SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Israel anunciou nesta terça-feira (5) que vai voltar a permitir a entrada de mercadorias na Faixa de Gaza para comércio local após meses. A medida ocorre após cenas de palestinos famintos em meio ao bloqueio que Tel Aviv impõe ao território desencadearem pressão internacional inédita sobre o Estado judeu.

“O Ministério da Defesa aprovou um número limitado de comerciantes locais, que devem seguir vários critérios e controles de segurança rigorosos”, afirmou comunicado do Cogat (Coordenador de Atividades Governamentais nos Territórios, na sigla em inglês).

Os produtos aprovados incluem alimentos básicos, comida para bebês, frutas, vegetais e produtos de higiene, e o pagamento das mercadorias deve ser efetuado apenas por meio de transferências bancárias, que serão submetidas a uma supervisão, segundo as autoridades israelenses.

De acordo com o jornal Haaretz, as mercadorias sairão da Cisjordânia carregadas em caminhões israelenses e seguirão para a passagem de Kerem Shalom, no sul de Gaza, onde os comerciantes locais receberão os produtos antes de vendê-los aos moradores. Trata-se de um esquema parecido com o que vigorava antes de Israel bloquear totalmente a entrada de ajuda, em março.

O Cogat, órgão subordinado ao Ministério da Defesa e responsável por questões civis em Gaza e Cisjordânia, disse que o objetivo é aumentar o volume de ajuda e “reduzir a dependência da assistência por parte da ONU e das organizações internacionais”.

O território, que é totalmente dependente da ajuda humanitária, sofre “o pior cenário possível” de fome, afirmou na semana passada o IPC (Classificação Integrada de Fases de Segurança Alimentar). De acordo com a iniciativa, apoiada pela ONU, uma em cada três pessoas ali passa vários dias sem comer nada, e mais de 20 mil crianças foram atendidas por desnutrição aguda de abril a meados de julho.

Logo antes desse período, a Faixa de Gaza ficou 11 semanas sob bloqueio total de Israel, sem receber nenhum tipo de mantimento. A restrição levou o sistema humanitário ao colapso, segundo organizações que atuam no local, e a suspensão parcial do bloqueio, em maio, não foi suficiente para o cenário catastrófico em que o território se encontrava.

Naquele mês, grande parte dos mantimentos passou a ser distribuído pela FHG (Fundação Humanitária de Gaza), uma recém-criada organização apoiada por Israel que emprega uma empresa de logística dos Estados Unidos dirigida por um ex-oficial da CIA, a agência de inteligência americana.

Quando a operação começou, às várias controvérsias que já rondavam a entidade se somaram a relatos de violência em meio a distribuição de alimentos —de acordo com a ONU, o Exército israelense matou mais de 1.300 pessoas que tentavam obter ajuda em Gaza, a maioria perto das instalações da fundação. A FHG nega que tenha havido incidentes mortais em seus locais e diz que os mais letais ocorreram perto de outros comboios de ajuda.

Na semana passada, após imagens de pessoas desnutridas causarem comoção mundial, Tel Aviv anunciou medidas para permitir que mais ajuda chegue a Gaza, incluindo pausas nos combates durante parte do dia em algumas áreas, aprovação de lançamentos aéreos e anúncio de rotas protegidas para comboios de ajuda.

A escassez de alimentos, porém, ocorre em diferentes níveis desde o início da guerra, segundo dados oficiais.

De acordo com estatísticas militares israelenses, uma média de cerca de 140 caminhões de ajuda entraram em Gaza diariamente durante o conflito, cerca de um quarto do que as agências humanitárias afirmam ser necessário para atender os mais de 2 milhões de habitantes do território. Segundo autoridades palestinas e da ONU, Gaza precisa que cerca de 600 caminhões de ajuda entrem por dia, número que Israel costumava permitir antes da guerra.

Israel costuma acusar o Hamas de roubar suprimentos, embora um relatório produzido em junho pela Usaid, a agência de ajuda externa americana, tenha constatado que não há provas de roubo sistemático de comida pela facção.

A medida anunciada nesta terça, aliás, já sofreu críticas. Avigdor Lieberman, líder do partido de direita Yisrael Beitenu e ex-ministro da Defesa e das relações Exteriores de Israel, afirmou que a decisão “constitui financiamento direto de terroristas”. “O setor privado em Gaza paga impostos oficiais ao Hamas”, escreveu ele na rede social X.