SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As frutas não estão na lista de quase 700 exceções da tarifa de 50% sobre produtos brasileiros anunciada nesta quarta-feira (30) pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Manga, uva e frutas processadas como o açaí compõem 90% do total de frutas exportadas ao país norte-americano, segundo a Abrafrutas (Associação Brasileira de Produtores e Exportadores de Frutas e Derivados).
A entidade afirma que seguirá acompanhado as negociações entre os governos dos dois países com a expectativa de um acordo que mantenha o mercado americano atrativo para as frutas brasileiras. “A associação também continua apoiando os seus associados na interlocução com os importadores americanos e com o governo brasileiro na busca de medidas que possam mitigar prejuízos”, diz.
Os Estados Unidos absorveram cerca de 77 mil toneladas, ou US$ 148,3 milhões, de frutas brasileiras no ano passado. A quantidade equivale a 7% do total exportado pelo setor em volume e 12% do faturamento.
O primeiro semestre foi um bom período para as exportações de frutas brasileiras, com faturamento total de US$ 583 milhões. De acordo com a Abrafrutas, o país exportou mais de 546 mil toneladas de frutas frescas e processadas, o que representou um aumento de 27,17% em volume e 12,58% em valor em relação ao mesmo período de 2024.
Entre os destaques do semestre, estão:
1 – Melão: mais de 118 mil toneladas
2 – Limão: cerca de 107 mil toneladas
3 – Manga: quase 88 mil toneladas
4 – Melancia: aproximadamente 74 mil toneladas
5 – Banana: aproximadamente 44 mil toneladas
6 – Mamão: 27,4 mil toneladas
7 – Abacate: 19,5 mil toneladas
8 – Maçã: 13,1 mil toneladas
9 – Uva: 10,3 mil toneladas
MANGA TEM POUCAS OPÇÕES DE VENDA PARA O EXTERIOR, E PREÇO JÁ ESTÁ EM BAIXA
A manga teve 20% de suas exportações voltadas ao país norte-americano nos últimos cinco anos, segundo o Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada). O setor acredita que não há muitas opções de mercado fora do Brasil a curto prazo.
A principal variedade exportada para os Estados Unidos é a tommy, que começa sua safra em agosto. O mercado europeu seria uma possibilidade de vendas, mas o continente já estará abastecido de outras variedades da fruta nos meses de setembro, outubro e novembro, pico da safra.
Apesar de consumidores terem a expectativa de o produto ficar mais barato ao menos no curto prazo, devido à maior oferta no mercado nacional, associação do setor havia sinalizado, antes do decreto de Trump oficializando os 50%, que poderá deixar as frutas apodrecerem no pé com uma taxa acima de 15%, para mitigar prejuízos. Além disso, afirma que não há mercado possível em outros países e nem no Brasil, onde os mercados já estão abastecidos.
“Poderíamos pensar, por exemplo, no mercado asiático. Mas qual que seria a logística para tirar essa fruta daqui do Brasil e mandar para esses países? Primeiro que ela chegaria lá muito cara. Segundo que talvez ela chegasse com uma qualidade menor. Então também não vejo essa abertura efetiva de outros mercados de bate-pronto, por exemplo, para daqui três ou quatro semanas, como algo viável”, afirma Lucas Bezerra, pesquisador no Cepea.
Segundo ele, os preços já começam a baixar na segunda quinzena de junho. “A produção da fruta é no ano todo, mas é menor no primeiro semestre do ano. No segundo semestre, há um movimento de aumento na oferta da fruta”, diz.
Thiago de Oliveira, chefe da seção de economia do Ceagesp, afirma que o preço da fruta já está em queda. “As mangas colhidas e comercializadas no mercado nacional já estão com 30% de redução de preços. Se entrar mais manga no circuito nacional, pode impactar ainda mais”, diz.
“Agora, alguém vai ter que criar, por exemplo, a manga do amor, a geleia de manga, um desafio de quem consegue tirar mais rápido o caroço da manga, essas tendências para aguentar o volume da produção”, brinca.
Ele lembra, porém, que os custos com a mão de obra para colheita e para o transporte, do Nordeste para o Sudeste, podem ser uma das justificativas para os produtores “deixarem a manga apodrecer no pé”. A produção de manga se concentra principalmente na região do vale do São Francisco. “Se isso acontecesse, seria um caos generalizado. Haveria pragas, a safra seguinte seria impactada”, afirma.
Segundo a Abrafrutas, o envio das mangas aos EUA é uma operação complexa que requer planejamento e envolve cerca de 20 mil trabalhadores.
O Cepea afirma que a decisão vai depender de cada produtor, e que especialmente os pequenos podem decidir não colher a safra. A medida drástica, porém, não é recomendada pelo instituto.
Paulo Feldmann, professor da FIA Business School, acredita que esse é um cenário pouco provável. “O governo brasileiro certamente atuaria para impedir isso. Seria o caso de criar algum incentivo, alguma redução de imposto, para que esses produtores agrícolas não façam isso”, diz.
O especialista acredita que o preço da manga pode cair a curto prazo, durante a safra do segundo semestre, mas diz que a tendência não deve se manter, pois acredita que o mercado seria remanejado para outros países. “A agricultura brasileira é a mais competitiva do mundo. Os produtos agrícolas têm, em geral, o melhor preço do mundo, o mais baixo, e com qualidade muito boa”, afirma.
Ele reconhece que os efeitos podem demorar. “A agricultura é um setor que tem sua própria dinâmica. Encontrar outros mercados pode levar três, quatro, seis meses”, diz Feldmann. “O produtor vai perder a safra, e o semestre será difícil. Mas no ano que vem, com novos contratos, a situação pode se reequilibrar.”
Tatiana Migiyama, especialista em gestão tributária e economista na Fipecafi (Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras), reforça que o efeito deverá ser temporário. “A desinflação será bem pontual, a curto prazo, porque o que deveria ter sido exportado agora vai ser trazido e ofertado aqui para o mercado nacional”.
João Eloi Olenike, presidente do IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação), avalia que haveria chance de barateamento só se os exportadores decidirem de fato redirecionar os produtos. “Se forem repassados efetivamente, preços mais acessíveis podem chegar ao consumidor final”, diz.