SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Ministério Público afirmou que os policiais militares que mataram um morador de rua já rendido, no centro de São Paulo, agiram “por mero sadismo e de modo a revelar absoluto desprezo pelo ser humano”.
O tenente Alan Wallace dos Santos Moreira, 25, disparou três tiros de fuzil contra Jeferson Souza na noite de 13 de junho. O soldado Danilo Gehrinh, 23, participou da ação, na rua da Figueira, nos baixos do viaduto 25 de Março.
“É certo que os denunciados Alan Wallace e Danilo, policiais militares no exercício de suas funções, agiram impelidos por motivo torpe, deliberando matar o suspeito por mero sadismo e de modo a revelar absoluto desprezo pelo ser humano e pela condição da vítima, pessoa em situação de vulnerabilidade social”, escreveu o promotor Enzo de Almeida Carrara Boncompagni, ao oferecer denúncia na Justiça comum contra os policiais, na segunda-feira (21).
A defesa do tenente Moreira disse, em nota, que “a ação policial decorreu de legítima defesa e buscaremos demonstrar isso ao Tribunal do Júri”. Já a defesa do soldado Gehrinh, também por meio de nota, afirmou que, por ora, não pretende se manifestar, uma vez que não teve acesso aos autos em sua totalidade.
O promotor afirmou ainda que o assassinato foi cometido com emprego de recurso que impossibilitou a defesa da vítima, a qual já estava rendida e subjugada pelos PMs quando foi baleada de forma repentina.
Souza, conforme imagens da câmera corporal do soldado Gehrinh, não esbouçou qualquer reação ao ser abordado. Gehrinh, conforme a investigação, tentou encobrir as lentes da câmera que usava no momento dos tiros.
A reportagem não conseguiu contato com a defesa dos agentes até a publicação do texto.
O homicídio levou a dupla a ser presa quando estava na sede do 7° BPM/M (Batalhão de Polícia Militar Metropolitano), na avenida Angélica, no centro de São Paulo, na terça-feira (22), ou seja, mais de um mês após a ocorrência.
Antes, o Tribunal de Justiça Militar havia negado um pedido de prisão feito pela Polícia Militar. A corte declinou da competência e entendeu que o caso é uma atribuição da Justiça comum. Na esfera militar, os PMs são investigados sob suspeita de fraude processual e falsidade ideológica.
Em sua denúncia, a partir da qual a Justiça determinou a prisão dos dois policiais, o promotor disse ser “inegável a periculosidade social dos denunciados, evidenciada pelas circunstâncias que envolveram a execução sumária da vítima, conforme reconhecido pelos próprios órgãos censores da Polícia Militar”.
Para Boncompagi, as prisões, além de garantir a ordem pública, podem inibir o recrudescimento da letalidade policial e resguardar a própria credibilidade do sistema de justiça criminal.
O promotor relembrou os assassinatos do marceneiro Guilherme Dias Santos Ferreira, 26, atingido com um tiro disparado por um PM de folga no último dia 5, em Parelheiros; de Igor Oliveira de Moraes Santos, 24, em Paraisópolis, quando já estava rendido por PMs; e do homem arremessado de uma ponte por um soldado no ano passado em Cidade Ademar, todos os casos na zona sul.
Outra lembrança mencionada foram os efeitos colaterais causadas pela Operação Verão, em que 56 pessoas foram mortas durante ações da PM na Baixada Santista, depois do homicídio de um soldado da Rota.
A Ouvidoria da Polícia classificou como inaceitável a morte do morador de rua. O órgão afirmou que vai acompanhar a apuração do caso.
O CASO
Conforme as investigações, os policiais militares Alan Wallace dos Santos Moreira e Danilo Gehrinh patrulhavam a rua da Figueira quando avistaram um homem descendo de uma árvore, em atitude considerada suspeita, e resolveram abordá-lo.
Os PMs teriam constatado que Jeferson não portava documento de identificação.
Os agentes, ainda de acordo com a investigação, levaram o homem para trás de um pilar do viaduto, local vazio, com pouca visibilidade.
Enquanto eles mantinham a vítima rendida, sob a mira de fuzis, Moreira atirou três vezes, atingindo a cabeça, lateral do tórax e braço direito de Jeferson.