BRASÍLIA, DF E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ordenou nesta quinta-feira (7) a realização de um novo censo excluindo os migrantes em situação irregular da contagem da população. Segundo críticos, a medida, quase um ano antes das eleições de meio de mandato, almeja mudar o mapa eleitoral para favorecer candidatos republicanos.

Se levada a cabo, a decisão também quebraria o período oficial entre contagens. Os EUA fazem um censo populacional a cada dez anos, e o próximo estava previsto para 2030. A pasta responsável pela contagem é o Departamento de Comércio, que é chefiado por Howard Lutnick.

O censo é fundamental para as eleições no país porque define, entre outras coisas, a distribuição de cadeiras no Congresso, além da divisão de verbas federais. Por isso, o anúncio de Trump vem sendo apontado como uma estratégia para tentar diminuir a representação de estados com grandes populações migrantes, caso de Califórnia e Nova York, majoritariamente democratas.

Durante o primeiro mandato, em 2020, Trump já havia assinado um memorando com a mesma intenção. A medida foi então questionada na Justiça, e a Suprema Corte determinou que apenas o Congresso tem competência para definir quem deve ou não ser incluído no censo.

Agora Trump volta a intervir no censo demográfico, consciente de que uma mudança na contagem oficial poderia transformar o Congresso, o Colégio Eleitoral e as políticas públicas. Desta vez, há também um cenário mais favorável para o republicano tanto no Congresso quanto na Suprema Corte, de maioria conservadora e formada por indicações do próprio Trump.

“Instruí nosso Departamento de Comércio a começar imediatamente o trabalho em um novo e altamente preciso censo baseado em fatos e números atuais e, o que é importante, utilizando os resultados e as informações obtidas nas eleições presidenciais de 2024”, escreveu ele nesta quinta em sua plataforma digital, a Truth Social.

“As pessoas que estão em nosso país ilegalmente NÃO SERÃO CONTADAS NO CENSO”, acrescentou, utilizando as habituais letras maiúsculas.

Diante de uma desaceleração demográfica do país, a população imigrante aumentou em 1,6 milhão de pessoas de 2022 para 2023. O crescimento foi puxado sobretudo por latino-americanos, segundo o IPM (Instituto de Políticas Migratórias), com sede em Washington.

A população de migrantes dos EUA representa pouco menos de 15% dos 342 milhões de habitantes do país -são 47,8 milhões de pessoas nascidas no exterior. Destes, “quase três quartos estavam no país legalmente como cidadãos naturalizados ou residentes permanentes legais”. Tinham, portanto, o green card ou vistos temporários, segundo o IPM.

Segundo o Pew Research Center, se os migrantes em situação irregular tivessem sido eliminados do censo, vários estados poderiam perder cadeiras no Congresso em 2020, como é o caso da Califórnia.

O anúncio de Trump ocorre em um momento em que os republicanos tentam modificar o mapa eleitoral no Texas para obter até cinco assentos a mais nas eleições de meio de mandato em 2026, no Legislativo local.

Com o objetivo de obstruir e impedir a votação, dezenas de congressistas estaduais democratas fugiram do estado. O governador republicano, Greg Abbott, ordenou que a polícia os prenda, e o senador John Cornyn, do Texas, disse que o FBI vai atrás deles.

Em resposta, democratas da Califórnia já articulam estratégias para redesenhar o mapa eleitoral do estado com o objetivo de favorecer candidatos da legenda na disputa por cadeiras na Câmara.

Diferentemente do Brasil, onde eleitores em cada estado votam sem divisão geográfica interna para eleger deputados federais, membros da Câmara dos EUA são escolhidos para representar distritos específicos. Os limites territoriais desses distritos são definidos pelo legislativo de cada estado com o objetivo, em teoria, de dividir a unidade da federação em blocos com o mesmo número de eleitores.

A prática de redesenhar os mapas distritais a fim de criar maiorias artificiais e ajudar a eleger deputados que, do contrário, não venceriam a disputa é conhecida pelo termo em inglês “gerrymandering”.

A nova investida de Trump acontece no contexto de uma ofensiva de seu governo contra a imigração irregular em todo o país. O republicano vem intensificando prisões e deportações de migrantes, o que tem motivado dezenas de ações judiciais em tribunais federais e estaduais.

Segundo uma pesquisa recente da agência Reuters em parceria com o instituto Ipsos, o endurecimento das medidas teve impacto negativo na popularidade do presidente: sua aprovação na área de imigração caiu para 41%, o menor índice desde que ele voltou à Casa Branca, em janeiro. Entre os motivos apontados estão as operações agressivas, incluindo batidas em locais de trabalho feitas por agentes mascarados.