SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O dólar e a Bolsa enfrentaram uma sessão de forte volatilidade nesta quarta-feira (30) após a Casa Branca detalhar o tarifaço contra produtos brasileiros.

O governo Donald Trump chancelou, por meio de um decreto, as sobretaxas de 50% sobre importações brasileiras que chegam aos Estados Unidos. Mas uma série de produtos, a incluir alimentos, minérios, produtos de energia e aviação civil, ficará isenta.

A publicação do decreto levou o dólar a R$ 5,617, mas a lista de exceções arrefeceu a pressão sobre o real, levando a cotação à mínima de R$ 5,536. No Ibovespa, a reação negativa também foi revertida após o detalhamento, sobretudo pela força dos papéis da Embraer, em alta de mais de 10%.

Ao fim do pregão, o dólar fechou em alta de 0,32%, cotado a R$ 5,588. Já a Bolsa avançou 0,95%, a 133.989 pontos.

A sobretaxa de 50% havia sido anunciada por Donald Trump no dia 9 de julho e é a maior entre as impostas para parceiros comerciais dos norte-americanos.

As taxas entrarão em vigor em sete dias. A medida visa “lidar com as políticas, práticas e ações recentes do governo brasileiro que constituem uma ameaça incomum e extraordinária à segurança nacional, à política externa e à economia dos Estados Unidos”, diz o comunicado sobre a assinatura do decreto, que cita o nome de Jair Bolsonaro (PL) e diz que ele sofre perseguição do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal).

O texto não faz qualquer menção ao comércio bilateral entre Brasil e EUA. Não há uma única referência a superávit, déficit ou volume de trocas entre os dois países.

“Membros do governo do Brasil têm tomado medidas que interferem na economia dos EUA, infringem os direitos de liberdade de expressão dos cidadãos norte-americanos, violam os direitos humanos e minam o interesse dos Estados Unidos em proteger seus cidadãos e empresas”, afirma o documento.

A lista de exceções, no entanto, é extensa: 694 produtos ficaram de fora das tarifas, sendo 565 referentes ao setor de aviação. A Embraer, em resposta, disparou 10,92%, com cada papel cotado a R$ 76,25.

A fabricante de aeronaves tem os Estados Unidos como um dos principais mercados consumidores e, até a publicação do decreto, temia os impactos das tarifas sobre suas operações.

Para o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, a lista de exceções representa um cenário mais benigno do que o esperado, “mas não quer dizer que o tarifaço terá um impacto pequeno”. Em entrevista coletiva, ele também afirmou que o plano de contingência do governo para fazer frente às tarifas está pronto e foi elaborado de forma racional, com dimensão adequada para não criar distorções.

O plano, segundo ele, busca fazer com que setores econômicos sofram o menor efeito possível da tarifa e poderá ser calibrado a depender da necessidade.

Antes do decreto, o mercado digeria a decisão de juros do Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA). A autoridade manteve os juros inalterados na faixa de 4,25% e 4,5%, apesar da crescente pressão de Trump pelo afrouxamento da política monetária.

A decisão foi justificada com base no mandato duplo do Fed. O banco central visa atingir o pleno emprego e a convergência da inflação à meta de 2%, e “as incertezas quanto às perspectivas econômicas permanecem elevadas”, diz o comitê.

Com duras críticas ao presidente do Fed, Jerome Powell, Trump defende uma redução acentuada para até 1% -um corte que, para analistas, aumentaria a inflação e está mais alinhado com o que um banco central faria para tirar a economia de uma recessão.

Mas a atividade dos Estados Unidos está longe de apontar para essa direção. Dados do PIB do segundo trimestre indicaram um crescimento de 3% na base anual, uma recuperação da contração de 0,5% do trimestre anterior e acima das expectativas de 2,4% de uma pesquisa da Reuters.

Ainda, o relatório da ADP sobre o setor privado informou que foram criados 104 mil postos de trabalho em julho, revertendo a perda de 23 mil vagas em junho e acima dos 75 mil esperados pelo mercado.

Os dados indicam uma economia resiliente, apesar das políticas comerciais erráticas de Trump. Analistas temiam que as medidas tarifárias diminuíssem o ritmo de crescimento da atividade e aumentasse a inflação, mas esses impactos ainda não se traduziram nos números.

A resiliência reduz ainda mais o espaço para cortes de juros do Fed neste ano, já que um afrouxamento monetário costuma injetar mais dinamismo na economia. Com a atividade aquecida, o mercado espera que o banco central continue adotando a postura de “ver para agir”.

O Copom (Comitê de Política Monetária) do BC (Banco Central) também decidirá sobre a taxa básica de juros do país, a Selic, após às 18h desta quarta. A expectativa é pela manutenção no atual patamar de 15% ao ano -maior nível em quase duas décadas- e pelo encerramento do ciclo de aperto depois de dez meses de alta.

Qualquer decisão diferente dessa será motivo de surpresa para o mercado financeiro, que espera que o colegiado siga o plano traçado no encontro anterior, em junho, quando sinalizou a pausa a fim de examinar os impactos acumulados do ajuste já realizado.

Foram 4,5 pontos percentuais acumulados após sete aumentos consecutivos desde o início do ciclo, em setembro do ano passado, ainda na gestão de Roberto Campos Neto.

Entre os agentes econômicos, a expectativa é de um Copom de poucas novidades, com foco na mensagem de que a Selic deverá ficar estacionada em um patamar alto o suficiente para contrair a economia por período bastante prolongado.