SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Lotado, o Galpão Elza Soares, no centro de São Paulo, foi palco de um protesto pró-Palestina na tarde desta quarta-feira (6) durante a abertura da Festa Literária Pirata das Editoras Independentes, a Flipei, dias após a Prefeitura de São Paulo cancelar unilateralmente a realização do evento na praça das Artes, que pertence ao complexo cultural do Theatro Municipal.

Mesmo com contrato de concessão onerosa assinado com a organização social Sustenidos, que administra o complexo, a Fundação Theatro Municipal enviou na sexta um ofício em que informava o cancelamento da festa literária por conta de “conteúdo e finalidade de cunho político-ideológico”.

A Flipei chamou a decisão de “censura política e ideológica” e informou que vai tomar as medidas cabíveis contra a quebra de contrato.

Na mesa de abertura, bandeiras da Palestina tomaram o galpão do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, que acolheu o evento, e o público desfilou variações de cores diferentes do keyffiehs, o lenço que simboliza a luta palestina.

No palco, reuniram-se o historiador judeu israelense Ilan Pappe, cuja participação na Flip, em Paraty, sofreu oposição de organizações sionistas, e o ativista brasileiro Thiago Ávila, que foi preso e deportado por Israel junto com a ativista Greta Thunberg. A mediação foi da jornalista e escritora Soraya Misleh.

“Mudamos para este lugar parcialmente por minha causa, mas não vamos nos curvar ao terror contra o povo palestino”, disse Pappe na abertura de sua fala. O fato de a prefeitura ter anunciado o cancelamento da Flipei na praça das Artes horas depois da mesa de Pappe na Flip levantou suspeitas de que teria havido pressão.

Isso porque a organização da festa literária de Paraty admitiu ter recebido contato de pessoas ligadas a organizações e coletivos judaicos pedindo que Pappe fosse acompanhado de outro historiador pró-Israel.

Também o diretor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, Adrián Pablo Fanjul, recebeu carta de uma organização judaica internacional solicitando a reconsideração de sua palestra na última terça (5) na Casa de Cultura Japonesa da USP.

No debate de abertura, o público da Flipei entoou palavras de ordem como “sionistas, fascistas, não passarão!” e “do rio ao mar, Palestina livre já”. Durante a fala de Pappe, uma ou outra pessoa gritou “viva o Hamas” -que não virou coro como as demais.

“As pessoas a favor do genocídio são muitos poderosas. E quem é contrário a ele precisa se perguntar: podemos fazer mais para parar o genocídio promovido pela elite sionista?”, questionou o historiador.

Pappe defendeu que aqueles solidários ao povo palestino pressionem seus governos para que aumentem as sanções a Israel. “O seu governo, que não é tão ruim como tantos outros, precisa aumentar sanções”, disse ele ao público brasileiro.

“Precisamos mandar uma mensagem daqui para os Estados Unidos e a União Europeia, que são os patronos do conflito: os palestinos não estão sozinhos e não pode mais existir o genocídio, o apartheid e a limpeza étnica”, completou.

O historiador defende a proposta de um estado único que acolha os dois povos, judeus israelenses e muçulmanos palestinos. “Não existe ligação exata entre ser judeu e ser sionista”, afirmou.

“E eu não estou sozinho. Há outros judeus na Palestina histórica e no mundo que farão tudo para mostrar solidariedade com os palestinos e trabalhar para a descolonização de um território que pertence ao mundo árabe e que não pode ser uma base europeia para o colonialismo, o capitalismo e a opressão.”

“Acredito que vamos ver o começo da liberação da Palestina, que veremos livre, do rio ao mar”, concluiu, sob os aplausos, gritos e flamejar das bandeiras no galpão.