RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – O empresário gaúcho Marcos Huff conta que, em visita aos Estados Unidos em junho, abriu negociações com três potenciais clientes para sua produção de calçados no Rio Grande do Sul. A expectativa era de que as primeiras entregas fosse feitas no fim do ano.
“Desde que [o presidente americano Donald] Trump assumiu, houve correria dos clientes para reduzir dependência da Ásia”, afirma ele. O principal produtor daquele continente, a China, foi um dos primeiros alvos da guerra comercial iniciada meses depois pelos Estados Unidos.
De fato, dados da Abicalçados (Associação Brasileira das Indústrias de Calçados) indicam que as exportações do setor para o mercado americano cresceram 13,5% no primeiro semestre, atingindo 5,8 milhões de pares. O país respondeu por mais de 20% das compras externas de calçados brasileiros.
Na Killana, a empresa de Huff, 25% do faturamento do primeiro semestre veio de vendas para clientes americanos. O aumento das encomendas demandou contratações para elevar em 10% o quadro de funcionários, hoje com 90 empregados diretos e cerca de 250 em prestadores de serviço.
“Agora os negócios estão todos em xeque. Uma tarifa de 50% inviabiliza”, afirma o empresário. Seu último embarque para os Estados Unidos, com cerca de mil pares, foi feito em meados de junho e não foi impactado pelo tarifaço.
Huff diz que ainda tem um pequeno lote para exportar, mas já espera que o cliente tente negociar descontos para compensar a tarifa, caso Trump mantenha a decisão. Já não tem esperança de clientes para a temporada de inverno no Hemisfério Norte.
“É hora de mandar sapato fechado e bota para lá, mas não fechei pedido da coleção”, conta. Sem novos contratos, teme ter que fazer cortes. “Se negociarmos as tarifas, eu consigo captar clientes e o cenário volta a ser de crescimento. Se forem mantidas, perco todos os negócios, tem demissão e redução de produção.”
Huff critica a postura do governo em relação às tarifas. “Se não promover o diálogo de forma rápida, não vamos ter melhoria na relação [entre os países]. Tem que acelerar processo de negociação para chegar a um ponto de partida”.
Ele teme que, mesmo com negociações e revisão das tarifas, os novos clientes que passaram a procurar o Brasil este ano voltem para a Ásia. “A gente estava de novo sendo visto como potencial fornecedor”, afirma. “Se o cliente voltar para a China, acabou o mercado brasileiro”.
Segundo a Abicalçados, quase 80% das empresas exportadoras do setor já relatam impactos em decorrência do tarifaço de Trump, como atrasos, paralisação em negociações ou cancelamento de pedidos de produtos muitas vezes já em produção.
A associação estima que o cenário levará a perda de cerca de 8.000 postos de trabalho no setor. Somando os postos indiretos, via cadeia produtiva, do fornecedor de materiais ao varejo, esse impacto pode chegar aos 20 mil empregos.