RECIFE, PE (FOLHAPRESS) – O presidente de El Salvador, Nayib Bukele, afirmou neste domingo (3) que a aprovação da reeleição presidencial por tempo indeterminado para a presidência do país não é o “fim da democracia”. Ele afirmou que as críticas à decisão decorrem do fato de ter sido tomada por um país “pequeno e pobre”.
“Noventa por cento dos países desenvolvidos permitem a reeleição por tempo indeterminado de seu chefe de governo, e ninguém se incomoda. Mas quando um país pequeno e pobre como El Salvador tenta fazer o mesmo, de repente é o fim da democracia”, escreveu Bukele em uma mensagem escrita em inglês por meio da rede social X.
“Claro, se apressarão em apontar que ‘um sistema parlamentar não é o mesmo que um presidencial’, como se esse tecnicismo justificasse o duplo padrão. Mas sejamos sinceros, isso não é mais que um pretexto”, escreveu Bukele.
Na quinta-feira (31), a Assembleia Legislativa de El Salvador, controlada pelo partido governista, aprovou uma proposta de emenda constitucional que abre caminho para Bukele permanecer no poder por tempo indeterminado. Referência para setores da direita em todo o mundo, o líder, segundo críticos, cada vez mais consolida um sistema autocrático em seu país.
A iniciativa apresentada pelo Novas Ideias, o partido de Bukele que detém ampla maioria na Casa, determina a possibilidade de reeleição presidencial ilimitada, a ampliação dos mandatos de cinco para seis anos e o fim do segundo turno nas eleições.
Bukele, 44, chegou ao poder em 2019 e foi reeleito em 2024, apesar de a Constituição salvadorenha proibir mandatos consecutivos. Na ocasião, o tribunal constitucional do país –com maioria dos magistrados indicados por ele– entendeu que impedir o presidente de concorrer violava seus direitos humanos. A partir do próximo pleito, o líder não terá qualquer restrição legal à reeleição.
Atualmente, há países desenvolvidos que permitem a reeleição ilimitada dos chefes de governo sob regime parlamentarista, ou seja, quando a população vai às urnas com dada frequência para votar em um partido ou coalizão partidária. Em seguida, as agremiações se unem em torno de um candidato, que pode se tornar primeiro-ministro após obter apoio da maioria do Parlamento.
Em países com regime presidencialista, no qual o eleitorado vota diretamente em uma pessoa, são raros os casos de reeleição indefinida, como acontece na Venezuela, uma ditadura liderada por Nicolás Maduro.
Segundo Bukele, se El Salvador se declarasse uma monarquia parlamentar “com exatamente as mesmas regras que o Reino Unido, Espanha ou Dinamarca”, as críticas continuariam.
“Porque o problema não é o sistema, mas o fato de que um país pobre se atreva a agir como um país soberano. Supõe-se que você não deve fazer o que eles fazem. Supõe-se que você deve fazer o que eles dizem. E espera-se que você se mantenha na sua faixa”, afirmou.
Organizações como a Anistia Internacional, Human Rights Watch (HRW) e o Escritório em Washington para Assuntos Latino-americanos (WOLA) consideraram a decisão como um “golpe mortal” à democracia e uma “manipulação” da Constituição para favorecer as ambições de poder de Bukele.
O presidente salvadorenho possui grande popularidade por sua guerra contra as gangues, que iniciou em 2022 e reduziu a números mínimos históricos a violência no país centro-americano. Mas grupos de direitos humanos criticam a política de segurança, baseada em um regime de exceção que permite prisões em massa sem ordem judicial e restringe liberdades.
Bukele, aliado do presidente americano, Donald Trump, tem aprofundado o autoritarismo desde que o republicano voltou à Casa Branca. Nos últimos meses, mais jornalistas e ativistas de direitos humanos fugiram de El Salvador, onde o líder torna a vida de opositores cada vez mais difícil.
O mais recente caso é o da Cristosal, uma das mais importantes ONGs do país. Segundo a agência de notícias Reuters, o grupo retirou 20 funcionários de El Salvador nas últimas semanas.
Sem resistência no Legislativo e no Judiciário, as ONGs e os jornais salvadorenhos eram algumas das últimas entidades críticas ao governo que tinham resistido às investidas do presidente.