RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A Prefeitura de Niterói, no Rio de Janeiro, adotou uma ferramenta que usa sensores instalados nas ruas da cidade para identificar som de tiros e acelerar o acionamento da polícia.

A ferramenta americana chamada de ShotSpotter funciona com microfones que captam o som ambiente. Através de inteligência artificial, a empresa afirma conseguir diferenciar o tiro de outros barulhos e identificar o tipo de arma —se pistola ou fuzil.

O alerta de tiro é enviado a uma central de controle americana, que filtra os dados e aciona a polícia local. No caso de Niterói, o ShotSpotter é integrado ao Cisp (Centro Integrado de Segurança Pública), central de vigilância operada por guardas municipais que atuam em parceria com a polícia.

A empresa americana promete tempo de resposta —entre o alerta de tiro e o chamado policial— de até 1 minuto.

O ShotSpotter atua em cidades dos Estados Unidos e tem gerado controvérsias. Em 2024, uma auditoria contratada pela Controladoria da Cidade de Nova York apontou que o ShotSpotter alertava tiros reais em apenas 13% das vezes —em outras 87%, os alertas à Polícia de Nova York eram ruídos altos que não se confirmavam como tiroteios. A auditoria também constatou que a corporação superestimava a redução do tempo de resposta.

A Controladoria recomendou que a polícia não renovasse o contrato com o ShotSpotter, mas o acordo foi renovado em fevereiro deste ano.

ONGs americanas como a Aglu (União Americana pelas Liberdades Civis) apontam ainda risco de estigmatização de bairros onde os sensores são instalados, levando presença policial excessiva a comunidades negras e latinas mesmo em episódios em que não há tiroteios.

Procurada por email, a empresa ShotSpotter não respondeu até a publicação da reportagem.

Pablo Nunes, coordenador do Cesec (Centro de Estudos de Segurança e Cidadania) e do Panóptico, que estuda o uso da tecnologia na segurança pública, concorda com o risco de estigmatização e afirma que a ferramenta teve eficácia baixa em experiência anterior no Brasil, em Canoas (RS), em 2010.

“Esses sensores foram desinstalados por conta da quantidade de erros que o sistema produz, como confundir estampido de escapamento de motos e carros como disparos de armas de fogo, ou confundir com fogos de artifício”, afirma.

“Existe a crença de que soluções tecnológicas vão dar resultados finalísticos aos problemas da segurança pública.”

O prefeito de Niterói, Rodrigo Neves (PDT), e secretários municipais se interessaram pela ferramenta em viagem no ano passado aos Estados Unidos, onde foram conhecer sistemas que prometem prevenção à violência.

O contrato da prefeitura com o ShotSpotter é de R$ 9.967.708,99, divididos em três anos. A primeira parcela já foi paga, segundo a gestão.

Na última semana, os sensores foram instalados na zona sul de Niterói, depois de período somente na zona norte. O município afirma que já houve caso concreto de auxílio da ferramenta, como a descoberta de uma tentativa de invasão ao morro dos Marítimos, no dia 22 de julho.

Segundo a prefeitura, o ShotSpotter identificou uma sequência de 16 tiros de arma pesada (fuzil) em um dos acessos à comunidade. Ao chegar, policiais militares avistaram um suspeito baleado e acionaram o Corpo de Bombeiros. Outros três suspeitos deram entrada no hospital, dois deles com passagens pela polícia.

“Passamos todas as informações em tempo real para a Polícia Militar. Com elas, o oficial de operações tem como avaliar a forma de atuação no terreno: como e quando incursionar e o local de origem dos disparos. Quanto à Polícia Civil, os relatórios do ShotSpotter fornecem a cronologia os disparos, desmontam álibis e indicam o local para busca de evidências”, afirmou a prefeitura em resposta à reportagem.

“O policial vai para o local preparado para enfrentar um tipo de ocorrência em que o uso da força vai ser demandado. Eles já chegam nesses espaços sob tensão e sob a perspectiva de usar a violência, mas o alerta pode não ser real”, afirma Nunes.