NIR OZ, ISRAEL (FOLHAPRESS) – Há apenas 7 moradores atualmente no kibutz Nir Oz, no sul de Israel, um dos mais profundamente afetados pelos ataques dos Hamas no dia 7 de outubro de 2023. Os poucos que a Folha encontrou em visita ao local preferiram não comentar a respeito dos mais de 650 dias desde o massacre.

Está ali um microcosmo do trauma que é constantemente relembrado como o mais grave ataque a judeus desde o Holocausto, e o pior da história do Estado de Israel: 1.200 foram mortos e 251 sequestrados pelo Hamas e outros grupos terroristas que entraram em massa no território israelense.

Nir Oz tinha 417 moradores antes da ofensiva. Foram 27 mortos e 78 sequestrados, o maior número de reféns entre as localidades atacadas e um terço do total —50 deste total ainda está em Gaza, e presume-se que 30 deles estejam mortos.

A maioria das casas, térreas e com dois ou três quartos pequenos, estão reviradas, e queimadas, com marcas de tiros nas paredes e objetos pessoais jogados no chão ou congelados no tempo daquela manhã de 7 de outubro, como garrafas de vinho em cima do balcão de uma cozinha, ou desenhos das crianças presos com fita na parede.

A memória do ataque não se resume à lembrança das vítimas e às marcas deixadas pelo massacre. A Folha escutou ao menos 20 explosões atingindo a Faixa de Gaza em cerca de 2 horas de visita, um lembrete diário das consequências da guerra e dos reféns ainda em posse do Hamas.

A fronteira separando o território palestino do kibutz fica a cerca de 1,5 km de distância, e uma estrada de terra corta pequenas plantações em meio à aridez da região, nos limites do deserto do Neguev. Ali foi um dos caminhos pelos quais chegaram os terroristas em 2023.

A fumaça resultante da artilharia israelense sobe no horizonte, onde está Khan Yunis, um dos principais focos de combates e ataques aéreos de Israel; 20 palestinos morreram na cidade, segundo o Ministério da Saúde, controlado pelo Hamas, durante a semana em que a visita ao kibutz ocorreu. A cidade está devastada.

Uma dessas explosões tremeu o quarto-bunker da família Bibas, um dos símbolos mais melancólicos do ataque no país, enquanto a reportagem visitava o local.

O pai, Yarden, foi o único libertado com vida; a mãe, Shiri, e os filhos Kfir e Ariel, foram devolvidos em caixões. Filmado pelos terroristas, o sequestro da mãe e dos filhos se tornou uma das várias imagens do ataque que chocou a sociedade israelense. Cartazes com as fotos da família seguem colados na porta da casa destruída.

A cerca de 10 km dali fica o kibutz de Re’im, local onde mais pessoas morreram no ataque do Hamas. Na colina em frente à comunidade, 344 civis foram assassinados durante a festa Nova.

Hoje o local também é um memorial. O soar metálico sutil de sinos dos ventos preenche o espaço enquanto visitantes caminham falando em voz baixa.

Fotos das vítimas em cartazes se espalham pelo local em que funcionava a pista de dança principal da rave, em volta da qual uma série de placas conta histórias particulares do dia do massacre, algumas em tons heroicos de quem fugiu, voltou para resgatar colegas, e acabou morto.

Há alguns bunkers espalhados pelo local, como é costume na região do entorno de Gaza. São estruturas de concreto, sem porta ou janela, de cerca de 2 metros de altura e não mais do que 2 metros quadrados que servem de proteção para eventuais ataques aéreos e estilhaços de foguetes.

No dia da festa, esses locais se tornaram armadilhas, porque a salva de foguetes antes da invasão terrestre do Hamas fez com que frequentadores se concentrassem nos abrigos e se tornassem alvos fáceis.

A sobrevivente Mazal Tazazo estava com dois amigos na festa. Os três fugiram do local em direção ao descampado ao redor, onde tentaram se esconder, mas foram encontrados por terroristas.

Tazazo foi golpeada com uma coronhada na nuca e caiu desacordada. Quando recobrou a consciência, viu os dois amigos mortos. Ela mostra a cicatriz de cerca de 5 centímetros atrás do cabelo e diz acreditar que não levou tiros ou foi sequestrada porque se fingiu de morta.

“Quase dois anos depois e eu ainda não acredito que aquilo não foi um filme, é difícil de compreender, e ainda tento processar”, diz ela, que se dedica atualmente a contar sobre sua experiência naquele dia.

A entrevista com a sobrevivente ocorre próximo a um bosque plantado ao lado do local, no qual cada nova árvore carrega uma foto de alguma das vítimas. O único som que interrompe a conversa é o de duas explosões em Gaza —como em Nir Oz, um lembrete da guerra que segue a poucos quilômetros dali.

O jornalista viajou a convite da Embaixada de Israel no Brasil