RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Inquéritos policiais e boletins de ocorrência mostram que suspeitos de roubar turistas no Rio de Janeiro por meio do golpe “boa noite, Cinderela” agem em grupo, usam medicamentos sedativos, como clonazepam, e buscam vítimas em áreas boêmias da cidade, como a Lapa, no centro, e Copacabana, na zona sul.
No caso mais recente, a Polícia Civil investiga a participação de três mulheres no roubo a uma dupla de universitários britânicos. Os turistas conheceram as mulheres na Lapa, foram dopados e roubados.
Um deles foi filmado cambaleando no calçadão de Ipanema, na zona sul, logo após sair de um táxi. Ele caiu desacordado na areia e foi acudido por pessoas presentes. As suspeitas aparecerem no vídeo deixando o local apressadas, também de táxi. Elas não foram encontradas pela polícia.
A reportagem leu inquéritos policiais de cinco casos, ocorridos entre 2024 e 2025. Em quatro deles, suspeitas abordaram turistas estrangeiros e ofereceram sexo grupal. No outro, a vítima foi dopada por homens, segundo a polícia, durante discussão.
Segundo os registros, os golpes costumam acontecer em bairros com boates, casas noturnas e rodas de samba. Na Lapa, seguranças de boate e recepcionistas de hotéis já teriam identificado as quadrilhas, por causa da recorrência.
Funcionários conseguiram evitar a consumação de um golpe em julho do ano passado, na avenida Mem de Sá, na Lapa. Um turista alemão fora abordado por duas mulheres, que perguntaram se ele tinha interesse em praticar sexo em grupo. A dupla, segundo depoimento do turista, o instigou a ir até um motel.
Elas tentaram três hotéis da região e todos negaram a estadia, segundo a polícia, “em razão do modus operandi e a identidade já conhecida”. O trio entrou em um carro de aplicativo e um segurança que viu a cena acionou a polícia. Em abordagem, policiais encontraram no bolso de uma delas medicamentos com clonazepam (comercializado com o nome Rivotril) e alprazolam, substâncias sedativas que diminuem excitações cerebrais.
Em outro caso, também na Lapa, quatro suspeitos iniciaram discussão com um homem que havia quebrado a cadeira de um trailer de comida e se negava a pagar pelo dano. Depois de conversas, um dos suspeitos ofereceu uma garrafa de cerveja aberta em forma de pedido de pazes.
A vítima bebeu e em seguida caiu desacordada. Os suspeitos tentaram roubar um aparelho celular e R$ 800 em espécie, mas foram flagrados pela polícia.
A reportagem não conseguiu contato com as defesas dos suspeitos envolvidos nos inquéritos.
Um investigador policial ouvido pela reportagem sob reserva afirma que a prática do golpe em áreas de atividade noturna é antiga, mas há novas dinâmicas. O uso de aplicativos de transporte, ele cita, dificulta a localização imediata dos golpistas, já que antes eles circulavam pelos bairros em busca de vítimas.
Além de abordagens pessoais, autores do crime também buscam vítimas por meio de aplicativos de encontro.
Em setembro, um turista holandês conheceu uma brasileira por meio de aplicativo. Ela chamou outras duas mulheres para o hotel onde ele estava hospedado. Durante a madrugada, quando foi à varanda fumar, o turista caiu desacordado. Laudos indicaram presença de clonazepam em uma bebida energética que havia sido ingerida por ele.
As mulheres foram detidas horas mais tarde, depois que um atendente estranhou compras de R$ 4.000 feitas por ela em um shopping com um cartão virtual com nome estrangeiro elas haviam roubado o celular da vítima.
No caso da última semana, o prejuízo dos britânicos foi estimado em R$ 116 mil. As suspeitas foram identificadas como Amanda Couto Deloca, 23, Mayara Ketelyn Américo da Silva, 27, e Raiane Campos de Oliveira, 28. Todas já têm passagens pela polícia.
A reportagem não conseguiu contato com as defesas.
A delegada titular da Deat (Delegacia Especial de Apoio ao Turismo), Patricia Alemany, disse à Folha de S.Paulo que eles encontraram as mulheres na Lapa, num evento de samba, beberam drinks e pegaram um táxi para Ipanema. Depois, foram encontrados desorientados na praia.
As vítimas foram levadas à UPA de Copacabana e, em seguida, foram à delegacia. Aos investigadores os turistas disseram ter tido os celulares roubados. Também relataram que as mulheres realizaram uma transferência de cerca de 16 mil libras equivalente a aproximadamente R$ 110 mil da conta de um deles.