidade tenha sido aplicada. O X só foi liberado em outubro, após cumprir determinações e pagar multas. O documento ressalta que tais ações limitaram o acesso a informações e enfraqueceram a privacidade de denunciantes de corrupção.

O relatório também menciona que jornalistas sofreram ameaças e violência de grupos criminosos em razão de reportagens.

Direitos trabalhistas

A lei brasileira garante liberdade de associação, negociação coletiva e direito de greve, exceto para militares, policiais militares e bombeiros. Há restrições como a unicidade sindical e exigências para registro no Ministério do Trabalho. Greves consideradas abusivas podem gerar sanções.

A negociação coletiva é comum no setor privado e, em geral, as leis são aplicadas de forma eficaz, com penalidades proporcionais. O documento também destaca normas sobre salário mínimo, jornada máxima de 44 horas semanais, descanso semanal e férias remuneradas.

Apesar de padrões de segurança e saúde ocupacional alinhados a normas internacionais, persistem condições inseguras, sobretudo na construção civil, e o número de fiscais é insuficiente. Quase 40% da força de trabalho está no setor informal, sem proteção legal, incluindo motoristas e entregadores de aplicativos.

Prisões e desaparecimentos

Não houve relatos de desaparecimentos forçados por agentes do Estado, mas em julho o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reativou a Comissão Especial sobre Mortes e Desaparecimentos Políticos (1961-1979). O relatório aponta casos de detenção prolongada sem acusação, principalmente de envolvidos nos atos de 8 de janeiro de 2023, com alegações de negação de assistência jurídica.

Tortura e maus-tratos

Houve registros de tortura por parte de policiais. Em Porto Alegre, cinco agentes foram indiciados pela morte de Vladimir Abreu de Oliveira, acusado de ter sido agredido por 40 minutos antes de ser jogado de uma ponte.

Proteção à infância e casamento infantil

A idade mínima para casamento é 18 anos (ou 16 com consentimento dos pais). Um levantamento do Valor Econômico apontou que uma em cada cinco mulheres se casou antes dos 18 anos, prática ainda comum, segundo a Unicef.

Refugiados

O Brasil manteve cooperação com o Alto Comissariado da ONU para Refugiados e possui sistema para concessão de asilo.

Antissemitismo

O relatório indica aumento expressivo nos casos de antissemitismo após o ataque do Hamas a Israel, em outubro de 2023. De janeiro a maio de 2025, foram 886 ocorrências, quase seis vezes mais que no mesmo período do ano anterior, em sua maioria no ambiente digital.

O presidente Lula gerou reação de entidades judaicas ao comparar, em fevereiro, a ação de Israel em Gaza ao Holocausto. A Conib repudiou as declarações, acusando o governo de postura “extrema e desequilibrada” no conflito.

Em outubro, a Operação Overlord prendeu quatro suspeitos de integrar grupo neonazista, acusados de incitação à discriminação e planejamento de atos violentos. Segundo a CNN Brasil, eles também tocavam em eventos neonazistas no país.

O documento completo pode ser acessado nos relatórios oficiais do Departamento de Estado, que também incluem seções específicas sobre liberdade religiosa e tráfico de pessoas.