BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Pelo menos dez empresas, entre operadoras portuárias e armadores internacionais, já manifestaram o interesse em disputar o leilão do terminal de contêineres Tecon 10, previsto para ser construído no porto de Santos (SP).

A maior parte dessas companhias, inclusive, chegou a acionar a Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), com o objetivo de obter mais informações sobre aquele que deve ser o maior leilão portuário da história do país.

A reportagem teve acesso a nomes de algumas empresas. Entre elas estão a brasileira CPN, que atua no setor portuário nacional, e a TCP, operadora do terminal de Paranaguá controlada pela chinesa China Merchants Port.

O interesse no leilão também foi sinalizado pela multinacional PSA, de Singapura, e a americana Hudson Ports. A lista de empresas inclui a chinesa Cosco no Brasil, que poderia se apresentar em consórcio com outras duas estatais asiáticas: a China Merchants Ports (CN Ports) e a China Communications Construction Company (CCCC).

Nos bastidores, é aventada, ainda, a possibilidade de a JBS, dos irmãos Joesley e Wesley Batista, entrar na disputa, em parceira com uma multinacional do setor.

Do Japão, o interesse parte de empresas como a ONE (Ocean Network Express) e a UAM, ambas armadoras. Completa a lista a alemã Hapag-Lloyd, que está entre as maiores companhias de transporte marítimo do mundo; a operadora filipina ICTSI; e a HMM (Hyundai Merchant Marine), da Coreia do Sul.

O leilão do Tecon Santos tornou-se o principal foco de disputa portuária no Brasil. Situado em uma área estratégica ao lado da BTP, que hoje é controlada pela MSC, o terminal vai ampliar significativamente a capacidade de movimentação de contêineres no país. A polêmica, no entanto, está no modelo de oferta desse projeto.

A Antaq optou por restringir a participação de empresas já atuantes no porto de Santos na primeira fase do leilão, como forma de evitar concentração de mercado. A decisão se baseou numa análise técnica e em um padrão internacional para aferição de concentração econômica.

Pelos cálculos usados pela agência, haveria níveis elevados de monopólio se o leilão fosse vencido por armadores verticalizados que já atuam em Santos: a MSC, a CMA CGM (controladora da Santos Brasil) e a DP World. Por isso, a licitação foi estruturada em duas etapas: na primeira, apenas novos entrantes poderão apresentar propostas. Caso o leilão não tenha propostas válidas nesta fase, será aberta uma segunda etapa, permitindo a entrada dessas empresas, desde que se comprometam a não manter o controle do atual terminal que possuem.

Todo o setor portuário sabe, porém, que a chance de haver segunda etapa é praticamente nula, dada a dimensão do negócio e o número de interessados.

A proposta elaborada pela área técnica da Antaq passou pela Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda. A minuta do edital recebeu 513 contribuições durante a etapa de consulta pública. Dessas, 53 foram especificamente voltadas ao tema concorrencial.

A agência enviou o texto ao TCU e detalhou que a modelagem adotada seria tecnicamente robusta e juridicamente válida. Mas não é isso o que pensa parte do setor. Tramita na Justiça Federal um mandado de segurança impetrado pela Maersk, que tenta reverter as restrições impostas pela Antaq.

O juiz negou a liminar pedida pela empresa para suspender o processo, mas ainda não decidiu o mérito. A expectativa da agência é que, com a decisão final do TCU sobre o modelo do leilão, o edital possa ser lançado ainda em 2025.

A corte de contas realizou um painel público sobre o tema na terça-feira (29), em Brasília. Representantes de todos os setores foram convidados para o encontro, para debater publicamente os pontos mais controversos do projeto, especialmente os relacionados à concorrência e à legalidade do modelo proposto.

Em várias colocações públicas, foi relatado que o caso por acabar em novas ações na Justiça, caso o modelo proposto seja mantido. O assunto tem sido acompanhado de pressões políticas, acusações de favorecimento e tensões diplomáticas indiretas, já que empresas ligadas a China e a Europa disputam protagonismo no setor.

O governo paulista de Tarcísio de Freitas (Republicanos), por exemplo, defende a abertura total e uma única fase no leilão, enquanto seu colega de partido, o ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, aprova o modelo de licitação elaborado pela Antaq e diz que empresas do setor têm feito um “debate enviesado” sobre o assunto.

A Antaq sustenta que seu objetivo é garantir um mercado mais equilibrado e transparente, abrindo espaço para players que não estejam hoje inseridos nas operações do porto de Santos.

Para Edson Vismona, presidente do Etco (Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial), a proposta da agência, ao priorizar novos entrantes, estaria garantindo pluralidade na operação, protegendo o interesse nacional no Porto de Santos.

“A forma como a expansão do terminal será conduzida é decisiva para o futuro da nossa competitividade. Mitigar o risco da concentração de mercado é um consenso, portanto, permitir que os mesmos grupos ampliem ainda mais seus domínios seria um erro estratégico”, disse.

Como mostrou a Folha, uma avaliação técnica feita até agora pelo TCU (Tribunal de Contas da União) sinaliza preocupação com eventual concentração de mercado a partir do leilão, em linha com o que preocupa a Antaq.

O Tecon 10 será instalado em uma área do bairro do Saboó, em Santos. O projeto é que seja multipropósito, movimentando contêineres e carga solta. A capacidade vai chegar a 3,5 milhões de TEUs por ano (cada TEU representa um contêiner de 20 pés), o equivalente a um acréscimo de mais de 50% em relação à atual movimentação de contêineres do porto.

Durante os primeiros 25 anos de concessão, os investimentos em infraestrutura são estimados em mais de R$ 5,6 bilhões, com geração de cerca de 3.300 empregos diretos na execução do projeto. Será o maior terminal do tipo no país.