PARATY, RJ (FOLHAPRESS) – Em um debate sobre religiões afro-brasileiras, Djamila Ribeiro fez uma crítica: “As religiões afro-brasileiras historicamente foram muito embranquecidas”. A um público predominantemente branco, a filósofa falou sobre como o processo afeta estas crenças.
“Não é um problema evidentemente que pessoas brancas façam parte da crença”, afirmou Djamila, que é praticante do candomblé. “A questão é que, claro, com toda essa demonização das religiões afro-brasileiras, isso expulsa as próprias pessoas negras da religião.”
Segundo Djamila, o processo cria “erros fundamentais” ao higienizar as práticas religiosas, evitando, por exemplo, rituais que envolvam cortes.
A fala ocorreu na participação da filósofa e de Marcelo Leite, também colunista do jornal e autor de “Ciência Encantada de Jurema”, da Fósforo, na Casa Folha na Flip, a Festa Literária Internacional de Paraty, que acontece entre 30 de julho e 3 de agosto no centro histórico da cidade fluminense.
Entre os adeptos das religiões afro-brasileiras, sob a categoria umbanda e candomblé, 42,9% são brancos, 33,2% se identificaram como pardos, e 23,2% como pretos, segundo dados do Censo Demográfico 2022 do IBGE, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.
A proporção de pessoas brancas entre os praticantes destas fés caiu 3,8 pontos percentuais em relação ao último Censo. Mas isso não indica que essas pessoas deixaram a religião, uma vez que o número absoluto de membros com esta identificação étnico-racial cresceu de 245 mil para 794 mil. O contingente total de praticantes dessas religiões triplicou entre 2010 e 2022, chegando a 1,8 milhão, o que corresponde a 1% da população brasileira.
Cresceu também o número de evangélicos no país, segundo o Censo. Os evangélicos com mais de dez anos cresceram 35,3% entre 2010 e 2022, enquanto a população do mesmo recorte etário teve alta de 9% no período. Negros também são maiorias dos praticantes.
Segundo a jornalista Anna Virginia Balloussier, mediadora do debate e autora de “O Púlpito”, da Todavia, evangélicos são uma fatia significativa dos ataques orquestrados contra religiões afro-brasileiras, como candomblé e umbanda.
“Temos um paradoxo. A religião mais negra do Brasil é hoje a religião que está por trás das maiores ofensivas contra as crenças de matriz africana. Você tem desde os ataques físicos e violentos contra terreiros, que são minoritários, mas muito simbólicos, até a cultura da intolerância religiosa.”
Leite, que se dedica a entender o uso de psicodélicos na religião e na ciência, afirma que os adeptos da religião afro-indígena jurema sagrada, antes conhecida como catimbó, também sofrem discriminação de evangélicos.
“É comum que evangélicos da cidade coloquem carros de som na frente do prédio deles, que é a casa deles, e comecem a fazer o culto relâmpago”, diz ele, referindo-se à cidade Alhandria, na Paraíba, meca da jornada sagrada da religião.