RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Gabriel Ribeiro e Juan Casemiro fazem esculturas usando como matéria-prima a imprevisibilidade. Ambos os artistas abrem mão do controle sobre o resultado final para se deixar guiar por encontros fortuitos. Essa poética do imprevisto pode ser vista agora na mostra “Margem e Contingência”, em cartaz no Centro Cultural Correios, na região central do Rio de Janeiro.

A exposição traz um conjunto de trabalhos em que os artistas fazem intervenções em objetos cotidianos para dar novos significados a eles.

Ribeiro, por exemplo, embebeu um tecido em líquido cianótipo, substância fotossensível que produz imagens de tons azulados. Em seguida, colocou uma cortina de miçangas sobre o tecido e o expôs à luz do Sol. A partir de uma reação química, as marcas das miçangas ficaram impressas sobre o material. O resultado é um trabalho em que linhas sinuosas parecem dançar sobre a superfície azul.

“É difícil ter um controle sobre o resultado final”, diz Ribeiro. “É sempre bastante inesperado. Eu geralmente tento incluir um pouco da imprevisibilidade no meu trabalho.”

Segundo o artista, esse interesse pelo imprevisto é uma consequência da própria natureza de seu fazer artístico. Ele costuma trabalhar com materiais voláteis e de difícil controle, como os líquidos fotossensíveis.

“Às vezes, a gente tenta controlar, mas não é possível. Não é nem como se a falta de controle fosse sempre intencional. Ela acaba acontecendo pela forma como os materiais anunciam os seus limites. Em última instância, as lógicas internas, físicas ou químicas acabam por continuar o trabalho de alguma maneira.”

É isso o que aconteceu na obra “Dust Bunny”, em que é possível ver marcas escuras sobre uma espuma de poliuretano, material usado em colchões. Esse trabalho surgiu por acidente. Um dia, o artista esqueceu um martelo em cima de uma espuma e foi viajar. Quando voltou, depois de um mês, percebeu que a luz do sol havia gravado a silhueta do instrumento na superfície do colchão.

“Acontece muito isso. Eu sistematizo algo que aconteceu por acidente, criando um protocolo para fazer aquilo acontecer de novo. Por meio da repetição, eu desenvolvo uma espécie de método.”

O acaso está presente também no trabalho de Casemiro. O artista costuma trabalhar com objetos que encontra durante viagens ou que fizeram parte de momentos importantes de sua vida. Ele fez isso, por exemplo, na obra “Oscar III”. Dentro de um filtro de ar usado em carros, colocou 17 bitucas de cigarro que seus amigos haviam fumado.

“Isso tem a ver muito com a memória. É uma forma também de lembrar das coisas”, diz o artista. “Olho para os trabalhos e recordo as coisas, sei de quem era e onde eu comprei. Apesar disso, é uma memória que é sempre ressignificada, porque toda vez que alguém olhar para a obra vai ter interpretações diferentes sobre aquilo.”

O público também pode fazer diferentes interpretações a partir de “Contar os Dias pra te Ver Outra Vez”, um dos trabalhos mais intrigantes de Casemiro. O artista posicionou dezenas de fragmentos de giz dentro dos vãos de uma muxarabi —painel vazado usado na arquitetura. “Decidi colocar esses gizes um por um como se eu estivesse fazendo uma contagem que marca o tempo de um mês”, afirma.

Para Ribeiro, o seu trabalho e o de Casemiro se aproximam justamente por refletirem sobre o tempo. “A passagem do tempo se manifesta no nosso trabalho por meio de objetos que são marcados por ações prévias. Em alguns momentos, eles chegam até a gente após terem sofrido a ação do Sol ou após terem passado pelas mãos de outras pessoas.”

MARGEM E CONTINGÊNCIA

– Quando Seg. a sáb., de 12h às 19h. Até 13 de setembro

– Onde Centro Cultural dos Correios – r. Visconde de Itaboraí, 20, Rio de Janeiro

– Preço Gratuito

– Classificação Livre