SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Ministério Público do Amazonas pediu à Justiça a prisão preventiva de quatro policiais militares e um guarda municipal suspeitos de múltiplos estupros contra uma mulher da etnia kokama enquanto ela estava presa na delegacia de Santo Antônio do Içá, no interior do estado.

O pedido inclui também a suspensão do porte de armas e o afastamento das funções públicas que exercem.

Os crimes teriam ocorrido entre novembro de 2022 e agosto de 2023. A indígena, de 29 anos, ficou presa ao lado de homens, em um espaço improvisado, até ser transferida para Manaus.

O pedido de prisão, feito no final da tarde desta sexta-feira (25), tem o objetivo de garantir a ordem pública, proteger a vítima e evitar interferências nas investigações.

Os policiais e o guarda municipal são suspeitos de estupro de vulnerável, estupro qualificado e tortura. O processo criminal tramita em segredo de Justiça para garantir a segurança da mulher, segundo a promotoria.

Ela teria sido vítima de crime sexual ao lado do filho recém-nascido, que amamentava enquanto estava presa.

Reportagem do site Sumaúma, publicada no dia 18 deste mês, detalhou as acusações feitas pela mulher do povo kokama.

De acordo com o Ministério Público, a mulher relatou que os estupros ocorriam de forma recorrente, durante à noite e em diversas vezes foram praticados coletivamente.

“Em depoimento a promotores de Justiça, na manhã desta sexta-feira, a vítima confirmou que durante o período em que esteve presa no interior foi submetida a abusos sexuais, humilhações e constrangimentos por parte dos PMs e do guarda municipal”, diz nota do Ministério Público.

Além disso, ela teria sido privada de assistência médica, psicológica e jurídica, em um espaço masculino e considerado insalubre.

A indígena disse ainda que, quando já estava presa em Manaus, policiais militares foram à casa da mãe dela, em Santo Antônio do Içá, para intimidar a mulher.

“Trata-se de um caso de extrema gravidade, que impõe ao Estado uma resposta firme e imediata”, disse a procuradora-geral de Justiça, Leda Mara Nascimento Albuquerque.

A Polícia Militar do Amazonas informou que vai indiciar os PMs. A corporação está na fase final das investigações, realizadas por meio de um inquérito próprio.

Os policiais respondem também a um procedimento administrativo disciplinar que pode ter como consequência a expulsão.

A Defensoria Pública do Amazonas informou que já fez 65 atendimentos à indígena. A denúncia chegou ao órgão no dia 28 de agosto de 2023, um dia após a transferência da vítima para a unidade prisional feminina de Manaus.

A mulher foi presa em novembro de 2022, após ser condenada a 16 anos e sete meses de prisão por envolvimento no assassinato de uma adolescente, crime ocorrido em 2018, na capital.

“Não houve audiência de custódia nem comunicação à Defensoria, em violação a garantias fundamentais”, diz nota do órgão.

Enquanto estava presa na cidade do interior do estado, ela não denunciou a violência sexual, com medo de represálias.

Em Manaus, o atendimento jurídico foi antecipado porque outras detentas acionaram a Defensoria ao perceberem as condições da indígena, que chorava muito e recusava alimentos.

A Defensoria Pública pediu que a indígena cumprisse a pena em regime domiciliar e solicitou a redução do tempo de prisão, com a contagem em dobro do período de cumprimento, como medida compensatória à “execução antijurídica da pena, nos termos da Corte Interamericana dos Direitos Humanos”. Os pedidos foram negados.

A Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) solicitou à Corregedoria-Geral do Sistema de Segurança Pública o afastamento dos policiais e o acesso aos procedimentos administrativos e judiciais em andamento.

O caso foi encaminhado ao Ministério da Mulher para que sejam adotadas medidas de proteção à vítima e prevenção a outros casos que podem ocorrer na delegacia de Santo Antônio do Içá.