SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Enquanto a busca pela inalcançável perfeição estética não dá sinais de trégua e transforma rostos, corpos e arcadas dentárias lindas em aberrações, o mundo pop torna uma imperfeição em objeto de desejo.
O pequeno espaço mais aberto que o normal entre os dentes da frente, chamado por ortodontistas de diastema, é uma variação anatômica que não costuma causar problemas. Ainda assim, é quase sempre corrigido por aparelhos ou pelas temíveis, e perceptíveis, lentes de contato dentárias.
Mas quando um diastema sobrevive, pode dar ao rosto autenticidade e um toque sexy inegável. É um detalhe que dá vazão à imaginação do outro. Ainda mais na boca, que às vezes só se revela completamente num sorriso.
Madonna talvez seja a pessoa que mais inovou e transformou seu visual desde que se fez notar, no começo dos anos 1980. Rosto, corpo, cabelo, até os dentes, já passaram por infinitas mudanças. Mas nada nunca tirou aquela fresta de seus dentes. Mesmo que eles já tenham sido cobertos de ouro ou por um adesivo de rubi autêntico.
Madonna pode ser tudo, menos boba. Ou novidade. Assim como Ney Matogrosso, que também faz desde sempre uso absoluto da provocação daquele buraco extra logo na porta de entrada, nos dentes da frente, simulado em “Homem com H” por Jesuíta Barbosa.
Recentemente, novos embaixadores do diastema tomaram a cena pop, começando pela atriz inglesa Aimee Lou Wood, cujos dentes projetados para a frente quase roubaram a cena de sua presença desconcertante em “The White Lotus”.
Na série “Too Much”, de Lena Dunham, o vilão da história o ex-namorado que troca a personagem principal, interpretada por Megan Stalter, por uma influencer linda um mocinho escolhido apenas para fazer a história andar, personagem de Michael Zegen, quase pôs tudo a perder com seu diastema.
Se não fosse pelo diastema, talvez um rapazinho tão sem graça não seria capaz, sozinho, de definir o destino de duas mulheres.
Além disso, o que dizer de José de Alencar, de “Guerreiros do Sol”, um sertanejo injustiçado e furioso, capaz de liderar um bando de gente armada e quase sempre bêbada, vingativo, violento, mas aparentemente domado pela namorada? Como acreditar no personagem se ele não tivesse algum respiro estético? Por onde iria entrar o mistério, a complexidade de Josué, senão pelo intervalo entre seus dentes?
Andy Warhol, tão bom de prever o futuro, não fez bom uso de seu diastema, e fazia questão de não sorrir em fotos. E Elton John, em uma de suas muitas contradições da vida, corrigiu o que Deus lhe deu, sabe-se lá por que. Perdeu ele, perdemos todos.
Já a modelo americana Lauren Hutton talvez nunca tivesse ficado tão famosa se não fosse sua imperfeição estética, em um mundo em que a perfeição é o mínimo que se espera.
Vanessa Paradis, a cantora, é outro exemplo de como até um diastema discreto pode ser transformador. O ator Elijah Wood, o Frodo, de “O Senhor do Anéis”, costumeiramente confundido com Daniel Radcliffe e Tobey Maguire, se destaca dos demais por causa de seus dentes mais espaçados.
Também entram nessa lista as atrizes Cynthia Erivo, que brilhou como a Elphaba de “Wicked” ao lado de Ariana Grande, e Uzo Aduba, a Suzanne de “Orange Is the New Black”.
E agora Dakota Johnson parece querer dominar o mundo com um micro intervalo em seu sorriso, talvez a única dica de que ela seja uma pessoa de verdade, não uma criação de inteligência artificial nem uma vítima da nossa tendência afobada em deixar igual o que é diferente.