BELO HORIZONTE, MG (FOLHAPRESS) – Ao mesmo tempo em que o governo Lula (PT) propõe aumentar a tributação sobre as casas de aposta, prefeituras de capitais pelo país aprovaram ou apresentaram legislações no sentido contrário, para diminuir imposto sobre o setor.

Em julho, o prefeito de Belo Horizonte, Álvaro Damião (União Brasil), enviou à Câmara Municipal um projeto de lei para reduzir a cobrança de Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) que incide sobre as bets, dos atuais 5% para 2%.

A prefeitura justificou a medida pelo seu potencial de arrecadação e para estimular a instalação das empresas do setor no município.

No projeto de lei, a gestão municipal diz ter identificado seis pedidos de autorização feitos junto à União para operação de bets que desejam se estabelecer em Belo Horizonte.

A proposta ainda afirma que outras cidades do país adotam a alíquota de 2%, como São Paulo, Barueri e Porto Alegre.

Entre as capitais, a reportagem identificou que Recife também aplica a mesma alíquota após lei sancionada em maio, enquanto a prefeitura do Rio chegou a encaminhar proposta em 2023 ao Legislativo sem estabelecer uma alíquota, mas pediu a retirada de tramitação do texto meses depois.

Para o vereador da capital mineira Wagner Ferreira (PV), a proposta indica que a prefeitura, mesmo que indiretamente, apoia o setor de apostas.

“O risco social é muito grande. A gente não quer que BH vire a capital do Tigrinho”, afirma, em referência ao jogo que funciona como um cassino virtual.

Ele, que costuma votar alinhado à base do governo, diz que já conversou com colegas que são contrários à proposta do prefeito, que tramita na Comissão de Legislação e Justiça (CLJ).

O vereador também pediu à prefeitura informações sobre existência de programas para conscientização e acolhimento de pessoas com ludopatia, que é caracterizado como o vício em apostas.

Questionada pela reportagem, a Secretaria Municipal de Saúde afirmou que pacientes com compulsão por jogos são tratados na rede SUS, por meio da política de saúde mental. Disse também que não tem dados sobre as demandas específicas para esse tipo de atendimento.

As propostas das capitais brasileiras vão em sentido oposto à medida provisória (MP) apresentada pelo governo federal para aumentar a tributação sobre as casas de apostas.

Hoje, elas são tributadas em 12% do GGR (sigla em inglês para arrecadação de apostas menos o valor dos prêmios). A MP, que ainda não foi apreciada pelo Congresso, prevê alta nessa alíquota para 18%.

O percentual de ISS, que é definido pela prefeitura, também incide sobre o GGR, enquanto outros tributos são cobrados sobre o lucro e a receita bruta.

O professor de direito tributário Onofre Alves Batista Júnior, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), afirma que os municípios disputam uma espécie de guerra fiscal em mais esse caso porque o governo federal não regula o tema.

“O artigo 146 da Constituição dispõe que é papel da União eliminar conflito de competência em matérias tributárias. Ela tinha que reagir e estabelecer uma alíquota mínima de ISS para casas de apostas”, diz o professor.

Ele acrescenta que, com a implementação da reforma tributária, os municípios não poderão mais aplicar alíquotas diferentes para cada item, como é o caso em questão.

Procurado, o Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR), que representa cerca de 75% do mercado brasileiro de apostas, disse em nota que vê como uma iniciativa natural o movimento de algumas capitais em rever alíquotas de ISS como forma de atrair investimentos.

“O que preocupa o segmento de apostas é o aumento da carga tributária já estabelecida em uma regulamentação federal implantada há seis meses, o que leva a uma instabilidade regulatória e pode inibir a instalação de operações no país”, afirmou a entidade.

O IBJR acrescentou que a medida pode reduzir a atratividade do mercado legal e incentivar a operação clandestina, que deixa de pagar em impostos cerca de R$ 10 bilhões ao ano no país.