SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Rashid Khalidi, professor emérito de estudos árabes modernos na Universidade Columbia, anunciou a decisão de cancelar o curso que ministraria neste semestre em uma carta aberta publicada pelo jornal The Guardian. O motivo da suspensão é um protesto contra o acordo de mais de US$ 200 milhões firmado recentemente entre a universidade e o governo Trump.
Na carta, Khalidi acusa Columbia de capitular e ameaçar a liberdade acadêmica ao aceitar rever currículos e restringir críticas a Israel, conforme exigência do governo americano. O professor, que dedicou mais de 50 anos ao estudo e ensino da história moderna do Oriente Médio sendo 23 deles em Columbia afirma que as condições impostas pela universidade tornaram impossível a realização do curso.
“Embora eu esteja aposentado, estava programado para ministrar no outono uma grande aula sobre este tema como palestrante especial, mas não posso fazê-lo sob as condições que Columbia aceitou ao capitular para o governo Trump em junho”, escreve Khalidi.
Trump havia suspendido subsídios a Columbia sob o argumento de que a instituição tolerou atos antissemitas. Como parte do entendimento que pôs fim ao impasse, a universidade aceitou pagar uma multa de US$ 200 milhões (cerca de R$ 1,1 bilhão) ao longo de três anos, em troca da retomada de bilhões de dólares em repasses públicos.
Um dos pontos centrais da crítica do professor é a adoção, por Columbia, da definição de antissemitismo da Aliança Internacional para a Memória do Holocausto, a IHRA. Essa definição, segundo ele, “deliberadamente, mentirosa e desonestamente confunde o judaísmo com Israel, de modo que qualquer crítica a Israel, ou mesmo uma descrição das políticas israelenses, torna-se uma crítica aos judeus”.
Khalidi lembra que Kenneth Stern, um dos coautores da definição, repudiou o seu uso atual e declarou publicamente que “nem todo antissionista é antissemita”. No Brasil, o governo Lula anunciou em julho a decisão de deixar a IHRA.
“Sob essa definição de antissemitismo, que absurdamente confunde a crítica a um Estado-nação, Israel, e a uma ideologia política, o sionismo, com o antigo mal do ódio aos judeus, é impossível ensinar com honestidade sobre temas como a história da criação de Israel e a contínua Nakba palestina, que culmina no genocídio perpetrado por Israel em Gaza com a conivência e apoio dos EUA e grande parte da Europa Ocidental”, diz Khalidi.
A carta também afirma que a decisão de Columbia não afeta apenas a liberdade acadêmica dos professores, mas também a de estudantes e assistentes de ensino. Muitos têm sido submetidos a processos disciplinares que Khalidi compara a “tribunais arbitrários”, com relatos de alunos retirados de residências universitárias por críticas ao governo israelense.
“Essa vigilância externa e o controle sobre o que pode ser ensinado e discutido constituem a antítese da liberdade acadêmica”, afirma.
Preocupado com o impacto dessa decisão para os estudantes, Khalidi lamenta a perda da oportunidade para cerca de 300 alunos que haviam se inscrito no curso. Para compensar, planeja oferecer uma série de palestras públicas em Nova York, com transmissão online, cujos recursos serão destinados a universidades de Gaza destruídas por bombardeios israelenses.