SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Nos seus cinco anos de existência, com uma produção que vai de 1949 a 1954, a Vera Cruz rendeu assunto para mais de 50 anos: do projeto de industrialização à importação de mão de obra, das escolhas de distribuição ao desperdício de dinheiro. Seus filmes foram exaltados e adorados com a mesma intensidade que, para outros, pareceram ridículos ou afetados.
Nesse tempo, seus filmes foram exaltados e adorados, também foram chamados de ridículos ou afetados. É dessa história controversa que o pesquisador Donny Correia propõe uma revisão, começando entre os dias 26 e 27 na Cinemateca Brasileira.
O próprio Correia realiza no sábado uma masterclass sobre a companhia de Franco Zampari, depois do que se terá acesso ao primeiro dos seus filmes: “Caiçara”, drama entre quadrado e desajeitado dirigido por Adolfo Celi. Quer dizer: isso é uma visão antiga. Toda a questão do ciclo é saber se a visão de algumas décadas atrás se sustente, ou se podemos ver a Vera Cruz com novos olhos.
Se em “Caiçara” havia a alcoolatria como vício central, “Angela” remete a outro problema muito cultivado pela Vera Cruz: a jogatina e sua capacidade de destroçar bens de raiz, heranças e tudo mais. “Angela” também foi o filme que marcou a saída de Alberto Cavalcanti, chefe de produção do estúdio, que se desentendeu com Franco Zampari: Cavalcanti queria que brasileiros dirigissem mais filmes, Zampari inclinava-se para o lado dos estrangeiros, sobretudo italianos. No caso, o filme foi assinado por Tom Payne e Abilio Pereira de Almeida.
Nesse momento de poucas oportunidades aos brasileiros, já se destacam os documentários de Lima Barreto ”Painel” e “Santuário” estão na mostra.
Como Zampari ganhou o braço de ferro com Cavalcanti, outros filmes presentes na mostra receberam a direção de estrangeiros, como “Appassionata”, de Fernando de Barros, e “Veneno”, de Gianni Pons. No primeiro, Tônia Carrero é uma pianista brasileira de sucesso internacional, que liga muito para sua carreira e muito pouco para o marido. Em “Veneno”, é o marido, Anselmo Duarte, que sofre com a indiferença da mulher.
Se existe dúvida se esses filmes melhoraram com o tempo o que pode muito bem acontecer, não restam dúvidas sobre o quanto é atraente “Floradas na Serra”. O filme foi o último esforço da Vera Cruz pela sobrevivência. O sucesso de “O Cangaceiro” já tinha sido vendido para pagar dívidas. Apostou-se muito no filme dirigido por Luciano Salce. Com efeito, Salce conduziu muito bem a história de pacientes que tratam tuberculose em Campos do Jordão. Entre eles estão Cacilda Becker e Jardel Filho.
É uma rara oportunidade para ver Cacilda Becker. E Salce, diga-se, era bom o bastante para seguir uma carreira mais que digna na Itália, No Brasil, porém, o filme fracassou e decretou, de vez, a falência da companhia.
Da Vera Cruz, restaram, além dos assuntos para discussão que duraram até pelo menos o fim do século passado, a falência do sonho de levar o cinema brasileiro para o mundo. Por mais que essa história de final triste já pareça distante, ela ainda é capaz de intrigar e atrair. Rever seus filmes é uma bela proposta da Cinemateca Brasileira, afinal.
RARÍSSIMOS DA VERA CRUZ
– Quando 26 e 27/8
– Onde Cinemateca Brasileira – Largo Sen. Raul Cardoso, 207, SP
– Preço Grátis